Você se lembra da imagem de durona, com cara de poucos amigos e frequentemente mal-humorada da presidenta Dilma Rousseff? Esqueça. Esse retrato já é coisa do passado. Dilma iniciou o ano disposta a dar uma nova imagem ao seu governo. A “gerentona” mostrou uma outra face. Está mais preocupada em fazer política e em criar as bases para o crescimento do País. A meta principal é atingir um “pibão bem grandão” com um protagonismo da iniciativa privada. Se nos primeiros dois anos, Dilma praticamente não se encontrou com os empresários, a não ser em largas e muitas vezes improdutivas reuniões em grandes grupos, agora a estratégia mudou. 

 

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Novo estilo: a presidenta Dilma Rousseff quer que o setor privado

seja o protagonista do crescimento

 

Ao voltar das férias, ela abriu sua agenda para encontros privados com grandes nomes do PIB nacional, uma prática que pretende manter durante todo o ano. Só nas duas últimas semanas, passaram pelo terceiro andar do Palácio do Planalto, onde fica o gabinete da Presidência da República, alguns dos homens mais poderosos e ricos do País, que comandam conglomerados que faturam bilhões de reais. As conversas foram individuais, sem a presença de ministros e sem o habitual registro fotográfico oficial, e duraram mais de uma hora em alguns casos. Dentre os convidados, os presidentes Marcelo Odebrecht, do Grupo Odebrecht; Luiz Carlos Trabuco, do Bradesco; Murilo Ferreira, da Vale; Rubens Ometto, do Grupo Cosan; Jorge Gerdau, do Grupo Gerdau; e Eike Batista, do Grupo EBX. Nesta semana, irá receber o banqueiro espanhol Emílio Botin, presidente do Santander. 

 

Quem leu os jornais ou acompanhou o noticiário das rádios e tevês dos últimos dias deve ter imaginado que, nesses encontros, a conversa tenha sido pesada, com uma presidenta arrasada, quase deprimida, preocupada com ameaças de todo o tipo. Num dia o “pibinho”, no outro a ameaça de racionamento de energia, no próximo a sombra da inflação. E, para completar, as constantes – e muitas vezes equivocadas – opiniões da mídia internacional sobre o “jeitinho brasileiro” de conduzir a política econômica. Seriam motivos suficientes para muitas noites de insônia, certo? Errado. Nas reuniões com os empresários, a presidenta esbanjou alegria, sorrisos e um otimismo nunca vistos no seu governo. E falou o que o setor produtivo queria ouvir. Disse que tinha chegado à conclusão de que o setor público era incapaz de liderar uma nova onda de investimentos no País. 

 

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Esse papel, a partir de agora, terá de ser exercido pela iniciativa privada. Segundo a DINHEIRO apurou, em nenhum momento cogitou-se a hipótese de uma eventual mudança no comando do Ministério da Fazenda, apesar de todo o fogo cerrado sobre Guido Mantega. A disposição da mandatária é de não mexer em nenhum ministério forte. As mexidas serão pontuais, para abrigar alguns partidos políticos, como o PSD, do ex-prefeito de São Paulo Gilberto Kassab, o que deve acontecer depos do Carnaval. E só. Houve cobranças dos dois lados da mesa, claro. Ela pediu mais investimentos, e os empresários, mais garantias para investir.

 

PLANOS À MESA Os resultados já começaram a aparecer. Animados com a disposição demonstrada por Dilma, alguns representantes do PIB industrial se comprometeram a aumentar seus investimentos. Um dos mais empolgados com o encontro, Marcelo Odebrecht colocou à mesa um plano de investimentos de R$ 17 bilhões, aumento de 30% em relação ao desembolsado pelo grupo Odebrecht em 2012. A conversa foi bastante ampla, de infraestrutura a Venezuela, onde a empresa tem investimentos. “Ela quer saber a nossa opinião sobre o que pode ser feito para ajudar a destravar o País, melhorar a questão dos investimentos e o crescimento”, resumiu, depois de uma hora e meia de conversa. 

 

Ficou claro que o aumento dos investimentos, de 18,7% do PIB para 20% do PIB, é uma obsessão da presidenta Dilma. De Rubens Ometto, ela ouviu a decisão de aumentar em R$ 1 bilhão seus investimentos para 2013, para R$ 5 bilhões. O empresário queixou-se da política do governo de manter o preço artificialmente baixo da gasolina por muito tempo, o que afeta o mercado de etanol e a capacidade de investimento das usinas. Dilma acenou com a possibilidade de normalização do mercado, a começar pela ampliação de 20% para 25% da mistura do etanol na gasolina, confirmado na quinta-feira 17. Além disso, já está decidido um aumento de 7% no preço da gasolina – só falta anunciar a data.

 

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Agora vai?: a Cosan acredita que o setor de etanol vá recuperar terreno com a autorização

do governo de reajuste de 7% da gasolina

 

A presidenta também recebeu outro interlocutor frequente: Jorge Gerdau, que mantém um pé no governo ao presidir a Câmara de Políticas de Gestão, Desempenho e Competitividade, criada para melhorar a gestão dentro dos ministérios e órgãos federais. O único que manteve com Dilma uma pauta específica foi Eike Batista, que tratou do porto de Açu, no Rio (ver coluna Guilherme Barros). Já com Luiz Carlos Trabuco, presidente do Bradesco, Dilma manifestou maior interesse em discutir formas de aumentar o crédito de longo prazo no País, missão hoje exercida por uma única instituição, o BNDES. Ela quer encontrar formas para que o setor financeiro privado também passe a conceder empréstimos de longo prazo para financiar o investimento. 

 

Financiamento de longo prazo, aliás, é um pleito da construção pesada. O presidente do Sindicato Nacional da Indústria Pesada (Sinicon), Rodolpho Tourinho, sugeriu a criação de mecanismos de financiamento privado, para reduzir a dependência do BNDES, e melhorias nas regras das PPPs. Já a multinacional de origem francesa Lafarge, fabricante de materiais de construção, anunciou investimentos de R$ 1 bilhão no País nos próximos cinco anos. “As necessidades em infraestrutura e construção de habitações, como bem lembrou a presidenta Dilma, só fazem lembrar que o País ainda tem muita margem para crescer”, afirmou o presidente da Lafarge, Bruno Lafont. 

 

A presidenta também recebeu o presidente mundial do grupo Isolux Corsán, Antonio Portela Alvarez, que tem investimentos no setor de energia elétrica. Os encontros indicam que Dilma assimilou que o crescimento da economia depende, essencialmente, do despertar do “espírito animal” dos empresários. Embora jamais diga isso publicamente, ela já se sentirá satisfeita se o País crescer 3,5%. O que é importante, na sua avaliação, é manter as atuais condições da economia, com desemprego baixo e renda ascendente. São ingredientes que fazem com que um crescimento de 3,5% tenha o mesmo sabor de 5%. Se o bolo tiver o setor privado no recheio e na cobertura, a receita será um sucesso.

 

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Colaborou: Luís Artur Nogueira