05/10/2011 - 21:00
Os consultores mineiros Vicente Falconi e José Martins de Godoy tiveram uma relação amistosa na maioria dos 38 anos em que trabalharam juntos. Os dois foram professores de metalurgia na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) na década de 1970. Ambos, hoje com 71 anos, prestaram também consultoria na Fundação Christiano Ottoni, ligada à instituição. Nos anos 1990, deixaram a academia e criaram a Fundação de Desenvolvimento Gerencial (FGD), que depois foi rebatizada de Instituto de Desenvolvimento Gerencial (INDG). Sob o comando dos professores Falconi e Godoy, como são conhecidos no mercado, o INDG se transformou na mais influente consultoria de gestão do Brasil. Ao longo do tempo, os dois foram elevados à condição de gurus de alguns dos mais importantes empresários brasileiros, como Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira, da AB InBev, Jorge Gerdau Johannpeter, da Gerdau, e Edson de Godoy Bueno, da Amil – Telles, Sicupira e Bueno, inclusive, fazem parte do conselho do INDG.
A cara do iNDG: Falconi é autor de sete livros que já venderam mais de 1 milhão de exemplares.
Palestrante requisitado em eventos de gestão, ele é a face pública da consultoria mineira,
que influenciou os mais importantes empresários do Brasil nas última três décadas
Atualmente, os mais de mil consultores da firma atuam em 360 projetos em empresas e em governos estaduais, como os de Minas Gerais e do Rio de Janeiro, o que rendeu um faturamento de R$ 307,8 milhões em 2010. Nessa parceria de quase quatro décadas, Falconi sempre foi a face mais visível do INDG, palestrante requisitado e autor de sete livros que venderam mais de 1 milhão de exemplares. Godoy, por sua vez, era o homem administrativo, avesso à exposição. No dia 13 de setembro deste ano, no entanto, essa aliança foi rompida. Godoy, que dividia o controle da consultoria com Falconi, vendeu sua participação e deixou a empresa. Para quem acompanhava o dia a dia do INDG, o fim da sociedade não chegou a ser uma surpresa. Até as calçadas do bairro da Savassi, em Belo Horizonte, sabiam que a relação dos dois fundadores estava desgastada há tempos.
“Em um evento para os consultores em 2010, presenciei uma cena em que eles evitaram subir no mesmo elevador”, diz um ex-funcionário do INDG ouvido pela DINHEIRO. As desavenças entre Falconi e Godoy começaram em 2008. Na época, Falconi insistiu na antecipação da sucessão na consultoria. Chegaram a contratar a empresa de recrutamento alemã Egon Zehnder para encontrar um sucessor, mas o plano foi adiado. Publicamente, ambos disseram que desistiram de contratar um executivo em razão da crise financeira global. Na verdade, Godoy resistiu ao plano. Em 2011, a temperatura entre ambos voltou a subir. Mateus Bandeira, ex-presidente do banco gaúcho Banrisul, assumiu a presidência-executiva do INDG, em janeiro deste ano. Bandeira foi indicação do próprio Godoy. Mas, desde o primeiro dia, de acordo com fontes ouvidas por DINHEIRO, ele resistiu ao executivo.
José Godoy: fundou o INDG com Falconi, mas era avesso à exposição e cuidava da parte administrativa da consultoria
Sete meses depois, já como presidente do conselho de administração, enviou, em 1º de julho, um e-mail para os mais de mil consultores do INDG. Na mensagem, Godoy expõe suas divergências com a atual administração da consultoria. “Defendi veementemente que o momento ruim referente a vendas não justificava em hipótese alguma que o plano de evolução na carreira de nossos consultores fosse afetado”, escreveu. Em outro trecho, ironiza indiretamente Bandeira, ao dizer que as promoções deveriam acontecer, pois o lucro líquido da consultoria seria alcançado, “apesar de alguns gastos supérfluos agregados pela atual gestão.” No longo e-mail, Godoy reclama do desempenho de vendas no primeiro semestre do INDG, que era praticamente igual ao do ano passado. “Cabe ressaltar que, em janeiro de 2011, tínhamos uma equipe de 1.121 consultores, contra cerca de 750 em 2010”, escreveu. “Logo, a taxa de ocupação é a menor da história do Instituto.” E por fim, concluiu: “O resultado do primeiro semestre, portanto, é aquém do nosso potencial.”
O texto soou como uma declaração de guerra. “Foi uma deslealdade total”, diz uma pessoa próxima a Falconi. “Isso era assunto para o Conselho e não para ser discutido abertamente com todos os consultores.” A resposta de Falconi não demorou. Por e-mail, ele defendeu o atual presidente-executivo do INDG. “O Mateus tem 41 anos e ficará, certamente, conosco pelas próximas décadas”, escreveu. “Ele é a pessoa que o conselho de administração do INDG escolheu para nos conduzir para o futuro e assim será.” O clima, que já era ruim, azedou de vez após a troca pública de mensagens eletrônicas. A partir daí, começaram as tensas negociações, que resultaram na saída de Godoy da sociedade. Pelo acordo, o ex-sócio de Falconi não pode competir com o INDG por um período de três anos. Mas não há nenhuma restrição aos seus familiares.Um dia após Godoy ter deixado a consultoria, passou a funcionar o Instituto Áquila, fundado por seu irmão Raimundo Godoy, ex-consultor do INDG.
Bons tempos: em janeiro deste ano, quando Mateus Bandeira (centro) assumiu a presidência-executiva do INDG,
os sócios Falconi (à esq.) e Godoy vestiam a mesma camisa. Com o passar do tempo, o clima azedou na cúpula da consultoria
O nome não deixa dúvidas de que Raimundo e seus associados irão concorrer com o seu antigo empregador. Áquila lembra águia, assim como Falconi, falcão. A consultoria rival, que já está prospectando clientes, começa a operar com mais de 100 consultores, todos ex-funcionários do INDG. Entre eles, Luiz Otávio Barros de Souza, diretor comercial e de operações, que assumirá a presidência da Áquila. “Nesse processo, esses profissionais tiveram a opção de vir trabalhar conosco”, disse Raimundo à DINHEIRO. Ele fez questão de dizer que seu irmão não terá nenhuma participação na empresa. Não é a primeira vez que surge uma dissidência do INDG. Em maio de 2010, nove ex-executivos da consultoria fundaram a Avention. Ao contrário do Instituto Áquila, eles optaram por não competir diretamente contra o ex-mentor e focaram a atuação em companhias familiares. Procurados, Falconi e Godoy não quiseram se pronunciar.
Trinca famosa: (de cima para baixo) Telles e Sicupira, da AB InBev, e Bueno, da Amil, fazem parte do conselho do INDG