Banqueiros centrais são profissionais que se especializam em dizer pouco mais que o óbvio de maneira solene, de modo a não tornar claras suas intenções para os profissionais do mercado sobre uma variável crucial para todas as economias: a taxa de juros. Nesse seleto grupo, a primeira da classe é a economista Janet Yellen, presidente do Federal Reserve, o banco central americano. Ao definir os juros americanos, Yellen define o diapasão que será usado pelos demais maestros da economia.

E, em uma reunião na quarta-feira 28, ela, oficialmente, mudou o tom. Mesmo mantendo os juros inalterados perto de zero, a taxa que vem valendo desde a crise de 2008, o Fed mostrou que as coisas mudaram. No tradicional comunicado após a reunião, Yellen retirou as advertências costumeiras sobre a fraqueza da economia americana e o impacto negativo da desaceleração internacional. Sinal claro para os banqueiros ao redor do mundo que os juros podem subir do atual zero para cerca de 0,25% ao ano ainda em dezembro de 2015.

“Foi um comunicado surpreendente”, avalia José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do Banco Fator. Não por acaso, a reação do mercado foi desconexa. A regra padrão afirma que, quando os juros sobem (ou ameaçam subir), as ações devem cair devido à maior atratividade da renda fixa. No entanto, os três principais índices de ações americanos subiram. O Dow Jones, que reúne ações de empresas da economia tradicional, subiu 1,1%. O S&P 500, mais amplo, avançou 1,2%, e o Nasdaq, que concentra papéis de tecnologia, subiu 1,3%.

A avaliação dos especialistas é que juros mais altos trarão recursos para a economia americana, que precisa modernizar partes de sua infraestrutura, e uma fatia desse dinheiro vai ampliar os lucros das empresas. No sentido inverso, as bolsas de países emergentes caíram. No Brasil, o Índice Bovespa recuou mil pontos, ou 2,2%, em menos de uma hora, imediatamente após o comunicado do Fed. Para um brasileiro acostumado aos 14,25% ao ano da taxa Selic, essa diferença pode parecer irrisória. No entanto, em um mundo com aproximadamente US$ 10 trilhões disponíveis nas mãos de administradores de recursos, plena mobilidade de capital e poucos lugares para investir, mesmo uma remuneração tão pequena pode parecer atraente.

Por isso, os prognósticos para a economia brasileira não são bons. “Juros mais altos nos Estados Unidos, ainda que em um patamar tão baixo, podem drenar recursos do Brasil”, diz o economista Mauro Calil, especialista em investimentos do banco Ourinvest. Pior do que derrubar os preços das ações, esse movimento de saída de recursos deverá pressionar ainda mais a taxa de câmbio. Segundo Calil, os prognósticos são de um dólar ao redor de R$ 4,20 no fim de 2015.

“Se a classificação de risco da dívida brasileira for rebaixada por mais uma agência de rating, o dólar poderá subir ainda acima disso”, diz ele. Portanto, a recomendação para todos os investidores é uma só: procurar defender seu dinheiro da alta de preços. “A inflação deverá chegar nos dois dígitos nos próximos meses”, diz o economista. E nesse cenário há poucas alternativas: investimentos em renda fixa pós-fixada vinculados à taxa Selic para aplicações inferiores a um ano, e papéis públicos corrigidos pela inflação para prazos mais longos. “É hora de evitar o risco”, diz Calil.