23/12/2011 - 21:00
No dia 5 de outubro, a saída de cena de um dos maiores executivos de todos os tempos sacudiu o mundo. A repercussão da notícia da morte de Steve Jobs, o fundador da Apple, vítima de um câncer no pâncreas, deu uma ideia da importância de suas invenções. Criador de máquinas fantásticas, como o computador Macintosh, o tocador de música digital iPod, o celular iPhone e o tablet iPad, Jobs foi um mestre na arte de influenciar o comportamento das pessoas. Em 2012, sua ausência continuará a ter reflexos no mundo da tecnologia e dos negócios. Ao oferecer para o grande público produtos simples, mas minuciosamente projetados, Jobs conseguiu satisfazer (na verdade, até antecipar, na maior parte das vezes) desejos e necessidades de consumo. Em mais de três décadas de carreira, ele colecionou sucessos, revoluções, alguns fracassos e, mais do que tudo, admiradores nos quatro cantos do mundo e em todas as instâncias da sociedade. E, agora, como ficam a Apple e suas concorrentes? Quem teria mais condições de assumir o papel de maior inovador, o visionário capaz de liderar as próximas revoluções do mercado de tecnologia e moldar a cultura digital?
Passados três meses desde o desaparecimento de Jobs, o cenário começa a ficar mais claro – pelo menos no que se refere aos novos contornos na operação da Apple. Ainda que pairem interrogações quanto à capacidade de a empresa se manter inovadora nos próximos anos, o bom desempenho financeiro e a preservação da equipe que o acompanhou até o fim apontam para um futuro promissor nos próximos anos. Um dos motivos que sustentam essa avaliação é que a transição do comando, precipitada pelo estado de saúde do empresário, foi preparada com antecedência. Jobs já não era mais o CEO quando morreu. Essa responsabilidade fora transferida cerca de um mês antes de sua morte para Tim Cook, o discreto executivo que, durante mais de dez anos, comandou as operações de venda, logística e suporte aos clientes da Apple.
Além disso, Cook havia substituído o fundador na direção em outras ocasiões, durante seus pedidos de licença para se submeter a tratamento médico, numa clara demonstração de que o sucessor já estava definido. De qualquer forma, a figura de Jobs no desenvolvimento dos produtos da companhia é tão forte que fica difícil imaginar algum nome capaz de ocupar seu lugar. Além de Cook, outros importantes executivos continuam em seus postos. Entre eles estão Jonathan Ive, responsável pelo design dos produtos; Phil Schiller, o chefão do marketing; e Eddie Cue, o pai do iTunes. O desafio deles é manter a Apple inovadora sem a tutela de seu criador. De qualquer maneira, os efeitos de uma possível perda do espírito inventivo só devem ser sentidos no longo prazo. Isso porque, quando abandonou o posto de CEO, Jobs já havia deixado ao menos três grandes lançamentos preparados para o próximo ano. O primeiro deles, o iPhone 4S, foi antecipado e chegou ao mercado menos de um mês após a sua morte e foi um grande sucesso, vendendo quatro milhões de unidades em uma semana.
Fãs fazem fila para comprar o iPhone 4S em uma loja da Apple em Hong Kong.
Em mais de três décadas de carreira, Jobs colecionou admiradores no mundo inteiro
Para 2012 estão previstas uma versão ainda mais potente do celular da maçã e outra do tablet iPad. Também se especula sobre um modelo mais simples do iPhone, que teria preço reduzido para concorrer no mercado de aparelhos de baixa tecnologia. Outra novidade, ainda não confirmada, seria o lançamento de um aparelho de televisão com a marca Apple. O futuro parece ainda mais promissor se for observado que o novo presidente está tomando decisões para derrubar fronteiras de negócios. Uma das principais medidas de Cook como CEO foi aceitar o yuan, a moeda chinesa, nas transações realizadas pela loja online da companhia. Com isso, qualquer cliente do país asiático pode comprar aplicativos na App Store, abrindo de vez para a empresa o gigantesco mercado da China. Antes, os consumidores chineses precisavam de um cartão de crédito internacional para efetivar compras por esse canal. A medida foi o passo mais marcante de um plano de expansão naquele país, executado por Cook nos últimos dois anos.
