Na fase final de desenvolvimento do Windows 8, em 2011, um recurso chamou a atenção dos especialistas. Sua função era dificultar a instalação de sistemas operacionais como o Linux, ou até mesmo de versões anteriores da plataforma da Microsoft. Essa restrição ilustra à perfeição o que foram anos de Steve Ballmer à frente da empresa fundada por Bill Gates. Em seus 14 anos como CEO, ele defendeu o Windows com unhas e dentes, criando entraves para qualquer iniciativa que se aventurasse para fora do sistema de janelas. Por conta dessa estratégia retranqueira, a Microsoft perdeu o passo da inovação e foi ultrapassada por concorrentes como o Google e a Apple. 

 

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Uma nova empresa: Nadella esteve no time que começou a mudança

na Microsoft e agora lidera o caminho

 

Essa Microsoft parece fazer parte do passado. Ela começou a ser enterrada desde que o indiano Satya Nadella assumiu o comando da empresa de Redmond, em fevereiro deste ano, no lugar de Ballmer. Em pouco tempo, Nadella mostrou a que veio, provocando abalos sísmicos na estratégia da companhia, improváveis sob a chefia do ex-CEO, que será lembrado mais por suas macaquices e seus gestos expansivos em eventos públicos. Assuntos como código aberto e software gratuito, antes proibidos, passaram a ser comentados nos escritórios. Nadella, é verdade, não conseguiu fazer isso de uma hora para outra. 

 

Já no final da era Ballmer, algumas coisas começaram a mudar. Nos últimos meses da administração do antigo CEO e atual membro do conselho de administração, seus homens de confiança conseguiram convencê-lo de que o barco deveria içar velas e seguir o vento, em vez de remar na direção oposta. Entre os integrantes desse grupo seleto, estava o indiano que algum tempo depois seria ungido à presidência e vestiria de vez a camisa da “nova” Microsoft. “Nadella esteve muito próximo do início da nova filosofia”, afirma Rob Enderle, fundador da consultoria americana especializada em tecnologia Enderle. “Ele foi uma das pessoas que mudaram a cabeça de Ballmer.”

 

Seu primeiro grande movimento sob a nova filosofia foi o anúncio da versão do Office para o iPad, da Apple, feito no fim de março. O aparelho, atualmente uma das principais ferramentas usadas para trabalhar e navegar na internet, é considerado o vilão do mercado de PCs, área dominada pela Microsoft há décadas. Dias depois, Nadella tomou outra decisão inusitada, principalmente vinda da Microsoft, conhecida pela avidez com que faz funcionar sua caixa registradora: tornou o sistema operacional para smartphones, o Windows Phone, gratuito para empresas que queiram usar a plataforma em aparelhos com menos de nove polegadas de tela. 

 

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Mal acompanhado: Ballmer defendeu com unhas e dentes, durante seu período

como CEO, a soberania do Windows

 

O objetivo é claro: avançar na área de mobilidade, na qual a Microsoft detém pífios 4% de participação, longe, muito longe, dos principais competidores – o Google lidera com uma fatia de 78%, seguido pela Apple, com 15%. O executivo indiano não fez apenas remendos para minimizar os danos em setores nos quais a empresa está atrasada. No mesmo evento, em abril, a Microsoft divulgou que a versão para internet das coisas do Windows terá código aberto e também será gratuita. Não custa lembrar: a empresa de Bill Gates não só foi a principal antagonista dos softwares abertos, como lutou ferrenhamente para destruí-los. “A Microsoft virou-se para o horizonte em que as coisas são feitas de forma diferente”, diz Roger Kay, presidente da consultoria americana Endpoint Technologies Associates. 

 

“A empresa viu que o Windows não é o centro do universo.” Os acertos do executivo, contudo, podem ter começado no dia em que fez suas exigências para aceitar o cargo de CEO da Microsoft. Em sua lista, constava a saída de Bill Gates da presidência do conselho, para que ocupasse o cargo de seu principal conselheiro. Isso mostra que Nadella procurou cercar-se de pessoas competentes e com visão de futuro para ajudá-lo a gerir o Boeing que é a Microsoft, dona de um faturamento de US$ 77 bilhões e de um lucro de US$ 21 bilhões, no ano fiscal de 2013, ainda na gestão do antigo CEO. “Ballmer não é burro”, diz Enderle. “O problema é que ele foi mal aconselhado durante grande parte de seu tempo como CEO.” 

 

Tentar mudar a visão da Microsoft também foi uma tarefa mais complicada para Ballmer do que está sendo para Nadella. David Cearley, analista da consultoria americana Gartner, lembra que duas das maiores histórias de reviravolta no futuro de uma empresa de tecnologia são as protagonizadas por Steve Jobs, à frente da Apple, e por Louis V. Gerstner Jr., com a IBM. Em ambos os casos, no entanto, as empresas apresentavam resultados negativos. “É muito difícil uma empresa substituir sua filosofia quando está com resultados tão sólidos como a Microsoft”, afirma Cearley. Resta agora saber se a renovação da Microsoft não é tarde demais. “Não há como negar que é tarde”, diz Kay, da Endpoint Technologies Associates. “Mas nunca é muito tarde no mundo de tecnologia.”

 

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Adeus, XP

 

A Microsoft encerrou, na semana passada, o suporte técnico para o Windows XP, uma das versões mais populares de seu sistema operacional, lançada em 2001. Para se ter uma ideia, 10,9% dos computadores ainda usam o sistema operacional no Brasil. Um terço das empresas ainda conta com 10% de suas máquinas rodando essa versão, no mundo. Com o fim da assistência técnica, o computador com Windows XP ficará mais suscetível a ataque de hackers e muitos dos novos programas e acessórios que chegarem ao mercado não serão compatíveis com a antiga plataforma da empresa. 

 

A Microsoft também vai parar de monitorar e fazer atualizações para o XP, além de não dar mais informações através de sua central de call center para quem tiver dúvidas relacionadas ao sistema recém-aposentado. Com o movimento, a Microsoft espera que os donos de Windows XP migrem para as versões mais recentes de seu sistema operacional. Essa atualização passa, no entanto, na grande maioria dos casos, pela troca do computador. Afinal, grande parte das máquinas que usam o Windows XP não tem capacidade de processamento para rodar o Windows 8. 

 

Embora a Microsoft recomende que os usuários não mantenham computadores com o Windows XP, especialistas consultados por DINHEIRO acham que essa providência não é necessária. Para eles, um antivírus atualizado e boas práticas de segurança podem ajudar a minimizar o risco de manter um computador com um sistema sem atualização. No caso das empresas, a questão é mais delicada e as máquinas com XP devem receber atenção especial das áreas de tecnologia.