Duas brasileiras foram notícia no mundo corporativo na semana passada pelo mesmo motivo. Sylvia Coutinho, 50 anos, e Claudia Sender, 38, assumiram, respectivamente, a presidência da subsidiária do banco suíço UBS no Brasil e da TAM Linhas Aéreas. Cada uma em sua área, tornaram-se as primeiras profissionais a assumir o mais alto cargo dessas companhias. Há ainda outras coincidências que as aproximam. Ambas são formadas em engenharia e investiram na formação executiva: cursaram MBA nos Estados Unidos. Sylvia, na Universidade Columbia, entre 1998 e 2000, e Claudia, na Harvard Business School, entre 2000 e 2002. 

 

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Claudia Sender, nova CEO da TAM: geração de valor na companhia

abriu caminho para o posto de número 1

 

Mais do que isso, a dupla engrossa um time de mulheres que está correndo atrás de suas carreiras sem se perder diante das dificuldades habituais encontradas pelo sexo feminino para chegar ao topo das organizações. Sim, essas dificuldades existem. Ainda há diferenças gritantes de salários para os dois gêneros em mesma posição, e uma alteração do quadro ainda vai levar um tempo. O número de representantes femininas no topo das empresas tem crescido a passos lentos no mundo inteiro, como mostra um estudo da consultoria Grant Thornton (leia quadro). No Brasil, por exemplo, só 23% das empresas têm mulheres em cargos de diretoria para cima e, desse total, apenas 14% são CEOs. 

 

A boa notícia, porém, é que crescem a cada dia os exemplos de mulheres que pararam de se fazer de vítimas diante dessa realidade e assumiram uma postura pró-ativa para alterar essas estatísticas. São profissionais que perderam o pudor de assumir sua ambição de chegar ao topo, algo que, até bem pouco tempo atrás, parecia um sonho aceito socialmente apenas dentro do clube do Bolinha. “Ser presidente de uma companhia era um objetivo muito claro para mim”, diz Valeria Godoy, 47 anos, presidenta da Dassault Systèmes para a América Latina, multinacional francesa de softwares. Valeria foi convidada a assumir o posto em abril do ano passado, depois de cinco anos na companhia. 

 

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Nadir Moreno, da Ups do Brasil: seis promoções até assumir a presidência

em 2007, e aberta a novas posições

 

“Não caiu no meu colo, me preparei para isso”, conta ela, que é mãe de dois filhos, Laura, 23 anos, e Murilo, 18. Para a pesquisadora Camilla Quental, doutora em administração pela faculdade Audencia Nantes École de Management, de Paris, e integrante de um grupo de trabalho sobre igualdade de sexos da ONU, a realidade está longe de ser equilibrada, mas já houve uma evolução importante. “Quem quer chegar lá tem mais modelos para se espelhar”, diz Camilla. Sim, o mundo tem um número enorme de mulheres em destaque, a começar pela premiê alemã Angela Merkel, eleita, também na semana passada, a mulher mais poderosa do mundo pela revista americana Forbes. E quem ocupa o segundo lugar na lista da publicação? A presidenta Dilma Rousseff. 

 

Além de se tornar uma referência, a presidenta Dilma fortaleceu o papel das mulheres em postos-chaves no País, tanto nos ministérios como nas estatais. Não por acaso, indicou Graça Foster para a presidência da maior empresa do País, a Petrobras. “O crescimento das mulheres no mundo acontece por meritocracia, mas elas também precisam da figura de um patrocinador para ajudá-las a chegar lá”, diz Camilla. É fato, porém, que muitas companhias, em especial as multinacionais, valorizam cada vez mais políticas de igualdade de condições para quebrar tabus antigos como o famoso teto de vidro, uma espécie de limite invisível que não facilitaria a ascensão das mulheres nas empresas. 

