Potências econômicas enfrentam uma onda de protecionismo. Como isso pode prejudicar o comércio internacional?
O ritmo de introdução de barreiras ao comércio por países do G20 segue relativamente estável desde 2008. O comércio mundial atingido por essas medidas é relativamente pequeno, entre 5% e 6%. Após a crise dos anos 1930, dois terços do comércio mundial desapareceu. Assim, estamos vivendo hoje um momento difícil, mas não catastrófico. No entanto, o ambiente político é desafiador: o aumento do desemprego e o crescimento econômico baixo aumentam a pressão sobre o comércio. Lidar com esses desafios restringindo o comércio apenas agravará a situação econômica. Seria o remédio errado porque a causa do problema não é o comércio, mas sobretudo as mudanças estruturais geradas no mercado de trabalho pela introdução de novas tecnologias.

O sr. acredita que as relações comerciais estão passando por uma transformação? 
As negociações multilaterais precisam ser flexíveis para levar em conta as preocupações, os interesses e os diferentes momentos políticos dos países. Foi com essa maior flexibilidade que conseguimos fechar o Acordo de Facilitação de Comércio, envolvendo cerca de 160 países. Precisamos fazer o comércio mais inclusivo. É importante, por exemplo, que as pequenas empresas possam se beneficiar mais de oportunidades em outros mercados. O modelo multilateral tem muito a contribuir nesse sentido. As negociações regionais e bilaterais poderiam ajudar e complementar esse esforço, mas mesmo essa via tem se mostrado especialmente difícil.

Fatos como a vitória de Donald Trump e o Brexit reforçaram a tese de desglobalização. Como isso pode afetar o comércio global?
Incertezas econômicas e desemprego têm alimentado um sentimento antiglobalização. Isso não quer dizer que a globalização parou, ou mesmo que possa ser parada. É a forma de lidar com ela que está em debate. Esses desafios não se resolvem com menos comércio. Ao contrário, restrições ao comércio tendem a agravar o quadro econômico. Mais barreiras ao comércio levam a produtos e serviços mais caros. Caso as fronteiras fossem fechadas, o poder aquisitivo dos mais ricos nas economias avançadas seria reduzido em cerca de 30%. Já os mais pobres veriam seu poder de compra reduzido em 60%. A instabilidade no mercado de trabalho não é provocada pelas importações, responsáveis por apenas 2 entre 10 vagas perdidas nos países desenvolvidos. Os outros 8 desaparecem por causa da automação ou novos métodos de produção. O desafio é adotar os remédios adequados para lidar com essa mudança. Ainda mais preocupante é o fato de que o sentimento antiglobalização vem frequentemente associado à rejeição de tudo que vem de fora, com altas doses de intolerância. A história nos mostra que esses sentimentos são perigosos e podem escalar com facilidade, sobretudo em momentos de desaceleração ou depressão econômica.

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