Josué Gomes da Silva, presidente e principal acionista da Coteminas, acompanha de perto as oscilações do mercado de algodão. “Nossa empresa é um dos maiores compradores individuais desse produto no Brasil. Adquirimos cerca de 120 mil toneladas todos os anos”, disse ele à DINHEIRO. Para financiar essas aquisições, Gomes da Silva recorria, até o primeiro semestre, às fontes tradicionais de financiamento, em sua maioria empréstimos bancários. No entanto, no início de junho, a Coteminas passou a se servir de uma nova fonte de recursos, os Certificados de Recebíveis do Agronegócio, título de renda fixa conhecido por sua abreviação CRA.

Tradicionalmente ligado a produtores rurais ou a bancos que financiam as atividades agrárias, esse título começa a cair no gosto das indústrias, o que pode fazer esse mercado dobrar de tamanho antes do fim do ano. “É essencial contarmos com várias fontes de financiamento”, diz o presidente da Coteminas. O nome complicado do CRA mascara uma estrutura financeira simples, que permite a empresários do setor agrícola antecipar o recebimento de recursos de sua atividade. Um produtor de café, por exemplo, pode vender sua safra ainda não colhida para uma beneficiadora, que se compromete a pagar quando o grão for entregue.

Enquanto essa data não chega, o fazendeiro pode antecipar os recursos usando os contratos de venda como garantia do CRA, que é comprado por um investidor. Uma evolução do tradicional desconto de títulos a prazo, o CRA permite enfeixar papéis com diversos valores, prazos e remunerações, transformando-os em um título financeiro facilmente negociável no mercado. A vantagem para a empresa que emite esses papéis é que seu custo financeiro é inferior ao dos empréstimos bancários tradicionais. Para o investidor que compra esses títulos, a remuneração é isenta de Imposto de Renda, embora eventuais ganhos de capital sejam tributados.

No caso da Coteminas, a estrutura foi um pouco mais complexa. A empresa emitiu debêntures simples, garantidas por imóveis, e essas debêntures serviram de lastro para os CRA. Os títulos têm prazo de três anos, vencem em junho de 2017, e pagam uma remuneração equivalente a 110% dos juros de mercado medidos pelo CDI, o que representa pouco mais de 12,1% ao ano. “Foi uma alternativa barata e vantajosa”, diz Gomes da Silva. Outras empresas estão seguindo o mesmo caminho. No fim de agosto, a Raízen iniciou o processo de captação de cerca de R$ 500 milhões em CRA, ainda sem prazo nem remuneração definidas.

“Há outras operações em preparação”, diz Julian Hester, diretor de renda fixa do Banco Fator, bastante ativo nesse mercado. “Muitas empresas não conheciam ou não acreditavam no produto, mas, ao perceberem que grandes nomes estão emitindo CRA, elas começam a preparar seus próprios processos”, diz ele. “Essa alternativa entrou no radar das companhias”, diz o advogado Carlos Ferrari, sócio do escritório paulista N, F & BC Advogados. Todas as operações precisam de aprovação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), autarquia muito severa com quem fala demais antes da emissão.

Por isso, os participantes das empresas de securitização, os mais ativos desse mercado, relutam em declarar nomes e prazos. No entanto, pelas contas de quem conhece o setor, além dos R$ 500 milhões da Raízen, há pelo menos outros R$ 700 milhões em operações prontas, aguardando apenas a abertura das urnas e o fim da turbulência eleitoral. Uma das candidatas, dizem os especialistas, é a companhia de fertilizantes Mosaic, que estaria preparando a captação de uma cifra entre R$ 100 milhões e R$ 200 milhões. Procurada, a Mosaic não se pronunciou. Hester, do Fator, diz acreditar que a vinda desses novos participantes vai permitir a ampliação do mercado.

Regulamentados há pouco mais de oito anos, os CRA sofreram, em seus primeiros tempos, com a desconfiança dos investidores, especialmente quando os produtores rurais que os lançavam eram empresários de pequeno porte, que ofereciam maior risco de inadimplência. Agora, a vinda de nomes consagrados como Coteminas e Raízen deverá mudar isso. “Os produtores e os investidores estão se profissionalizando e há um amplo processo educacional em curso”, diz ele. “Isso vai ajudar o CRA a conquistar uma importância comparável à dos títulos lastreados por ativos imobiliários.”