Uma das áreas mais afetadas pelo surgimento da internet, a indústria fonográfica tenta há mais de uma década encontrar uma maneira de evitar o seu colapso. Os sites de compartilhamento de músicas decretaram o fim do  CD e obrigaram as gravadoras a promover  uma reinvenção no modelo de negócios, sem muito êxito até aqui, por sinal. 

Pois agora um aparelhinho típico da era digital pode significar a tão esperada luz no fim do túnel para o setor, especialmente no Brasil. O smartphone, como é conhecido o celular inteligente, já está sendo visto como o canal de comercialização de canções com o maior potencial de crescimento. Os dados mais recentes  mostram  que eles proporcionaram às gravadoras cerca de R$ 25 milhões de faturamento em 2009, o que representa pouco menos da metade das vendas obtidas com o formato digital no País. 

 

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João Marcelo Bôscoli, da Trama: Os consumidores estão mais preocupados

em ter acesso ao trabalho dos artistas do que em possuí-lo

 

Também são responsáveis diretos por estancar  a derrocada do mercado fonográfico nacional, que em 2009 cresceu apenas  1%. Embora o setor tenha se mostrado estável, a comercialização de downloads subiu 26% no período. Ainda não há estimativas oficiais para 2011, mas a expectativa é de que o celular corresponda a até 80% dos downloads musicais no Brasil ao final deste ano.  

 

O fortalecimento desse canal é um importante aliado para elevar as cifras geradas pelo formato digital, segmento que movimentou US$ 4,6 bilhões no mundo no ano passado e, em 2011, deve ultrapassar as vendas de CDs nos Estados Unidos. Mas ainda  há muitos problemas pela frente. Isso porque os negócios virtuais ainda não têm volume suficiente para compensar as perdas causadas pelo declínio dos CDs. No ano passado, por exemplo, o mercado fonográfico americano caiu 6,8%. A importância do smartphone é maior no Brasil, o que se explica pelo perfil do usuário.

 

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José Pena, da EMI

 

Um estudo realizado pela TNS mostra que no País a propensão de um consumidor por baixar no seu telefone algum aplicativo musical é mais de duas vezes superior ao registrado em outros países. Mais de 60% dos brasileiros aceitam pagar por um download de música, enquanto na média global a porcentagem é de 51%. Diante desse cenário, as gravadoras começam a criar estratégias para a telefonia móvel. 

 

Uma dessas empresas é a Deck, selo carioca independente que fez um acordo com a Nokia para embarcar o álbum “Ao Vivo”, da cantora de rock Pitty, em seus celulares. O resultado foi a comercialização de 200 mil arquivos do trabalho. “Hoje, as vendas digitais já empatam  no faturamento com as vendas de CDs”, diz Fábio Silveira, diretor de novos negócios da Deck.  O entusiasmo com o celular é compartilhado por José Pena, diretor responsável pelo departamento digital da gravadora EMI na América do Sul. 

 

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Para Pena, os consumidores estão mais preocupados em ter acesso ao trabalho dos artistas do que em possuí-lo. Por isso, a gravadora aposta no modelo de assinaturas. A telefonia móvel também permite contornar um obstáculo que ainda atrapalha as transações financeiras pela rede: muitos consumidores não possuem cartão de crédito, o que restringe as vendas virtuais. Pelo celular, o valor do download é debitado na fatura mensal do cliente da operadora. 

 

Se os dispositivos móveis resolvem a questão do pagamento, existe ainda o problema do custo do tráfego de dados. As gravadoras têm dificuldade para fazer acordos com as empresas de telefonia para reduzir as cobranças por esse serviço. “É quase como mexer na padaria dos outros”, afirma Gian Uccello, diretor de novas mídias da Warner. Fundador do grupo Trama, João Marcelo Bôscoli, filho da cantora Elis Regina, diz que o mercado fonográfico cometeu um erro crasso ao tentar prolongar a vida dos CDs.  

 

“Lutar contra essa nova realidade digital é contraproducente”, diz Bôscoli. “O que temos de fazer é gerar receita com essa audiência por meio de patrocínios e ações de marketing.” Atualmente, metade do faturamento da Trama é obtida de acordos com empresas para anúncios em programas de rádio, tevê e shows.  Em média, cada contrato desse tipo representa R$ 600 mil por ano para a companhia. Entre as patrocinadoras estão Volkswagen, Audi, Natura e Red Bull.