Atualmente, a China representa 12% do faturamento da Apple, o que corresponde a uma receita de US$ 13 bilhões. Há um ano, a receita chinesa da companhia não passava de US$ 3 bilhões. Ao mesmo tempo, o novo CEO adota uma postura mais amigável frente aos investidores do que seu antecessor. Jobs nunca mostrou paciência para assuntos como comunicação com o mercado e distribuição de dividendos. Cook, inclusive, já sinalizou com a possibilidade de fazer uma recompra de ações, o que seria improvável sob o antigo comando. A tarefa de afastar-se da sombra de Steve Jobs pode ser inglória. Cook, no entanto, tem os números a seu lado nessa missão. A Apple dispõe de um caixa de quase US$ 30 bilhões, e não apresenta um endividamento significativo. Suas vendas, que chegaram a US$ 28,5 bilhões no terceiro trimestre deste ano, cresceram 39% ante o mesmo período do ano passado. O lucro líquido também aumentou, passando de US$ 4,3 bilhões para US$ 6,6 bilhões. Dados como esse demonstram o tamanho da encrenca que a concorrência terá na tentativa de desbancar a Apple.
Cliente comemora a compra do iPad 2, em Nova York, no dia do seu lançamento, em março.
Até hoje, o tablet da empresa acumula vendas de 330 milhões de unidades
Não se pode esquecer, porém, que essa façanha financeira foi alcançada em boa parte graças ao arrojo empreendedor de Jobs. Diante desse cenário, haverá um rearranjo de forças do setor na era pós-Steve Jobs? No aspecto estritamente de negócios, não há sinais de grandes mudanças. A questão que está lançada é saber se há algum personagem capaz de ocupar o posto de principal inovador da tecnologia mundial. São três os nomes credenciados para essa disputa: Larry Page, CEO do Google; Jeff Bezos, fundador da Amazon; e Mark Zuckerberg, idealizador do Facebook. Exímio engenheiro da computação, nascido no Estado do Michigan em 1973, Page se destaca por ser o responsável direto pela estratégia de levar sua empresa para o mundo da internet móvel. Nessa área, aliás, a grande tacada foi a aquisição, em agosto, da Motorola, numa das maiores transações da história do setor de tecnologia, por US$ 12,5 bilhões. Bezos, por sua vez, tem como grande atributo o fato de ser um bom estrategista de negócios.
O empresário soube tornar a Amazon a maior potência do comércio eletrônico no planeta e agora quer desbravar novas veredas, como a dos tablets. A empresa ingressou recentemente nesse mercado com o lançamento do Kindle Fire, visto por muitos como um adversário respeitável para encarar o iPad, da Apple, líder absoluto da categoria. Nascido num segmento distinto – o de redes sociais –, o Facebook, de Zuckerberg, tenta se beneficiar do negócio no qual Bezos é rei: o comércio eletrônico. O site procura atualmente se consolidar como uma plataforma de negócios. Assim, vem atraindo cada vez mais empresas, que usam o Facebook como canal para lojas virtuais. Nesse processo, a figura de Zuckerberg como líder tem ficado mais evidente. Se Page, Bezos e Zuckerberg reúnem feitos que os colocam na luta pela vanguarda da tecnologia, resta saber se terão a mesma força de Jobs para transformar o mundo e as pessoas. Afinal, a capacidade de usar a tecnologia para modificar costumes da sociedade foi um dos grandes trunfos de Jobs. É por essas e outras que, mais que um homem de negócios, o criador da Apple foi um influenciador da cultura de nosso tempo.