Remédios que provocam efeitos colaterais indesejáveis costumam gerar prejuízo para os laboratórios. Mas quando o sintoma paralelo, aparentemente, não é tão nocivo, ele pode até ajudar a aumentar as vendas de um medicamento, beneficiando, em tese, seu fabricante. É o que está acontecendo com o Victoza, do laboratório dinamarquês Novo Nordisk, que faturou € 8,9 bilhões em 2011. O medicamento é indicado para o tratamento da diabetes tipo 2. Além de controlar a glicemia, o fármaco ajuda os pacientes a emagrecer. Por conta dessa propriedade, ele passou a ser receitado também para não diabéticos, o que fez as vendas do produto darem um salto de quase 4.000% em 14 meses. 

 

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De setembro de 2011 a agosto deste ano, o Victoza saiu da 385ª posição para o oitavo lugar entre os remédios mais vendidos do Brasil em farmácias, drogarias e distribuidores, segundo dados da consultoria americana IMS Health, que mede o desempenho de vendas do setor farmacêutico brasileiro. Nesse período, o Victoza trouxe R$ 158 milhões aos cofres do laboratório. O problema é que não existem pesquisas científicas garantindo a segurança do Victoza quando utilizado no combate à obesidade. Por esse motivo, o laboratório dinamarquês não recomenda que os médicos receitem o medicamento para esse fim, enquanto não forem concluídos estudos sobre a questão. O Novo Nordisk fez questão de ressaltar esse posicionamento em nota enviada à DINHEIRO. 

 

Os executivos da subsidiária filial brasileira, comandada pelo argentino Gustavo Mizraje, não quiseram dar entrevistas. Apesar das advertências do laboratório, os endocrinologistas seguem usando a droga como inibidor de apetite. Isso se deve a uma prática cada vez mais comum entre médicos brasileiros: a indicação de remédios para uma finalidade não comprovada por pesquisas científicas. Esse subterfúgio é chamado de indicação “off-label”. O Victoza se tornou também uma alternativa para a perda de peso quando a Agência Nacional de Vigilância Sanitária proibiu a comercialização de inibidores de apetite com anfetamina, em outubro do ano passado. Dois meses depois, o Victoza apresentou um pico de vendas, faturando R$ 17,3 milhões em dezembro de 2011. 

 

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Sorensen: CEO do Novo Nordisk pode ter administrar crise de imagem,

caso ocorram problemas

 

“Ele está ocupando um vácuo deixado no mercado pelo fim das anfetaminas”, afirma o professor Roberto Bazotte, da Universidade Estadual de Maringá. O fenômeno de vendas do Victoza não é exclusivo do mercado brasileiro. O remédio do Novo Nordisk é um sucesso global de vendas. No primeiro semestre de 2012, ele foi responsável por um faturamento de US$ 740 milhões, uma alta de 82%. Mas as vendas do Brasil chamaram a atenção do CEO global do laboratório dinamarquês, Lars Rebien Sorensen. Na divulgação do resultado dos primeiros seis meses deste ano, as vendas no País foram consideradas um destaque. “Isso (as vendas do Victoza) reflete o desempenho de países como o Brasil e do Oriente Médio”, diz um texto, publicado junto com o balanço. 

 

Apesar de gerar lucros, essa prática adotada pelos médicos traz riscos aos laboratórios. “A indústria farmacêutica vive de imagem”, diz Nelson Mussolini, presidente do Sindusfarma, entidade que representa as empresas do setor. Para Mussolini, mesmo o Novo Nordisk não recomendando o remédio, ele pode sair chamuscado desse episódio, caso as pesquisas concluam que o seu uso para emagrecer não é seguro. Se os estudos científicos comprovarem a eficiência do medicamento no combate à obesidade, o laboratório dinamarquês terá feito um grande negócio. Segundo dados do IBGE, quase metade da população brasileira está acima do peso. Mais: 15% dos brasileiros sofrem de obesidade. Trata-se de um contingente muito maior do que os 12 milhões de diabéticos no Brasil. 

 

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