05/08/2016 - 19:00
No final do ano passado, a varejista eletrônica Cnova, dona dos sites das Casas Bahia e do PontoFrio, informou ao mercado a existência de um esquema de desvio de mercadorias em seus centros de distribuição, que poderia estar acontecendo havia três anos. Na época, a empresa admitiu perdas de R$ 110 milhões relacionadas ao fato. Nos Estados Unidos, onde a companhia possui ações listadas em bolsa, alguns escritórios de advocacia, no entanto, não se contentaram com as explicações e quatro ações coletivas contra a Cnova foram registradas em uma corte de Nova York. “A empresa falhou em divulgar o fato de que suas operações estavam em acentuado declínio e que sua divisão no Brasil sofria de falta de controle”, afirmou o advogado Reed Kathrein, sócio do escritório Hagens Berman Sobol Shapiro, responsável por um dos litígios. Para ele, ainda existiam fatos a serem revelados.
Um novo documento enviado pela Cnova à SEC, órgão regulador do mercado de capitais americano, traz novas evidências do caso e elucidam algumas questões que ficaram pendentes. Nele, a companhia, controlada pelo varejista francês Casino, dono, também, do grupo Pão de Açúcar, diz que identificou alterações nos balanços feitas pela área de contabilidade, com conhecimento do corpo diretivo, cuja intenção era enganar a empresa de auditoria independente no País, no caso, a EY. Atos de má conduta também foram encontrados na área de tecnologia de informação, que adulterou os registros de acesso a sistemas de gestão da empresa, com o mesmo intuito de ludibriar a auditoria. Como consequência, 13 pessoas foram demitidas. Os efeitos dessas fraudes ainda não foram totalmente conhecidos. “Há uma possibilidade de que uma distorção relevante da empresa nas demonstrações financeiras não seja corrigida em tempo hábil”, diz a Cnova, no documento.
As informações reportadas à SEC também jogam uma nova luz sobre a saída do ex-CEO da Cnova Brasil, German Quiroga. Quando a empresa o substituiu por Flávio Dias, ex-comandante do Walmart.com, em fevereiro, justificou a troca alegando “motivos pessoais” do executivo. Agora, o discurso é de que Quiroga não tomou medidas para interromper os desvios de conduta, além de ter ocultado a existência dessas práticas. Por meio de nota, a Cnova afirmou que “o processo de investigação interna foi concluído e os respectivos efeitos dos ajustes contábeis realizados na Cnova Brasil foram totalmente apurados.” A DINHEIRO procurou Quiroga, mas não recebeu resposta às mensagens.
Em meio a esse processo de reorganização, a varejista estuda um movimento que dará, definitivamente, uma nova vida à companhia no País. Em maio, a Via Varejo, empresa que também é controlada pelo Casino e reúne as lojas físicas de Casas Bahia e PontoFrio, anunciou que está negociando uma união com a Cnova Brasil. A ideia é integrar de forma definitiva as operações físicas e virtuais das varejistas, aproveitando sinergias, especialmente em termos de logística. Foi com essa missão, aliás, que Dias assumiu o posto de CEO. Atualmente, três dos sete centros de distribuição das duas companhias são compartilhados. “Agora que a revisão interna das operações brasileiras está encerrada, podemos dar prosseguimento às conversas com a Via Varejo”, afirmou Emmanuel Grenier, CEO da Cnova, durante teleconferência para apresentação dos resultados, no final de julho. “Vemos isso como um ‘ganha ganha’.”
Nesse contexto, entra, ainda, a família Klein, antiga controladora das Casas Bahia. O empresário Michael Klein estaria se movimentando para assumir o controle da Via Varejo. Klein tem negociado com bancos e fundos de investimento, segundo reportagem do jornal Valor Econômico, para fazer uma oferta pelo controle da empresa. Ele nega as informações. O grupo Casino, no entanto, segundo especialistas no assunto, tem interesse em sair do varejo de eletroeletrônicos, setor em que ele só atua no Brasil. Para a Cnova, separar sua operação brasileira da sua divisão francesa, compreendida, basicamente, pela CDiscount, seria um passo importante nesse processo. Conta a favor dos Klein o fato da Via Varejo ter perdido grande parte do seu valor de mercado nos últimos 12 meses. Os papeis da empresa fecharam o pregão da quinta-feira 4 cotados a R$ 6,58. Há um ano, eles eram vendidos na casa dos R$ 20. Hoje, o valor de mercado da varejista, que faturou cerca de R$ 20 bilhões em 2015, gira em torno de R$ 3 bilhões. Quem sabe assim a direção da empresa possa se concentrar no que importa: vender.