Em 2014, o empresário paulistano Laércio Cosentino, fundador da empresa de software de gestão Totvs, tinha de decidir se permaneceria como CEO ou presidente do conselho de administração. Ele, por exigência, da BM&FBovespa, não podia acumular os dois cargos, uma regra para melhorar as práticas de governança corporativa das companhias listadas na bolsa. Ao contrário do que fez a maioria dos empresários que estavam na mesma situação, que preferiram migrar para o board, Cosentino optou por permanecer na função executiva de CEO.

Assim, ele ficaria cuidando do dia-a-dia da operação da Totvs, onde começou como estagiário, virou controlador e a transformou na mais bem-sucedida empresa brasileira de software, através de mais de duas dezenas de aquisições. Entre elas, a de seus principais competidores, como as catarinenses Datasul e Logocenter, e a mineira RM Sistemas. Na semana passada, Cosentino surpreendeu o mercado ao anunciar o ex-presidente da IBM Brasil, Rodrigo Kede, como seu sucessor no comando da Totvs. Cosentino, no entanto, não deixará imediatamente o posto.

Seus planos são de permanecer no comando da companhia por mais três anos. Então, se candidatar ao cargo de presidente do conselho da empresa que faturou R$ 1,8 bilhão em 2014 e cujo valor de mercado é de quase R$ 6 bilhões. Kede será o presidente, convivendo com o fundador da Totvs até a sua saída do comando, em um lento processo de transição. “Sempre estive muito ligado ao dia-a-dia da empresa, desde o início”, justifica. “Minha rotina sempre foi dividida entre gerir a Totvs e atuar junto aos nossos clientes.” Por essa razão, tem sido difícil para Consentino desapegar da função de CEO. O processo de seleção de um novo presidente da Totvs começou em 2012.

Nenhum nome do quadro interno agradou ao fundador e aos acionistas da companhia. Uma empresa de “headhunter” foi contratada para achar o substituto ideal para comandar a software house brasileira. Mas quem ganhou a disputa foi um amigo de Consetino. Kede, hoje aos 43 anos, foi o mais jovem executivo a comandar a filial brasileira da IBM, na qual trabalhou por mais de 20 anos. Os dois se conheciam desde quando Kede tinha 38 anos e a amizade, com o passar do tempo, foi se consolidando. “Chamamos o Kede para conversar e ele agradou a todos os envolvidos no processo”, diz Cosentino.

“Agora, ele tem três anos para se adequar à empresa e aos meandros do cargo.” Kede é engenheiro mecânico formado pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro e conta com um MBA em Finanças pelo Insper. Começou sua carreira como estagiário na IBM, em 1993. Na Big Blue, passou três temporadas nos Estados Unidos, assumiu a área financeira no Brasil e na América Latina e tornou-se presidente da operação brasileira, em 2012. Atualmente, ele era vice-presidente global de transformação e estratégia da IBM. “Será um momento de aprendizado”, afirma Kede.

“Tenho experiência na área de tecnologia, mas esse tempo será importante para garantir que estarei preparado para assumir o papel de CEO.” Três anos para assumir a Tovs sem a sombra de Consentino pode parecer um período longo demais. Mas, segundo Pietro Delai, gerente de pesquisas da IDC Brasil e especialista em tecnologia da informação, isso é essencial no caso da Totvs. O software da empresa roda em mais de 26 mil clientes e qualquer indício de mudança abrupta pode assustá-los. “É como aquele ditado: à mulher de César, não basta ser honesta. Tem de parecer honesta”, afirma Delai.

“Uma substituição de CEO na Totvs não basta ser tranquila. Tem de parecer tranquila.” A previsão é de que Rodrigo Kede tenha seu primeiro dia como CEO em 2018. Muitos casamentos começam e terminam em um período de tempo menor que este. Cosentino, no entanto, está tranquilo quanto à solidez do laço entre sua empresa e o futuro CEO. “Foi um nome escolhido com calma”, afirma Cosentino, em tom de brincadeira. “Tenho segurança que esse relacionamento não termina antes de ele assumir como CEO.”