19/07/2013 - 21:00
Dentro de um mês, os cofres da Prefeitura de São Paulo devem receber cerca de R$ 70 milhões, que vão compensar parte do prejuízo oriundo do escândalo dos precatórios, na gestão do então prefeito Paulo Maluf, entre os anos de 1993 e 1996. Na ocasião, o então secretário de Finanças da capital paulista, Celso Pitta, autorizou a emissão de títulos públicos, que deveriam pagar dívidas municipais, mas foram desviados para outros fins, além de beneficiar uma série de corretoras de valores, no que ficou conhecido como a “cadeia da felicidade”. A ação para reaver o dinheiro, impetrada em 1997 pelo Ministério Público do Estado de São Paulo, estabelecia, como valor inicial, o ressarcimento de R$ 10,7 milhões.
Condenações recentes resgataram recursos que estavam em contas de Maluf (esq.)
e do juiz Lalau (dir.) no exterior. O senador barbalho (centro) ainda recorre de pena
que o obriga a devolver R$ 2,2 milhões
Corrigido nos últimos 16 anos, o valor se multiplicou por sete. A Justiça tem imóveis e dinheiro em contas de bancos dos réus do processo – além do espólio de Pitta, que faleceu em 2009, o administrador Wagner Baptista Ramos, e 15 corretoras de valores, que participaram do esquema fraudulento de compra e venda de precatórios. “Os imóveis serão leiloados e o dinheiro voltará para os cofres da cidade”, diz o procurador Saad Mazloum, um dos autores da ação de improbidade administrativa. A demora na devolução dos recursos mostra que a Justiça ainda precisa andar mais rápido. Mas o País tem, ao menos, aumentado a pressão pela devolução do dinheiro do contribuinte.
Segundo a Advocacia-Geral da União, nos últimos três anos foram ressarcidos R$ 2,5 bilhões, relativos a desvios ou fraudes, e ainda há outros R$ 9,5 bilhões que estão sendo cobrados em juízo. Um dos casos mais recentes é a condenação do senador Jader Barbalho (PMDB-PA), obrigando-o a devolver R$ 2,2 milhões à União por apropriação ilícita de verbas federais do programa Finam, da antiga Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia, que seriam destinadas à empresa Imperador Agroindustrial de Cereais S/A, em Cristalândia, sudoeste do Tocantins. Além de Barbalho, outras dez pessoas foram condenadas, pela mesma ação civil, ao ressarcimento de R$ 11,1 milhões. Os réus ainda podem recorrer da sentença.
Mesmo tendo de seguir um ritual jurídico que pode se estender por alguns anos, os juízes têm se mostrado bem pouco condescendentes com contestações a ações do gênero. “O ambiente regulatório e institucional para restituir dinheiro público vem se fortalecendo no Brasil”, afirma o advogado gaúcho Fábio Osório, especialista em crimes de improbidade administrativa. “A cultura de fiscalização se intensifica e aumenta a pressão sobre os gestores.” Segundo o ministro Luís Inácio Adams, da AGU, as ações de restituição de dinheiro ganharam mais consistência, o que se reflete na rápida decisão das instâncias jurídicas em favor da União. “No ano passado, não tivemos nenhuma liminar negada para retenção ou bloqueio patrimonial de réus que tenham se apropriado de dinheiro público”, diz Adams.
O Brasil também tem ampliado os acordos internacionais para inibir a prática de ocultação de dinheiro em paraísos fiscais, como fez o ex-prefeito Paulo Maluf na Ilha de Jersey, na costa sul da Inglaterra, onde mantinha dinheiro desviado dos cofres da prefeitura em contas da família. Em maio deste ano, a Justiça local determinou que R$ 4,5 milhões mantidos em Jersey voltassem ao Tesouro municipal – outros R$ 56 milhões estão em vias de serem devolvidos. Também os tribunais da Suíça ajudaram a localizar depósitos do ex-juiz Nicolau dos Santos Netto, o Lalau, feitos em nome de terceiros, fruto dos desvios da construção do Fórum Trabalhista de São Paulo, nos anos 1990. No último dia 10, R$ 10,7 milhões foram repatriados e depositados na conta do Tesouro Nacional.
Segundo Adams, R$ 115 milhões, dos R$ 169 milhões desviados no esquema de Lalau já foram recuperados.No entanto, embora seja verdade que a Justiça está mais eficiente nos processos de restituição, o certo é que ainda falta aperfeiçoar as leis para inibir práticas fraudulentas. Além da ausência de um tribunal exclusivo para julgar casos de improbidade, falta aprovar penas mais rígidas para os corruptos e para os corruptores. “Desde 2005 há um projeto parado que transforma o enriquecimento ilícito em crime, mas ainda não foi aprovado”, diz Mario Spinelli, controlador da Prefeitura de São Paulo. O promotor Saad Mazloum concorda. “O Congresso aprovou uma lei que transformava corrupção em crime hediondo, mas ela prevê pena de quatro anos, o que permite regime aberto”, diz Mazloum. “Na prática, não muda nada.”