Considerado o principal inimigo militar dos Estados Unidos, o Estado Islâmico (EI), organização paramilitar islâmica fundamentalista que domina partes do Iraque e da Síria, vem enfrentando um novo tipo de ataque nos últimos meses. Além dos mísseis e das tropas que, na quinta-feira 2, avançavam para expulsar o EI das cidades de Raqqa, na Síria, e de Faluja, no Iraque, o grupo que promove sequestros e extorque dinheiro das populações sob seu domínio está batalhando contra um inimigo menos visível, mas igualmente letal.

Por meio da análise de transações financeiras, especialistas militares americanos passaram a mirar também os centros financeiros e petrolíferos do EI. O Pentágo-no quer estrangular a organização extremista em um ponto mais do que sensível: suas finanças. A tentativa de minar o fluxo de caixa do grupo começou com bombardeios a centros de distribuição e a refinarias de petróleo, em parceria com a Rússia. Recentemente, o uso de novas tecnologias fez essa estratégia evoluir.

Ferramentas baseadas em Big Data, como os programas de coleta de dados Kaching, desenvolvido pela CIA, e TrackFin, criado pela Agência de Segurança Nacional americana, permitem o cruzamento de dados do sistema bancário convencional. Isso possibilitou aos americanos não só rastrear o dinheiro, mas descobrir quem o manipula e onde ele fica guardado. As consequências foram drásticas. Em janeiro deste ano, pela primeira vez, mísseis americanos atingiram um edifício sem placa em Mossul, cidade ao norte do Iraque, controlada pelo grupo desde 2014.

Cerca de US$ 50 milhões foram reduzidos a pó. O ataque não foi aleatório. No local funcionava uma espécie de banco do EI. Fontes do Departamento de Inteligência disseram à rede CNN que a quantia corresponde a um quinto do que foi saqueado de bancos iraquianos em 2014. Em janeiro e fevereiro, foram destruídos dois outros edifícios em Mossul, que sediavam centros financeiros do grupo. Um local em Al Qaim, perto da fronteira com a Síria, bombardeado em março, teve o mesmo destino.

Com isso, os soldados jihadistas já sentiram na pele os cortes do orçamento do EI no Iraque e na Síria. O soldo variava de US$ 400 a US$ 1.200 por mês. Cada militante recebia ainda auxílio de US$ 50 por esposa e outros US$ 25 por filho. As cifras foram reduzidas à metade desde janeiro. O contingente é estimado pela Casa Branca em 25 mil soldados. Segundo a consultoria americana IHS, metade das receitas da organização vem de impostos, extorsões e confiscos, como os de bancos públicos nas áreas sob seu domínio.

Outros 43% são oriundos do petróleo e os 7% restantes vem de sequestros, tráfico de drogas, venda de energia elétrica e doações. De acordo com a pesquisa “Conflict Monitor”, divulgada em março pela consultoria, o fluxo de caixa mensal dos jihadistas do EI encolheu quase 30% em relação a 2015. O “faturamento” do grupo caiu de US$ 80 milhões para US$ 56 milhões ao mês, afetado pela queda na produção de petróleo e nos impostos cobrados dessa atividade. Alvo de bombardeios, a produção caiu de 33 mil para 21 mil barris ao dia, o que reduziu a receita em 26%.

Para compensar parte das perdas, o EI recorreu a uma prática usada pela Igreja Católica no Século XIV, a venda de indulgências. A lei islâmica prevê que alguns pecados sejam punidas com açoite, mas, desde maio, os pecadores podem se livrar do castigo pagando multas em dinheiro. O caixa ainda é vasto, porém. Para autoridades americanas, o EI amealhou US$ 2 bilhões em 2014. Desse total, US$ 360 milhões vieram de extorsões, pagas pela população dos territórios controlados, e US$ 500 milhões do petróleo, vendido no mercado negro por 25% do preço oficial, na fronteira com a Turquia.

Rastrear o dinheiro permitiu identificar os responsáveis pelas finanças da organização. Como Abd al-Rahman Mustafá al-Qaduli, morto em 25 de março. Para o Pentágono, Qaduli servia de ministro da finanças e era o segundo homem do EI. Na ocasião, o secretário de Defesa dos EUA, Ashton Carter, comentou que “a capacidade de pagar aos soldados e de atrair novos recrutas do EI havia sido minada com a ação”.