Equipes da Ambev e da sua agência de publicidade, a DM9DDB, se reuniram em torno de uma série de telas de tevê, no domingo 9 de março, durante a transmissão do Domingão do Faustão, na Rede Globo de televisão. Não se tratava de um evento de confraternização. Mas sim de trabalho sério. O Guaraná Antarctica teve, na data, o lançamento de uma de suas maiores promoções dos últimos tempos, que contava com Faustão, o técnico da Seleção Brasileira, Luiz Felipe Scolari, e os jogadores de futebol Neymar e Bernard. A diferença, desta vez, em relação às campanhas do passado, é que os gestores da marca contaram com um arsenal de ferramentas para medir o pulso das mídias sociais. 

 

95.jpg

Os espiões do consumo: (da esq. à dir.) Ferguson, Queiroz e Marcelo Páscoa, da DM9DDB, contam

com dados que medem o “clima” das marcas na internet, para campanhas

como as do Guaraná Antarctica

 

De forma que podiam saber como os internautas receberam o lançamento e, principalmente, para agir com rapidez caso precisassem ajustar qualquer detalhe da comunicação. Ao mesmo tempo, um time da DM9 comprava termos de busca no Google, para aumentar o alcance da ação. Depois que Faustão anunciou a promoção, a procura pela palavra guaraná, no site de buscas na internet, aumentou 1,5 mil vezes. Muitos interessados em saber mais sobre a promoção acabavam entrando na página da marca. Esta, por sua vez, identificava o perfil do usuário e apresentava para cada tipo de público um visual diferente. 

 

Se era uma dona de casa, ela visualizava uma mensagem relacionada a Felipão e a prêmios como carros e casas. Para os mais jovens, a imagem mostrada era a de Neymar e de computadores. “O Guaraná é uma marca que interessa a jovens e a avós, já que está no mercado desde 1920”, diz o gerente de marketing de Guaraná Antarctica, Cléber Dantas. “No passado, acontecia de fazermos campanhas com apelo jovem, que eram vistas por mães e elas não entendiam nada.” Esse passado não é tão longínquo assim. Muitas das ferramentas que permitem realizar campanhas de nova geração são novidades. O centro de comando da ação da Ambev foi uma sala repleta de monitores, montada neste ano, na sede da DM9, em São Paulo. 

 

Ela é um símbolo de uma série de novidades que surgiram nos últimos meses nas maiores agências brasileiras e que agora estão disponíveis para os anunciantes. Esse Big Brother das marcas atende pelo nome de um conceito muito comentado nos últimos tempos, mas dificilmente colocado em prática: o Big Data. Ele é chamado assim com boas razões. O monumental volume de dados gerados atualmente na internet é majoritariamente composto por informações não estruturadas, que estão fora dos bancos de dados. Estima-se que 80% deles são pequenos textos, e-mails, imagens e, cada vez mais, postagens em redes sociais. 

 

96.jpg

 

Mas os mais recentes sistemas de análise de dados estão conseguindo transformar essa massa caótica em algo inteligível e capaz de ser interpretada em tempo real. Nunca os profissionais de comunicação puderam saber tanto sobre os seus atuais e potenciais clientes. Para o publicitário Paulo Queiroz, copresidente da DM9, a mudança era inevitável, e vai além das novas tecnologias. “Nos últimos anos, a nossa agência foi inundada por gente com conhecimento em software e estatísticas”, diz. “Eles começaram a influenciar na operação e entregaram informações em tempo real que nós não podíamos desconsiderar.” 

 

O resultado foi que, além da Ambev, clientes como C&A, Walmart, Itaú e Vivo aderiram ao Big Data. Até mesmo a Kroton, a maior empresa de ensino superior do País, percebeu os benefícios das novas tecnologias. Com mais de 50 faculdades em cerca de 40 cidades, o desafio da empresa era acertar o público-alvo sem gastar demais com comunicação. “A gente precisava fazer o bom e velho marketing direto, mas mandando a mensagem certa, no momento certo e ao menor custo”, diz Guilherme Franco, vice-presidente de marketing do grupo educacional. “Usamos um algoritmo muito mais sofisticado do que apenas mandar, por exemplo, uma oferta de curso de veterinária para o jovem que gosta de animais e que está na idade de se inscrever na faculdade.” 

 

A tecnologia avalia até o histórico de navegação na internet, o grau de abertura da pessoa para receber a mensagem e quais ações anteriores não tiveram efeito com ela. O resultado, na temporada de matrículas deste ano, foi um aumento de 229% no número de inscrições na Kroton, em comparação com o mesmo período de dois anos atrás. Tornou-se essencial, vital mesmo, a capacidade de responder com agilidade ao mundo virtual. “É inconcebível um gestor de comunicação não saber o que está acontecendo agora com a sua marca nas redes sociais”, afirma Patrice Lamiral, diretor de estratégias digitais da agência JWT. 

 

“Assim, ele perde uma série de oportunidades que nunca mais vão voltar.” O usual ainda é o anunciante receber de suas agências apenas relatórios, normalmente semanais, sobre a percepção da sua marca. Mas essa periodicidade pode não ser suficiente para consertar mensagens mal recebidas pelos internautas. Lamiral, então, decidiu criar um programa próprio que permitisse trazer respostas simples em tempo real. Durante um ano, ele coordenou o desenvolvimento de um software, chamado de BrandMagz, que captura dados nas redes sociais e em sites de notícias e os compilam em uma tela de gráficos, que pode ser facilmente compreendida por leigos em tecnologia.

 

97.jpg

A antenada: a apresentadora Eliana, do SBT, é uma das primeiras celebridades

a utilizar um software, da JWT, para analisar em tempo real as redes sociais

 

Uma instituição que testa o BrandMagz, da JWT, é o hospital A.C. Camargo Cancer Center, que acompanha os temas mais comentados sobre câncer pela internet mundial, de forma a transformar isso em conteúdo próprio para os seus seguidores. Mas a ferramenta, que foi inventada para atender aos clientes corporativos, está atraindo celebridades e até mesmo jogadores de futebol. Para eles, funciona como uma espécie de pesquisa Ibope das redes sociais. Dez clientes estão em fase de fechamento de contratos para ter acesso a esse serviço. Uma pioneira é a apresentadora de tevê Eliana, do SBT. “Eu sempre tive muita atenção com a minha marca e sou muito ligada em tecnologia e tendências de mercado”, diz. 

 

“Portanto, para mim, é natural utilizar recursos tecnológicos, para acompanhar mais de perto o que acontece nas redes sociais.” Por outro lado, as marcas também podem selecionar as celebridades para as suas campanhas, sob bases mais sólidas do que a simples intuição dos profissionais de publicidade. A escolha de um garoto-propaganda pode agora ser feita de acordo com os dados que dão uma visão mais precisa da percepção que os internautas têm de cada personalidade pública e o seu número de seguidores nas redes sociais. 

 

A ciência chegou até mesmo aos tradicionais jingles. Na agência DM9, uma garota de 24 anos foi responsável pela criação de um software para avaliar o potencial das músicas “grudarem” na cabeça e servirem para serem usadas em comerciais. Agora, a agência conta com um banco de dados com uma centena delas, com respectivas notas de capacidade de reverberação. “A publicidade deixou de ser empírica, para se tornar mais científica”, diz Adrian Ferguson, vice-presidente de mídia da agência. “Estamos vivendo o momento máximo de uma grande mudança.”

 

98.jpg