Poucos lugares do mundo são tão traiçoeiros para a exploração de petróleo quanto o fundo do mar a uma profundidade próxima a mil metros. O País lembrou novamente desse fato, na semana passada, quando a petrolífera americana Chevron anunciou ter descoberto uma mancha de óleo no Campo de Frade, no Rio de Janeiro, na região onde vazaram 2,4 mil barris de óleo, em novembro de 2011. Desta vez, em princípio, o problema parece ter sido de menores dimensões. A quantidade de óleo encontrada em 4 de março era de apenas cinco litros, que teriam escapado de rachaduras no fundo do mar, segundo informações divulgadas até o fechamento desta edição, na sexta-feira 16. Trata-se de uma gota no oceano, é verdade. 

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Ali Moshiri: responsável pelas operações da Chevron na América do Sul, que enfrenta

problemas no Equador e Brasil.

 

Mas ela foi suficiente para fazer com que a empresa pedisse a suspensão temporária de suas operações no local, de onde extrai 61 mil barris por dia.  “Não temos nenhuma evidência de que tem a ver com o outro acidente”, disse Rafael Jaen Williamson, diretor de assuntos corporativos da Chevron no Brasil, na quinta-feira 15.  O Ibama, em nota, confirmou a versão da Chevron. A petrolífera americana recebeu também uma nova autuação da Agência Nacional do Petróleo (ANP), a terceira desde o acidente de 2011, por não ter cumprido as salvaguardas determinadas no vazamento anterior. Com ela, o valor das multas já supera os R$ 100 milhões. O novo vazamento serviu para reativar a bateria de críticas contra a Chevron, comandada no Brasil pelo americano George Buck. 

 

Um dos que partiram para o ataque foi o secretário fluminense do Ambiente, Carlos Minc. “Nós já tínhamos advertido que o problema ocorrido no ano passado não havia sido completamente resolvido nem esclarecido”, afirmou Minc. “Naquela época, a Chevron foi informada de que havia uma fissura no fundo do mar.” Segundo Minc, a empresa fez o encapsulamento de apenas parte da fissura, quando o correto seria ter feito em toda a área. A forma como a própria Chevron lidou com o vazamento no ano passado – foi acusada de esconder informações, cometer trapalhadas técnicas e ter de trazer equipamento do Exterior às pressas – não ajudou a amenizar o quadro de desconfianças. Os próprios sistemas criados pelo governo e pelas agências ambientais para lidar com emergências se mostraram falhos: a verdadeira extensão do acidente só ficou clara com as imagens vindas dos helicópteros da televisão. 

 

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Nova mancha: a Chevron, comandada por George Buck (acima) acredita

que o óleo encontrado não tem relação com o vazamento

do ano passado (foto inicial)

 

“Foi um show de horror de todos os lados”, resume um técnico do setor. O incidente representa mais uma dor de cabeça para a terceira maior empresa petrolífera do mundo em suas operações na América do Sul, lideradas pelo iraniano Ali Moshiri. No Equador, a Chevron encara na Justiça uma multa de US$ 18 bilhões pela poluição provocada na região amazônica do país. No Brasil, além de seguir proibida de explorar novos campos, enfrenta uma verdadeira enxurrada de ações judiciais vindas de órgãos como o Ibama, a Polícia Federal e o próprio Estado do Rio de Janeiro devido à sua conduta no ano passado. No total, a empresa pode ter de pagar R$ 20 bilhões. O valor é próximo ao do total das multas aplicadas à britânica BP pelo vazamento no Golfo do México em 2010, embora o volume derramado na costa brasileira seja inferior a 1% ao do que vazou no litoral americano. 

 

Apesar de o novo vazamento ser aparentemente pequeno, o episódio é uma mostra significativa das dificuldades que envolvem a exploração de petróleo em águas profundas. Os acidentes com a Chevron aconteceram a cerca de um quilômetro abaixo do nível do mar. Segundo analistas, a tendência é de que a situação piore quando as petroleiras tiverem de operar a profundidades superiores a seis mil metros, onde estão os ricos campos do pré-sal. “Nenhuma empresa opera hoje nesse nível”, diz Evódio Kaltenecker, professor especializado da BBS Business School. “O pré-sal ainda é muito novo. Aprender a extrair sem causar problemas ambientais será um desafio enorme para as companhias.”

 

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