04/03/2016 - 19:40
O executivo Cleber Morais tinha tudo preparado para tirar um ano sabático neste ano. Após duas décadas no comando de grandes empresas de tecnologia, como as americanas Sun e Avaya e a brasileira Bematech – de onde se desligou após concluir a venda da companhia para a compatriota Totvs, por R$ 550 milhões, em outubro do ano passado –, Morais iria se dedicar ao estudo dos vinhos, uma de suas paixões. Seus planos foram interrompidos quando recebeu o convite para assumir a operação brasileira da francesa Schneider Electric, multinacional do setor energético, com mais de 170 anos e um faturamento de € 26 bilhões, o equivalente a R$ 115 bilhões. “Tivemos um alinhamento muito grande em termos de valores corporativos e expectativas”, afirma o executivo. Ele aceitou a proposta e, agora, terá a missão de liderar a fabricante de equipamentos elétricos durante um período histórico de turbulências econômicas no País.
Dois dos seus principais mercados, construção e varejo, enfrentam crises e quedas nas vendas. Ao mesmo tempo, ele ficará encarregado de guiar a companhia pelo tortuoso caminho da transição para o mundo digital, que conhece muito bem.
Morais é considerado um especialista nesse tipo de transição. Quando assumiu a Bematech, em 2011, a empresa era, basicamente, uma fornecedora de impressoras fiscais. O executivo promoveu uma virada de rumo na empresa, que se tornou uma forte competidora no mercado de automação varejista. À época de sua aquisição, a Bematech possuía 500 mil clientes. Na Schneider, o objetivo é parecido, guardadas as devidas proporções. A fabricante tem o desafio de tornar seus disjuntores, quadros de luz e suas tomadas em produtos mais atrativos para o consumidor, que não vê muito valor nesses dispositivos, a não ser pelo design. As possibilidades, no entanto são imensas.
“Estamos muito focados no conceito de internet das coisas”, diz Morais. Trata-se da conexão de equipamentos diversos, domésticos e industriais, à internet, de modo que possam ser melhor gerenciados, até mesmo remotamente. Em uma casa, por exemplo, os produtos da Schneider permitem criar ambientes controlados por software, nos quais o morador consegue ligar eletrodomésticos e até preparar um banho, antes mesmo de entrar no recinto. Na indústria, esse tipo de conectividade permite um controle maior do consumo, além do desenvolvimento de soluções mais econômicas para alimentar máquinas e equipamentos.
A internet das coisas, ou IoT, como é conhecida na sigla em inglês, é um mercado que vem ganhando corpo. O conceito deve movimentar US$ 4,1 bilhões no Brasil, este ano. “Os fabricantes de equipamentos terão de adicionar serviços aos seus produtos ”, afirma João Paulo Bruder, coordenador de pesquisa da consultoria IDC, especializada em tecnologia. “Isso pode ser uma vantagem, uma vez que aumenta as margens de lucro. E quem não se adaptar pode ficar de fora do mercado”
Morais planeja conquistar os consumidores por meio da qualificação da rede de distribuição, que conta com mais de 10 mil parceiros. É um processo semelhante ao que fez na Bematech. Apesar da previsão de um ano difícil, as inovações desenvolvidas pela Schneider, que tem 10 fábricas e mais de 3 mil funcionários no País, devem garantir um crescimento da receita proveniente do Brasil (a empresa não divulga dados sobre o País). Entre as novidades, está uma estação de carregamento de baterias para carros elétricos, que já podem ser encontradas em shoppings de São Paulo, como o Pátio Paulista, na região da Avenida Paulista. “Estamos participando ativamente de todas as grandes tendências do setor energético”, diz Morais.
Em relação ao período sabático, os planos estão adiados, indefinidamente. Morais confessa que teve certa apreensão ao comunicar à família que estava voltando ao comando de uma grande empresa. Os últimos anos foram difíceis em virtude das viagens que tinha de fazer, semanalmente, para a sede da Bematech, em Curitiba, enquanto a família ficava em São Paulo. O apoio, no entanto, foi total.“A compreensão dentro de casa é muito importante para qualquer executivo”, afirma. “Vou tentar fazer alguns sabáticos curtos, agora.” Após anos trabalhando para americanos e brasileiros, para um amante do mundo dos vinhos, estar no comando de uma empresa francesa será de grande ajuda. As reuniões na matriz, em Paris, serão mais saborosas.