 

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Valeria Godoy, da Dassault Systèmes: ser presidente de uma companhia sempre foi seu objetivo

 

A presidenta da empresa de logística UPS no Brasil, Nadir Moreno, por exemplo, diz não ter ideia do que seja isso. “Nunca me senti diferente na empresa por ser mulher”, afirma Nadir, que ingressou na UPS em 1992 e assumiu a presidência da subsidiária em 2007. Filha de uma dona de casa que teve oito filhos, a executiva aproveitou todas as oportunidades que a multinacional americana lhe ofereceu.Com um faturamento global de US$ 54 bilhões, a UPS é uma das maiores empresas de logística do mundo e tem uma política de diversidade, estendida até aos seus parceiros – favorece, por exemplo, fornecedores que têm mulheres na presidência. 

 

Casada pela segunda vez e sem filhos, “por enquanto”, Nadir também trata com naturalidade sua vontade de seguir adiante na carreira. “Sempre que assumia um cargo, olhava qual era o próximo passo da carreira que eu poderia dar”, diz. Ela teve seis promoções ao longo de 21 anos na UPS, em razão das conquistas alcançadas em cada posição que ocupou. “Hoje, nossa meta é estar entre as dez melhores unidades da UPS e já estamos chegando lá”, diz Nadir, que não descartaria assumir uma posição de liderança fora do Brasil se a empresa a convidasse. Os frutos colhidos no trabalho também foram decisivos para que Claudia Sender assumisse o comando da TAM Linhas Aéreas na semana passada. 

 

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Sylvia Coutinho, do Ubs: aumentou a participação feminina

no HSBC, e agora é a primeira mulher no banco suíço 

 

“Os expressivos resultados de Claudia em geração de valor e foco no consumidor nas empresas nas quais trabalhou e na condução dos negócios da TAM a credenciam para o cargo”, diz Marco Antonio Bologna, que deixa a presidência da empresa para manter-se à frente da holding TAM S.A. e dedicar-se à consolidação da fusão com a chilena LAN. Antes da TAM, Claudia esteve na Whirlpool por sete anos, onde ingressou como diretora e saiu como vice-presidente de marketing para a América Latina. A nova presidenta do banco suíço UBS, Sylvia Coutinho, também desenvolveu uma sólida carreira até chegar ao novo cargo, que assume no dia 1º de junho. Casada e mãe de dois filhos, Sylvia se diferenciou por traçar uma carreira internacional no mercado financeiro. 

 

Entrou como trainee no Citibank em 1984, assumiu um cargo no departamento de tecnologia do banco em Los Angeles, em 1996, e foi transferida para Nova York, dois anos depois. Em 2001, chefiava o private bank do Citi para clientes brasileiros. Ainda em Nova York, migrou para o HSBC, em 2003. Voltou ao Brasil em 2005 e se tornou a primeira mulher a integrar a diretoria do banco. No ano seguinte, criou um comitê de diversidade, que ajudou a dobrar a participação feminina em cargos gerenciais. No UBS, Sylvia substitui Lywal Salles, e cuidará da nova estratégia do banco, mais dedicada à gestão de fortunas. Também terá de lidar com a combalida imagem do banco. 

 

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Numa entrevista para um programa de tevê há alguns anos, Sylvia disse que gostava de encarar objetivos que a desafiassem. “É mais estressante lidar com uma tarefa rotineira.” O gosto por desafios é um traço feminino já detectado por especialistas em carreira. Para a diretora-geral do Facebook, Sheryl Sandberg, as mulheres precisam aprender a usar essa característica a seu favor. Autora do livro Faça acontecer, lançado há dois meses, Sheryl questiona a própria autossabotagem feminina. “Sempre me falaram das desigualdades no trabalho e de como é difícil ter carreira e família ao mesmo tempo”, escreve Sheryl. 

 

“Mas nunca falam sobre o modo como nos refreamos, e esses obstáculos internos merecem uma atenção muito maior, pois estão sob nosso controle.” A pesquisadora Camilla Quental identificou em alguns estudos, por exemplo, a falta de paciência das mulheres com alguns rituais da carreira, como estabelecer o “networking” para chegar a posições de liderança. “Muitas interpretam essa prática como uma perda de tempo e não enxergam isso como legítimo, a exemplo dos homens”, diz. Para Sheryl Sandberg, essa mudança é necessária: “Um maior número de mulheres na liderança levará a um tratamento justo de todas as mulheres.”

 

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Colaboraram: Carlos Eduardo Valim, Cláudio Gradilone e Marina Rossi