O ano de 2015 será lembrado como um dos mais tenebrosos do mercado de capitais. Mesmo assim, algumas empresas conseguiram driblar as reticências dos investidores e captar recursos por meio de operações inovadoras. Um dos casos é o da loteadora mineira Gran Viver Urbanismo, que captou R$ 130 milhões por meio da emissão de um Certificado de Recebíveis Imobiliários (CRI). A novidade, aqui, foram os ativos usados como lastro. Em geral, os CRI são garantidos pela receita de aluguéis de imóveis já ocupados.

No caso da Gran Viver, a garantia são os terrenos a ser loteados e vendidos. “É a primeira vez que uma empresa consegue usar lotes de terra como garantia”, diz Gilberto Freitas, diretor-executivo da Gran Viver. A emissão ocorreu por meio de uma joint-venture da incorporadora com o banco paulista Indusval & Partners, que estruturou a operação. Segundo Freitas, a emissão do CRI resolve uma desvantagem estrutural do negócio. “O mercado imobiliário tem uma estrutura de crédito à disposição, mas isso não ocorre com as loteadoras, que têm de usar capital próprio ou vender suas carteiras aos bancos”, diz ele.

Pouco conhecida no eixo Rio-São Paulo, a Gran Viver é a maior loteadora de Minas Gerais, com um faturamento estimado em R$ 212 milhões para 2015, ante R$ 185 milhões em 2014. Segundo Freitas, a meta, com a captação, é ampliar os negócios em outros estados. A loteadora já tem empreendimentos pontuais no interior paulista e no Rio de Janeiro, e pretende avançar nessas praças. A Gran Viver atua há 40 anos e pertence ao grupo mineiro Séculus. Nascido na década de 1950 como uma empresa que vendia imagens religiosas, mirando o amplo mercado das igrejas mineiras, o Séculus posteriormente migrou para atividades mais mundanas.

Passou a revender jóias e fabricar relógios, sua atividade mais conhecida. Com um faturamento de cerca de R$ 500 milhões em 2015 e empregando 950 funcionários, o grupo também atua no mercado financeiro, com o Banco Semear, na construção civil, na tecnologia e no reflorestamento. Os CRI emitidos têm dez anos de prazo e pagam 10% ao ano mais a inflação medida pelo IPCA. Os R$ 130 milhões são garantidos por R$ 165 milhões em empreendimentos da Gran Viver autorizados a serem vendidos pelas prefeituras dos municípios em que se encontram.

Nessas garantias, entram tanto lotes já vendidos quanto os ainda oferecidos ao mercado. “Como é uma operação inédita, optamos por reforçar as garantias, com uma estrutura robusta de subordinação”, diz Rodrigo Rocha, sócio-executivo do Indusval responsável pela área de banco de investimentos. Segundo Freitas, da Gran Viver, além do custo mais baixo dos recursos, a grande vantagem é o longo prazo dos papéis. “Trabalhávamos sempre com um descasamento de prazos, o tempo de maturação de um empreendimento varia de 24 a 36 meses, e nunca conseguíamos empréstimos nesses prazos”, diz ele. “Agora, esse problema acabou.”

Jair Ribeiro, presidente do Indusval, diz que operações desse tipo deverão tornar-se mais comuns devido às perspectivas de aperto no crédito ao longo dos próximos meses. “Em geral, os bancos estão mais contidos na concessão de empréstimos, e como a economia não está crescendo, não há sinais de que isso mude no curto prazo”, avalia. O próprio Indusval está apostando não apenas na securitização de recebíveis imobiliários, mas também em parcerias semelhantes a serem costuradas com empresas do agronegócio.