Nos últimos anos, a indústria brasileira de caminhões tem derrapado na subida. No começo da pandemia, sofreu com a falta de componentes, principalmente os que são made in China. Desde o ano passado, os vilões são os juros altos e a escassez de crédito. O que ajudou o setor a não andar para trás foi o agronegócio. Os números mostram esse cenário. O mercado registrou em 2022 a venda de 124,5 mil unidades, ligeira queda de 2,1% sobre os 127,2 mil de um ano antes segundo a Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave). E o segmento acima de 16 toneladas (semipesados e pesados), os mais utilizados no campo para transporte de grãos, sucos e combustíveis, por exemplo, foi muito bem, obrigado. Prova disso é a sueca Volvo, líder das categorias pela primeira vez no ano passado. Por só atuar nesses nichos de caminhões de grande porte, a montadora cresceu 10%, de 21,8 mil para 24 mil unidades.

Embora tenha crescido dois dígitos em um mercado geral que encolheu, os resultados ainda não empolgam Wilson Lirmann, presidente do Grupo Volvo América Latina. Ele enxerga no horizonte uma retração da indústria neste ano e uma freada nos negócios da Volvo. Na visão dele, o mercado de caminhões semipesados e pesados deve comercializar 75 mil unidades, queda de 30% na comparação anual — ou quase 23 mil unidades a menos. “Se olharmos para a série histórica, 75 mil unidades não é um mercado ruim. Portanto, não sou pessimista, mas ainda assim é um ano de ajustes”, disse.

As previsões de Lirmann se mostram acertadas com base nos números totais do mercado em janeiro. Foram emplacados 10,2 mil caminhões, queda de 15,3% em relação a dezembro de 2022, com 12 mil. A Mercedes-Benz liderou as vendas, com 29,7% de participação, seguida por Volkswagen (21,9%), Volvo (20,3%), Scania (11,7%) e DAF (7,9%).

Apesar da redução nos negócios na abertura da temporada, o presidente da Fenabrave, Andreta Junior, acredita no crescimento das vendas ainda no primeiro trimestre. “A mudança de tecnologia para atender o Proconve P8 pode aumentar a procura pelo estoque de modelos com motores Euro 5”, disse ele, em referências às novas regras de controle de emissões que passaram a vigorar no mês passado. No entanto, os caminhões com sistema antigo podem ser emplacados até março.

Líder pelo segundo ano consecutivo (2021 e 2022) do mercado nacional, a Volkswagen credita o resultado a uma combinação acertada de veículos e serviços com pós-venda de qualidade. “Temos mantido ciclos consecutivos de investimentos, expandimos a nossa atuação para novos segmentos e reforçamos a oferta nos que já estávamos presentes”, afirmou Roberto Cortes, presidente e CEO da Volkswagen Caminhões e Ônibus.

De OLHO NO AGRO Scania aposta em safra recorde para ampliar as vendas ao setor, que hoje representam 44% dos negócios. (Crédito:Divulgação)

Com 27,7% de participação, a Volkswagen fechou a última temporada apenas 0,5 ponto percentual à frente da Mercedes, vice-líder. Sem detalhar as expectativas para 2023, a montadora anuncia 30 novos caminhões e ônibus focados em “eficiência, conforto, segurança e tecnologia” para ampliar a presença no mercado. Até 2025, a empresa comandada por Cortes realiza ciclo de investimentos de R$ 2 bilhões para lançar tecnologias focadas em mobilidade mais sustentável, como a propulsão elétrica e a melhoria da eficiência energética com redução de CO2.

Com 27,4% de share em 2022, a Mercedes comercializou 34,2 mil caminhões, contra 34,5 mil da líder Volkswagen. Listada na bolsa de valores, a Mercedes disse não poder fazer balanços até a divulgação pela Daimler Truck AG, em março.

Já a Scania vive o desafio de elevar a sua participação no País. A bandeira sueca terminou 2022 na quarta posição, com 10,6% de share e 13,2 mil exemplares negociados, queda de 16% na comparação anual. A justificativa está na crise de semicondutores que afetou a indústria global, principalmente na virada de 2021 para 2022.

O plano da montadora é fechar a temporada “com 14%, 15% de participação”, de acordo com Alex Nucci, diretor de vendas de soluções de transporte. E a tarefa mostra-se das mais desafiadoras. A Scania segue estimativa da Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores) e aposta em queda de 10% a 11% nas vendas em geral em 2023, puxada por “juros altos, mais dificuldade na obtenção de crédito e incremento de ao menos 20% nos preços dos caminhões diante do aumento da tecnologia para Euro 6”, segundo ele.

Diante da situação, o agronegócio tornou-se a esperança de dias melhores. O setor é responsável por 44% das vendas da companhia e vive a expectativa de safra recorde em 2023. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a previsão é que sejam colhidas 302 milhões de toneladas de grãos, cereais, leguminosas e oleaginosas, alta de 14,7% (ou 38,8 milhões de toneladas) na comparação anual. Uma carga de peso e de relevância para qualquer montadora.