04/07/2014 - 20:00
Os jogos emocionantes da Copa do Mundo têm atraído os olhares dos brasileiros para os aparelhos de tevê. Durante os intervalos das partidas, no entanto, outra disputa pode ser observada nos comerciais, em busca do título de campeão do mercado de classificados gratuitos da internet. De um lado, os garotos-propaganda alienígenas da OLX falam para os terráqueos desapegarem de tudo, inclusive do próprio planeta. Do outro, o time do Bom Negócio, escalado com celebridades como o argentino Diego Maradona e o pagodeiro Compadre Washington, do grupo É o Tchan, incorpora objetos irritantes, que logo são vendidos.
Tudo isso para conquistar espaço num mercado que voltou com força nos últimos três anos: o dos classificados online na versão gratuita. “Queremos que as pessoas voltem no tempo, quando os negócios eram feitos com anúncios em jornais”, afirma Ana Julia Ghirello, vice-presidente do Bom Negócio. “Só que na internet.” Iniciado há exatos 15 anos pelo Mercado Livre, ainda líder absoluto no segmento, o setor foi sendo deixado um pouco de lado pela empresa argentina. “Eles continuaram sendo um site de classificados pagos, mas também foram para outros setores, como o marketplace (shopping online)”, diz Pedro Guasti, diretor-executivo da consultoria eBit.
Isso abriu caminho para outros competidores estrangeiros começarem a conquistar o seu espaço no País. E mais. Trouxeram seus serviços gratuitamente para os usuários. Dois desses players, em especial, de forma mais agressiva: a OLX, controlada pelo grupo de comunicação sul-africano Naspers, que faturou US$ 5,8 bilhões no ano passado, e o Bom Negócio, da norueguesa Schibsted, que obteve receitas de US$ 2,5 bilhões em 2013. “Queremos que o negócio puro do classificado volte a se consolidar como algo forte, como acontece em locais desenvolvidos”, afirma Ana Júlia.
Ao perceber as dificuldades para entrar em economias mais fortes, como as europeias, a OLX voltou suas atenções às emergentes, desembarcando no Brasil em 2010. “Não temos empresas monopolizando os países emergentes, é mais fácil de ganhar mercado”, diz Marcos Leite, presidente da OLX no Brasil. Tanto a OLX quanto o Bom Negócio não revelam seus valores de investimento no País, mas, a julgar pelo crescimento das operações, o mercado brasileiro está no centro de suas estratégias. O número de funcionários do Bom Negócio saltou de 22, em 2011, seu ano de entrada no Brasil, para 240 atualmente.
No mesmo período, a OLX aumentou de 20 para 110. “O crescimento de nossa operação reflete o forte aumento dos negócios no País”, diz Leite, da OLX. “Em quantidade de anúncios, cresceremos 200% neste ano.” Esse ritmo de crescimento espelha também o desempenho do Bom Negócio. Segundo dados da consultoria americana Comscore, o tráfego de usuários únicos do Bom Negócio (que não significa volume de vendas), em maio, ultrapassou 12 milhões de acessos, volume 94% maior que o registrado no mesmo período do ano passado. A OLX, por outro lado, caiu 3,5% no mês.
O salto do Bom Negócio é resultado da política da norueguesa Schibsted. No ano passado, a empresa investiu R$ 100 milhões em novos mercados, com destaque para Brasil, Chile, Finlândia e Indonésia. Com 164% de crescimento, o mercado brasileiro foi o que apresentou o melhor resultado em comparação com 2012, principalmente pela popularização dos smartphones e tablets. Não por acaso, a OLX e o Bom Negócio travam uma batalha para se consolidar no segmento de dispositivos móveis, que permitem comprar e vender com apenas alguns toques.
Cerca de 40% dos acessos ao site da OLX são feitos através de aplicativos de smartphones ou tablets. No Bom Negócio, representam 35% dos acessos. “Até dezembro, metade do tráfego no site será feita pelo nosso aplicativo”, afirma o presidente da OLX. Embora representem um filão gigantesco, os sites de classificados gratuitos ainda não descobriram a trilha do lucro. A OLX e o Bom Negócio não cobram pela publicação de anúncios. Há uma cobrança apenas para os anunciantes que quiserem mais destaque em seus produtos. Os valores começam em modestos R$ 3,99.
“Nós ganhamos com aqueles que têm urgência em vender seus produtos”, diz Leite. Por que, então, investir em um setor com rentabilidade tão baixa? “Numa grande escala, esses pequenos valores dão muito retorno”, diz Ana Júlia. Até agora, apenas 1% dos usuários optou pelo serviço pago. “Ao menos no mercado digital, o Brasil é visto com um potencial gigante”, afirma ela. Em números, o Brasil realmente não decepciona. Foram movimentados R$ 28,8 bilhões em vendas realizadas pela internet, em 2013, segundo dados do relatório Webshoppers, do eBit.
Nem um centavo sequer desse valor, no entanto, vem dos classificados. “Como muitas transações ocorrem de forma pessoal entre comprador e vendedor, é impossível mensurar”, afirma Guasti, do eBit. Mas a intenção não é tirar dinheiro dos lojistas do e-commerce, de acordo com o presidente da OLX no Brasil. “Queremos criar uma segunda economia na internet”, diz Leite. “A ideia é fazer com que as pessoas entendam que existem coisas paradas em casa que podem ser vendidas.” A grande dúvida do mercado de classificados online, segundo os especialistas, é saber quando os sites conseguirão ganhar dinheiro, desafio semelhante ao enfrentado por quase todas as companhias de comércio eletrônico no Brasil.
Mesmo crescendo em número de venda e de usuários a passos largos, a atividade ainda patina e, na maior parte das vezes, dá prejuízo. “São dois segmentos distintos, mas o e-commerce já encontrou algumas alternativas para diminuir as perdas, como restringir o frete grátis”, afirma Guasti. “Os classificados podem ser um negócio lucrativo, mas, para isso, uma hora ou outra terão de buscar resultados, não apenas se preocupar com o tamanho.” Tanto a OLX quanto o Bom Negócio esperam que em até oito anos comecem a produzir resultados positivos. Por enquanto, cerca de 80% de tudo o que investem é direcionado a campanhas em horário nobre na televisão, como os comerciais da novela das nove, na Globo.
Estima-se que o espaço de 30 segundos durante o folhetim custe R$ 500 mil. “É o preço que se paga para crescer, mas tenho certeza de que teremos dinheiro pra caramba, lá na frente”, afirma Ana Júlia, do Bom Negócio. Enquanto o “dinheiro pra caramba” não vem, as empresas continuam trabalhando para aumentar o número de usuários e diminuir o tempo médio que os produtos ficam à venda, como os patins da foto à direita da página 53, negociados por R$ 100 um dia após ser veiculado no site da OLX. Com exemplos como este, o Bom Negócio e a OLX querem provar que o desapego é um bom negócio, e que aqueles que apostam no fracasso do setor não “sabem de nada, inocentes”.