Com base em números positivos dos últimos meses, o setor têxtil se permite traçar um otimismo cauteloso para o próximo ano. A previsão ainda não está fechada, mas a tendência é de crescimento. Olhando para 2018, duas direções parecem claras: de um lado, a recuperação cíclica da economia (positiva) e, do outro, as incertezas em torno das eleições presidenciais (negativa). Para que a segunda não pese tanto sobre a primeira, o setor espera contar com uma dose extra de estabilidade frente às turbulências de Brasília: a aprovação da reforma da Previdência. “Precisamos de sinais claros agora para evitar a volatilidade excessiva em 2018”, diz o presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit), Fernando Pimentel. “Com a reforma, melhora o clima porque cria uma âncora para a trajetória da dívida pública e dá mais consistência à queda dos juros.”

O valor de um ministério : mudanças na esplanada focarão votos. Bruno Araújo (Cidades) acelerou o processo (Crédito: Marcos Corrêa/PR)

A reforma a que Pimentel se refere não é mais a inicialmente prevista pelo governo. O texto passou por uma série de desidratações desde sua primeira apresentação, há cerca de um ano. Diante do desafio político e o tempo escasso, uma última cartada está sendo preparada para ser apreciada até o final do ano, na janela que antecede o calendário eleitoral – período em que a votação de projetos impopulares, como o das aposentadorias, é quase impossível. Prevalece agora uma dose mais realista, de que será preciso reduzir a rigidez das regras para garantir que o texto passe. Por se tratar de mudança constitucional, são necessárias duas aprovações, por maioria absoluta em ambas as Casas (308 dos 513 deputados e 49 dos 81 senadores).

O governo admitiu aceitar uma versão que diminua pela metade a economia prevista inicialmente, de R$ 800 bilhões em dez anos. O trabalho agora é negociar item por item e se certificar de que o impacto não fique abaixo dos R$ 400 bilhões. A revisão é essencial para estancar o avanço do déficit previdenciário. O rombo do Regime Geral de Previdência (INSS) mais que dobrou nos últimos seis anos e caminha para próximo de R$ 200 bilhões em 2018. Em boa parte, ele explica porque o Brasil passou a registrar déficits no Orçamento e viu a sua dívida pública voltar a crescer, revivendo o risco de calote que pairava sobre o país no passado, uma fonte de incerteza sobre a estabilidade da economia no futuro. Se nada for feito, a conta pode ficar negativa em mais de R$ 1 trilhão a partir de 2033, segundo dados do Orçamento, estrangulando a máquina pública e lançando dúvidas sobre o pagamento da dívida pública.

Estacionado: plenário vazio na terça-feira 14, véspera de feriado. Eleições de 2018 deixam janela curta para aprovar o novo texto (Crédito:Renato Costa)

O que investidores, empresários e analistas buscam saber agora é o conteúdo do novo texto, já apelidado de minirreforma, e o potencial impacto sobre as contas públicas. Um dos pontos de maior convergência é a criação da idade mínima para a aposentadoria, de 65 anos para homens e de 62 para mulheres. A inexistência de uma restrição etária faz do Brasil hoje uma exceção no mundo – a idade média de aposentadoria é de 59 anos no País. Afora esse ponto, que parece garantido, todo o restante é objeto de negociação. Devem ficar de fora, por exemplo, as mudanças na aposentadoria rural, as revisões para o benefício assistencial a idosos de baixa renda (BPC) e o endurecimento das pensões.

Pimentel, da Abit: “Precisamos de sinais claros para evitar a volatilidade” (Crédito:Gabriel Reis)

O cenário que se desenha é de uma minirreforma composta de idade mínima, equiparação das regras para servidores públicos ao regime geral e, possivelmente, com uma regra de transição. Porém, nem isso está garantido, como mostrou a declaração recente do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), defendendo a manutenção das diferenças para os funcionários públicos. Paulo Tafner, pesquisador da Fipe/USP, avalia que a reforma deveria ter ao menos três pontos para alcançar a economia de R$ 400 bilhões: a idade mínima, com a regra de transição, a mudança de regra para servidores e a inclusão de categorias especiais, como professores, para compensar a retirada da aposentadoria rural e o BPC do texto.

Nas contas de Tafner, a inclusão de duas previsões legais para a previdência de Estados e municípios poderia elevar a economia prevista para cerca de R$ 500 bilhões: a que ampara as administrações a aumentar a alíquota de contribuição dos servidores de 11% para 14% e a que autoriza a adoção de alíquota suplementar temporária para resolver os déficits. “Não é uma reforma completa, mas é necessária”, afirma o pesquisador. “Uma economia de R$ 500 bilhões em dez anos não é pouca coisa.” Há outras duas compensações em estudo para aliviar as contas públicas: a redução do cálculo do benefício – em vez de começar com 70% das contribuições, seria de 60% – e a elevação do período de contribuição para receber o teto, de 40 anos para 44 anos.

HERANÇA MALDITA A aprovação parcial daria mais tempo para o próximo presidente trabalhar um novo texto de complementação, que poderia inclusive ser diluído ao longo do mandato. O que parece claro entre os analistas é que quem quer que vá ocupar o Palácio do Planalto a partir de 2019 terá de se debruçar sobre essa herança maldita, para evitar um cenário de descontrole inflacionário. A regra do teto de gastos também explica a urgência. Sem mudanças, as despesas continuariam crescendo com velocidade e a rubrica passaria a representar 71,6% das despesas em 2026, ante 50,4% atualmente, podendo levar a um estouro do teto já a partir 2018 (leia gráfico ao lado). “A gente imagina que nenhum governante queira que a conta exploda no seu mandato”, afirma o analista Bruno Lavieri, da consultoria 4E.

No cenário da consultoria, as mudanças na Previdência só sairão em 2019 e o país só voltará a ter as contas no azul a partir de 2023. Sem elas, o potencial de crescimento médio do PIB entre 2019 e 2022 cai de 3,5% para próximo de 1%. Cálculos do economista-chefe do banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, indicam que o esforço para cumprir o teto seria equivalente à extinção do Bolsa Família e dos investimentos públicos federais. Como esse cenário é improvável, a previsão é de uma reforma até 2021. “Se aprovar neste ano, mesmo que seja parcial, melhora o ambiente, porque todos os sinais são de que não passa nada.”

A resistência é conhecida no Planalto. A estratégia agora é atrelar a votação a mudanças nos ministérios, como admitiu na terça-feira 14, o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR). “É uma reforma ampla, são 17 ministérios que ficarão vagos.” A movimentação foi acelerada com a saída do tucano Bruno Araújo do Ministério da Cidades, na segunda-feira 13. Em paralelo, a equipe econômica reforça a mensagem de urgência. “No momento em que se faça a aprovação neste ano, já entramos em 2018 com a expectativa de estabilidade nas contas públicas para o futuro”, afirmou o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. Será o suficiente para convencer os parlamentares?