11/09/2015 - 20:00
Dois fatos surpreenderam o mercado financeiro na quarta-feira 9 e na quinta-feira 10. O primeiro foi o rebaixamento, antes do previsto, da classificação de risco dos títulos da dívida brasileira pela agência de classificação Standard & Poor’s, conhecida como S&P. Poucos minutos após o fechamento do mercado, a nota, ou “rating” do Brasil foi rebaixada de “BBB-” para “BB+” o que significa a perda do grau de investimento obtido a duras penas, em um processo encerrado em 2008.
Com o rebaixamento, os investimentos no Brasil passaram a ser comparados aos de países como Rússia e África do Sul, ou seja, investimentos especulativos. “Esse movimento não era esperado para tão já, pois as expectativas eram de que outras agências reduziriam a nota brasileira antes da S&P”, diz Paulo Eduardo Nogueira Gomes, economista-chefe da gestora de recursos AZ FuturaInvest, associada à italiana Azimuth. A segunda surpresa foi a reação do mercado no dia seguinte.
Após uma abertura tensa, em que recuou 2,5%, o Índice Bovespa fechou praticamente estável. Na máxima do dia, o dólar chegou a R$ 3,923, alta de 3,4%, mas encerrou os negócios a R$ 3,87%, graças, em parte, a uma intervenção do Banco Central (BC). A autoridade monetária vendeu US$ 1,5 bilhão com compromisso de recompra em janeiro do ano que vem, repetindo sua atuação na terça-feira 8, quando havia vendido US$ 3 bilhões. Como resultado, o dólar subiu 2,2%, mas fechou muito abaixo dos R$ 4,05 previstos por alguns analistas ainda na noite da quarta-feira , antes da abertura dos negócios.
Como explicar uma reação tão sossegada ao que parecia ser uma catástrofe de dimensões bíblicas? Há dois motivos para isso. Um deles é que o ajuste já vinha sendo realizado pelo mercado. “Boa parte do rebaixamento já estava expressa nos preços”, diz Gomes. “Quando a presidente Dilma enviou ao Congresso uma proposta de orçamento que já embutia um déficit de R$ 30 bilhões, o mercado entendeu que a perda do grau de investimento viria muito antes do esperado.” Isso foi confirmado oficialmente pela nota da própria S&P, que justificou sua decisão citando explicitamente as dificuldades políticas na obtenção do ajuste fiscal.
Outro motivo foi que as consequências do rebaixamento ocorreram antecipadamente. O maior impacto da perda da classificação de risco seria a saída súbita de investidores internacionais, como fundos de pensão e seguradoras, que, por estatuto, não podem colocar seus recursos em países com grau especulativo. Desde o início do ano, esses investidores vêm reduzindo gradativamente suas posições em ativos brasileiros. O efeito ruim desse movimento já se faz sentir, há meses, com a contínua alta do dólar e a queda das ações, o que mitigou o impacto da divulgação da notícia.
Mesmo assim, os analistas são unânimes em afirmar que essa calmaria não deve ser tomada levianamente. “A situação é séria, e o impacto sobre os investimentos será profundo ao longo dos próximos meses”, diz o especialista em investimentos Mauro Calil, ligado ao banco paulista Ourinvest. “O ajuste no dólar ainda não terminou, e deverá ocorrer gradativamente ao longo das próximas semanas”, diz ele. As cotações da moeda americana testaram o nível de R$ 3,90. Em seguida, deverão testar o nível de R$ 4,00, e assim sucessivamente.
“A conta do mercado é de que o dólar pode chegar até a R$ 4,20 no fim do ano”, diz ele. Esse movimento afetará as aplicações em renda fixa, em ações e no próprio dólar. Começando pela renda fixa. Na quinta-feira, as taxas de juros de curto prazo no mercado interbancário encerraram os negócios a 14,8% ao ano, acima dos 14,25% da Selic. Os juros mais longos se aproximam de 15,5% ao ano no mercado futuro. “O dólar deverá manter a inflação sob pressão, o que poderá levar o BC a elevar a Selic”, diz Gomes, da AZ.
Notícia péssima para as empresas, mas uma oportunidade de ouro para os investidores. “As empresas terão de pagar mais caro para captar dinheiro, e a rentabilidade das aplicações no crédito privado deverá subir, proporcionando retornos de até 18% ao ano”, diz Calil. “Essa é uma belíssima rentabilidade em qualquer lugar do mundo.” No caso das ações, há vários riscos envolvidos. Além dos títulos da República, 22 empresas, 14 delas listadas em bolsa, também perderam o grau de investimento.
Isso deverá tornar mais difícil para essa turma captar recursos no mercado internacional, o que pode prejudicar seus resultados. “O investidor que ficar tentado a entrar na bolsa agora, em busca de pechinchas, pode ter de enfrentar uma volatilidade muito superior à que está habituado”, diz Gomes. “Quem quiser aproveitar oportunidades na Bolsa deve considerar a hipótese de aplicações estruturadas.” Para o economista, uma boa escolha são os Certificados de Operação Estruturada (COE). Esses títulos foram regulamentados em maio deste ano e permitem que investidores qualificados montem estratégias de mercado usando vários ativos – renda fixa, ações, moedas e derivativos.
“Com um COE, será possível limitar as perdas se as coisas saírem do controle.” O mesmo raciocínio vale para o dólar. Segundo Calil, a maior parte da alta do câmbio já ocorreu. Para chegar nos 10% de valorização potencial, considerando-se a meta de R$ 4,20 estimada pelo mercado, as cotações do câmbio deverão cruzar um terreno muito acidentado. A recomendação é deixar esse investimento para as tesourarias de banco. E apertar o cinto: os pilotos da economia continuam os mesmos.