O calor recorde do último verão foi comemorado por muita gente: garantiu um bom movimento nas praias e elevou o consumo de produtos típicos desta época do ano, além de fazer a alegria dos fabricantes de ventiladores e aparelhos de ar-condicionado, entre outros. Em Brasília, no entanto, ao menos duas áreas do governo ficaram preocupadas com a falta de chuvas. Os responsáveis pelo setor elétrico, com receio da falta de energia, e os diretores do Banco Central, à frente o presidente Alexandre Tombini, atentos à alta inesperada nos preços de grãos e de alimentos in natura. 

 

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Desfocado: apesar da alta dos juros, o Banco Central, presidido por Tombini, não consegue

trazer a inflação para o centro da meta 

 

Com isso, a inflação, que vinha numa trajetória de queda depois do pico em meados do ano passado, voltou a assombrar. Em março, o IPCA-15 acumulado em 12 meses chegou a 5,9%, trazendo de volta as especulações de que o índice pode novamente estourar o teto da meta, fixado em 6,5%. Desta vez, com um agravante: o ponto mais alto deve ser atingido no terceiro trimestre, às vésperas da eleição presidencial. O assunto, que já está sendo explorado pelos candidatos da oposição, pode se tornar uma vulnerabilidade da campanha de reeleição da presidenta Dilma Rousseff. Economistas do mercado se dividem quanto ao número, mas todos concordam que o gráfico de inflação deste ano ficará acima do de 2013, com pico em setembro ou outubro. 

 

No relatório de inflação divulgado no fim de março, o BC projeta um IPCA de 6,4% no terceiro trimestre deste ano (leia quadro). “Uma parte do choque agrícola se reverte, mas uma parte pode ficar incorporada”, diz o economista Elson Teles, do Itaú Unibanco. Além disso, lembra ele, a Copa do Mundo deve pressionar o custo dos serviços em junho e julho, resultando numa inflação mais elevada do que o normal para esta época do ano. Flávio Serrano, economista sênior do banco de investimento BES, acredita que o índice ultrapassa o teto no segundo trimestre, mas recua para 6,2% ou 6,3% em dezembro. 

 

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Perigo à vista: o preço nos restaurantes deve subir durante a Copa do Mundo.

Já a alta dos alimentos é sazonal

 

“O impacto é momentâneo, mas com certeza será abordado na eleição, porque é um tema muito importante para a população”, diz Serrano.O dilema sobre como atacar a enfermidade sem matar o doente se manifestou mais uma vez, já que uma inflação elevada pede juros mais altos. Mas como chegar à dose ideal? Na quarta-feira 2, o Comitê de Política Monetária da instituição elevou a taxa Selic em 0,25 ponto percentual, a nona alta consecutiva. A taxa de 11% é maior do que a do início do governo Dilma, e anula a redução que vigorou em 2012, liderada pelos bancos públicos. A alta já era esperada pelo mercado, mas não ficou claro se o ciclo está encerrado. 

 

“O comitê irá monitorar a evolução do cenário macroeconômico até sua próxima reunião, para então definir os próximos passos na sua estratégia de política monetária”, afirma o comunicado do Copom. Além da demonstração concreta de que está preocupado com o assunto, inclusive com o controle de preços de combustíveis e energia, o governo vem reforçando o discurso de combate à alta do custo de vida. Na quarta-feira, antes da divulgação da nova Selic, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse que a maioria dos preços está sob controle e que o governo sabe que a inflação reduz o poder de compra do trabalhador. 

 

“É uma questão de honra que ela se mantenha baixa”, afirmou Mantega. A mensagem foi reforçada pela presidenta Dilma Rousseff no dia seguinte. “A taxa de inflação vem sendo mantida nos últimos 11 anos, agora chegando quase a 12, dentro dos limites fixados pelo Conselho Monetário Nacional”, disse à uma plateia de pequenos empresários na abertura da 1º Fórum Nacional da Confederação das Associações Comerciais e Empresariais do Brasil, em Brasília. Dilma torce para que isso não mude justamente neste ano.

 

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