26/08/2016 - 20:00
Na última terça-feira, 23, chegou ao fim a um impasse que ganhou os holofotes na indústria automobilística mundial. Depois de longas horas de negociação, a Volkswagen entrou em acordo com o grupo europeu Prevent para que o fornecedor restabelecesse a entrega de peças, como bancos e componentes de câmbio, usadas na linha de produção da montadora. O fornecimento havia sido interrompido como uma reação a supostos cancelamentos de contratos sem aviso prévio ou compensação por parte da Volkswagen. O imbróglio já se arrastava por quase uma semana e forçou a paralisação de seis fábricas na Alemanha, afetando cerca de 28 mil trabalhadores. Analistas estimam que o caso vai gerar uma prejuízo de E 100 milhões para a montadora no país. Com uma receita de E 700 milhões, o Prevent vem ganhando escala no setor de autopeças, especialmente por meio de aquisições.
Se em solo europeu a história teve um desfecho positivo, no Brasil, o enredo promete novos capítulos. Na semana passada, a Volkswagen rescindiu o contrato com o grupo no País. Segundo a montadora, o rompimento foi motivado pelas seguidas falhas no fornecimento de peças. Os problemas começaram em março de 2015. Em comunicado, a Volkswagen divulgou o saldo dessa relação conturbada. A produção está suspensa em três fábricas locais. Desde março, 130 mil veículos deixaram de ser fabricados (leia quadro ao lado). A DINHEIRO tentou contato com o Grupo Prevent, mas não foi atendida.
A Volkswagen não foi a única montadora a enfrentar problemas com o Grupo Prevent. Em maio, a Fiat suspendeu a produção em Betim (MG). Mais do que casos isolados e restritos a esses fatores, esses exemplos expõem a forte interdependência entre montadoras e fornecedores. Em entrevista à DINHEIRO, no início do ano, David Powels, CEO da Volkswagen no Brasil, reconheceu que essas parcerias precisam ser aprimoradas. “Durante anos, não prestamos muita atenção nas coisas que aconteciam do lado de fora das nossas fábricas”, afirmou.
Pode soar estranho que companhias do porte da Volkswagen e da Fiat paralisem suas produções por conta de um único fornecedor. Mas, segundo especialistas ouvidos pela DINHEIRO, uma dinâmica do setor explica esse contexto. Com a crescente complexidade de recursos e da tecnologia embarcada nos carros, cada vez mais, a produção passou a exigir a participação de especialistas externos. “Diferentemente de outras indústrias, boa parte do valor agregado da cadeia automobilística está nas mãos dos fornecedores”, diz Rodrigo Custódio, diretor da consultoria Roland Berger.
Como reflexo dessa crescente relevância, as montadoras passaram a financiar equipamentos para os fornecedores. “É uma prática natural concentrar projetos em um parceiro, pois evita a ampliação dos custos e a perda de escala na produção”, diz um executivo do setor, que pediu anonimato. Essa abordagem, porém, esconde uma fragilidade. No caso de algum problema, a migração para outro parceiro é complexa e pode levar meses. “Há diversas questões que vão desde a estabilização dos equipamentos no novo parceiro até à disponibilidade de matéria-prima para retomar a fabricação daquela determinada peça.”
A queda nas vendas no Brasil só reforça os desafios. “Montadoras e fornecedores sempre trabalharam muito próximos”, afirma Custódio. “Mas em um momento em que toda a cadeia está sob imensa pressão, não é uma surpresa que as tensões de lado a lado favoreçam os ruídos nesse diálogo.”