26/08/2022 - 0:10
O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, assustou o mercado ao dizer que não aceitará mais um novo mandato, após o seu ser concluído em 2024. Ele é o primeiro titular da autoridade monetária a ter estabilidade no cargo, mas não pensa em continuar após cumprido o período inicial estabelecido. De alguma forma, técnico de carreira e com convicções liberais firmes, o neto do lendário economista Roberto Campos demonstra claramente ser contra o mecanismo da reeleição, mesmo que por direito. Ele próprio admite não ter concordado com a inclusão da medida quando a regra da autonomia foi criada. Tentou tirar do projeto o instrumento da recondução, sem sucesso. A admissão pública da posição de Campos ainda gera controvérsias na praça. Para muitos, não se trata de politicamente oferecer benefícios a esse ou aquele indicado. Seria muito mais uma questão de gerar a sensação de estabilidade administrativa dentre os agentes financeiros. Sujeita a grandes movimentações e percalços a qualquer sinal de ruído, os investidores temem reorientações bruscas de conceito do BC. Todos são unânimes em apontar os avanços e inovações promovidos por Campos e dizem gostar do seu estilo técnico. Já ele alega que não considera “saudável” o método de duplicar mandatos como princípio. Lembra que o fator pode, também no BC, criar fragilidades, uma vez que no meio da gestão o titular do posto acaba por ficar naturalmente focado na recondução e torna-se, assim, exposto às vontades e interferências do Executivo. Em outras palavras: a pretensão de um BC independente é, no seu entender, ferido de morte justamente pela chance de o governo em exercício conseguir, em determinado momento, definir se o comandante da organização continua ou não dirigindo em uma nova temporada. Tentando evitar esse constrangimento é que Campos já avisa de antemão que não irá se submeter a tal saia justa, seja qual for o presidente que desponte vitorioso das urnas. O aviso veio antecipado para não denotar qualquer tipo de orientação ideológica na decisão. A atual lei de autonomia do BC estabelece mandatos fixos de quatro anos ao presidente e aos diretores, de forma escalonada, podendo eles serem novamente confirmados para outro período equivalente, no caso estendendo a permanência até 2028. Diplomaticamente, para não ferir expectativas da banca, Campos alega que seu trabalho no BC já está em grande parte realizado. Aponta que o País é um dos poucos que já está precificando uma queda de juros pela frente, com um trabalho ágil, sistemático e consolidado dentro do modus operandi do Banco. Notórios avanços do BC decerto foram sentidos desde que ele assumiu a missão. Da entrada em funcionamento do PIX ao Open Banking e agora o Open Insurance, o presidente do BC não parou de perseguir a inovação e métodos mais ágeis de operacionalizar o sistema. Tem sido bem sucedido na jornada, como poucos antecessores conseguiram. No plano da política monetária, o combate à inflação, que se tornou uma chaga para o mundo inteiro, ainda está em curso, mas suas medidas dão sinais de conseguir arrefecer o impacto mais violento dessa carestia. No último mês o Brasil experimentou uma deflação, fenômeno que pode se repetir também ao final de agosto. É bem verdade que, no caso, o resultado foi em parte possível graças a medidas artificiais de interferências nos preços estratégicos como o do petróleo. De todo modo, a sinalização e imagem de um BC agindo eficazmente estão sendo consolidadas, inclusive no plano internacional. É de se esperar que nada mude de rota com a eventual saída de Campos mais adiante.
Carlos José Marques
Diretor editorial