06/03/2015 - 20:00
Um dos maiores escândalos de corrupção envolvendo a Petrobras e suas fornecedoras, episódio que vem sendo chamado de “petrolão”, ganhou na última semana novos e decisivos capítulos. Desta vez, no entanto, o enredo caminha na direção de tornar pública a promíscua relação entre empresas públicas e privadas no País. Isso porque os dois executivos de mais alta patente da empreiteira paulista Camargo Corrêa, o presidente Dalton Avancini e o vice, Eduardo Leite, investigados na Operação Lava Jato por superfaturamento de obras e pagamento de propinas a funcionários da Petrobras, confirmaram que irão aderir à chamada “delação premiada” em troca do abrandamento de suas sentenças.
Desde o dia 28 de fevereiro, eles se colocaram à disposição dos procuradores do Ministério Público Federal para contar tudo o que sabem – decisão tomada também por outros 13 investigados. Detidos na carceragem da Polícia Federal, em Curitiba, desde novembro do ano passado, Avancini e Leite se convenceram, ao que tudo indica, de que colocar a boca no trombone é, nesta altura do campeonato, a melhor saída. Será que estão certos? Especialistas garantem que sim. Ao reconhecer o erro e colaborar com a Justiça, as empresas conseguem, na maioria dos casos, minimizar os danos à sua imagem, evitar a fuga de talentos – que temem ficar com o currículo manchado pelos escândalos – e preservar contratos considerados estratégicos.
“Assumir o erro e ajudar nas investigações são as escolhas mais inteligentes em episódios como este”, afirma o jurista Modesto Carvalhosa, um tradicional defensor da delação premiada e dos acordos de leniência. “Nos Estados Unidos, estes mecanismos ajudaram a acabar com o crime organizado.” Existem, no entanto, exemplos emblemáticos aqui mesmo no Brasil. Um dos maiores – se não for o maior – é o acordo de leniência assinado pela alemã Siemens, em junho de 2013. A companhia, ao decidir colaborar com a Justiça, ajudou a implodir um complexo cartel que atuava no segmento de trem e metrô em São Paulo desde 1994.
“Na época, fomos mal-interpretados pelo mercado porque resolvemos nos antecipar e contar tudo que sabíamos”, diz um executivo da empresa, que pediu para não ter o nome revelado. “O que foi visto como fraqueza era, na verdade, uma demonstração de força.” Essa mesma fonte cita como exemplo o fato de os alemães terem “cortado na carne”, ao demitir seu então presidente, Adilson Primo, tido na época como o formulador das estratégias que fizeram a gigante alemã crescer de forma exponencial por aqui. “Temos recebido visitas de inúmeros gestores e empresários interessados em conhecer, em detalhes, como lidamos com aquela situação”, afirma a fonte. A postura da Camargo Corrêa nas últimas semanas lembra, em muito, o exemplo da Siemens.
O advogado da construtora, Celso Sanchez Vilardi, nomeado para defender os executivos encarcerados em Curitiba, afirma que a empreiteira quer, a qualquer custo, colaborar com as investigações. “A empresa se dispôs a colaborar, porém o MP não se interessou, inicialmente, em fechar um acordo”, afirma. Alegando questões ligadas ao sigilo processual, Vilardi não confirma se o empecilho foi o valor da multa, que teria sido arbitrada pelo Ministério Público Federal (MPF) em R$ 4 bilhões. Trata-se, de fato, de um valor indigesto para uma construtora que fechou 2013, último balanço consolidado, com receita líquida de R$ 5,9 bilhões, e com uma carteira de contratos de R$ 16 bilhões.
Desde que toparam falar, Avancini e Leite têm sido ouvidos e consultados por integrantes do Ministério Público e o juiz Sérgio Moro, que cuida do caso. Por conta disso, a dupla deverá retomar a liberdade nos próximos dias, segundo o advogado da empresa. Mesmo em prisão domiciliar, eles continuarão à disposição da Justiça e poderão ser chamados para prestar novos depoimentos, inclusive envolvendo a atuação da Camargo Corrêa em obras como a Usina Hidrelétrica de Belo Monte. Por sua vez, João Auler, presidente do Conselho de Administração da empreiteira e o único que ainda é defendido por Vilardi, deve continuar atrás das grades. Procurada pela DINHEIRO, a direção da Camargo Corrêa não quis comentar.
Nem todos os envolvidos nas investigações da Lava Jato estão inspirados a dizer tudo o que sabem nem a seguir o exemplo dos executivos da Camargo Corrêa ou, até mesmo, da Siemens. Na semana passada, um fato que ganhou notoriedade foi o “sumiço” do ex-ministro das comunicações, o petista Paulo Bernardo. Arrolado como testemunha de defesa de Ricardo Pessoa, controlador e CEO da construtora UTC, outro pilar das investigações, Bernardo faltou ao depoimento marcado para quinta-feira 5, sem apresentar qualquer argumento para a ausência. Segundo oficiais de justiça, Bernardo não foi localizado em nenhum de seus endereços e telefones indicados no processo.