11/04/2012 - 21:00
Está cada vez mais complicada a situação do Grupo Rede, dono de nove distribuidoras de energia elétrica no País. Com faturamento de R$ 10 bilhões anuais, o grupo presidido pela executiva Carmem Campos Pereira, que colocou a distribuidora paraense Celpa em recuperação judicial, está sob investigação do Ministério Público Federal (MPF) do Pará. A dívida em negociação supera muito o R$ 1,7 bilhão que se imaginava inicialmente. O administrador designado pela Justiça, Mauro Santos, afirma que, até agora, a Celpa apresentou R$ 2,4 bilhões, mas que o total pode chegar a R$ 3 bilhões depois da habilitação de todos os credores.
Carmem Pereira, presidente do grupo Rede: negociação de dívida de R$ 3 bilhões
com os bancos começa em maio.
Os maiores são o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), um grupo de bancos nacionais que inclui Bradesco, Banco do Brasil, Itaú e BNDES, além de um consórcio de investidores internacionais reunido pelo Bank of New York. O plano de recuperação será apresentado a credores em maio e, segundo fontes, pedirá um desconto alto na dívida, de 40% a 70%. Para o procurador Bruno Valente, do MPF, o próprio grupo criou seus problemas. “Está claro que falhas na gestão contribuíram para a situação da Celpa”, afirma Valente. Segundo ele, um dos maiores erros foi fechar postos de atendimento em áreas remotas do Pará para reduzir custos, o que elevou os prazos de atendimento aos consumidores.
Nelson Hubner, diretor da Aneel: “Por que a Eletrobras tem de socorrer a Celpa agora? Não.”
A concessionária passou então a receber multas milionárias – só em 2010 foram R$ 82 milhões. O endividamento da companhia dobrou desde a privatização. “O problema é que a Celpa contraiu financiamentos para repassar recursos a outras empresas do mesmo grupo”, afirma Valente. Um relatório da Aneel, que abriu processo administrativo contra a Celpa, no início de março, que pode resultar na cassação da concessão, diz que só em 2006 a empresa repassou R$ 756 milhões a outras empresas do grupo. “O Grupo Rede era administrado como uma coisa só e isso comprometeu a saúde da concessionária”, diz Valente. O empresário Jorge Queiroz Júnior, controlador do Grupo Rede, com 53% das ações, confirmou em carta à DINHEIRO a transferência de recursos entre as empresas.
“Isso aconteceu durante certo tempo para fazermos face ao pagamento dos encargos da privatização com o BNDES ”, afirma Queiroz. Ele diz que as transferências foram feitas com contratos aprovados pelo governo, que já foram liquidadas. “É comum e salutar um grupo econômico obter o máximo de sinergia financeira entre suas empresas”, respondeu o empresário ao procurador. O problema, para o Ministério Público, é que dívidas que são do resto do grupo na concessionária dificultam a venda da Celpa ao setor privado. “O Grupo Rede teria de ressarcir a Celpa”, disse Valente. Queiroz, engenheiro pela Escola Politécnica da USP, 67 anos, construiu o Grupo Rede comprando empresas nos leilões de privatização da década de 1990.
Jorge Queiroz: o Grupo Rede agora enfrenta dificuldades
em outras empresas além da Celpa.
Numa audiência no Senado, no fim de março, pediu à Eletrobras, atual acionista minoritária da Celpa, que assuma a empresa para facilitar a aprovação do plano pelos credores. Na hipótese de rejeição, a empresa iria à falência e a Aneel retomaria a concessão. “Peço um esforço da Eletrobras, e que, se ela não quiser assumir a Celpa, que ajude”, afirmou Queiroz. No entanto, o Ministério das Minas e Energia e a Aneel não querem nem ouvir falar do assunto. Em nota, a Eletrobras informou que não quer nem o controle nem ampliar sua participação na Celpa. O diretor geral da Aneel, Nelson Hubner, defendeu no Senado que não haja socorro público. “Por que a Eletrobras tem que socorrer a Celpa agora? Não.”
A saída preferida pelo governo seria a venda a um grupo privado. Um dos interlocutores tem sido o presidente da Laep, Luiz Cezar Fernandes, que aguarda a assembleia de credores. “O valor da proposta dependerá do desconto na dívida”, afirma Fernandes. Em dezembro, Queiroz colocou o controle do Grupo Rede à venda, mas o processo está parado desde o pedido de recuperação da Celpa. Queiroz insiste que, ao contrário do que sustenta o MP, não foi a má gestão que deteriorou os resultados da Celpa. O empresário cita como fatores determinantes a queda de 20% no consumo de energia no Pará, desde o racionamento enérgico em 2001, e uma derrota numa ação trabalhista de reposição de perdas do Plano Bresser.
Ele reclama, ainda, dos altos gastos que a Celpa teve com o programa federal Luz para Todos. “O Grupo está fazendo obras na rede do Pará para que todos os consumidores tenham índices de qualidade aprovados pela Aneel, até 2013”, diz. Mas esse plano de melhorias foi criticado pela Aneel, que o considera insuficiente. O que não se sabe é como Queiroz quer chegar a 2013 como dono da Celpa, se ainda não apagou o incêndio provocado pelo curto-circuito do Grupo Rede. A Aneel complicou a situação na semana passada proibindo duas outras distribuidoras do grupo, a Enersul, de Mato Grosso do Sul, e a Cemat, de Mato Grosso, de aplicar reajustes tarifários, por inadimplência com encargos do setor elétrico.