27/12/2013 - 21:00
Em 1987, a construtora mineira Andrade Gutierrez teve de comprar uma empresa, a Zagope, em Portugal, para viabilizar suas obras na África. Na época da “década perdida” para a economia brasileira, nenhum banco queria financiar projetos do País e era preciso apelar a um trampolim para se inserir no cenário internacional. Essa prática, que também foi seguida pela empreiteira baiana Norberto Odebrecht com a aquisição da construtora Bento Pedroso, no ano seguinte, era o preço a pagar pela moratória decretada em 1982, que fechou as portas do sistema financeiro internacional para as empresas nacionais.
Expansão externa: funcionários da construtora Odebrecht reunidos em obra realizada no Equador
“Naquela época, o Brasil não tinha crédito nem credibilidade”, diz Carlos Abijaodi, diretor de Desenvolvimento Industrial da CNI, que trabalhava na Andrade Gutierrez e era responsável por garimpar possíveis encomendas de obras em outros países. Assim como no mercado de consumo, a estabilidade dos últimos 20 anos na economia brasileira também facilitou a vida das empresas que se relacionam com o mundo. “Hoje a situação é muito diferente: somos ouvidos e respeitados”, diz Abijaodi, que no início de dezembro participou da conferência da Organização Mundial do Comércio (OMC) em Bali, na Indonésia.
Do tempo em que era preciso disfarçar a origem da empresa até os dias de hoje, muita coisa mudou. A economia brasileira cresceu e se tornou a sétima maior do mundo – ou sexta, dependendo da taxa de câmbio. Nos últimos 20 anos, as transações comerciais, representadas pela soma das exportações e das importações, deram um salto: de US$ 76,6 bilhões, em 1994, para US$ 442 bilhões neste ano, no acumulado até novembro. A participação nacional no comércio mundial ainda é pequena, de apenas 1,7% do total, mas dobrou nos últimos anos.
Mesmo sem condições de competir em igualdade de condições com gigantes emergentes, como a China, que cresce a uma velocidade impressionante há três décadas e em poucos anos chegou ao posto de segunda maior economia mundial, ou a Índia, que tem economistas espalhados pelos principais bancos e instituições de ensino do mundo, o Brasil não faz feio. Aos poucos, o País começou a ser chamado para os grandes debates. Em 2001, o economista Jim O’Neill, do banco americano Goldman Sachs, criou o acrônimo BRIC para designar o grupo de países – Brasil, Rússia, Índia e China – que, na avaliação dele, seriam os maiores do mundo em poucas décadas.
Eles souberam pegar a deixa e transformaram a sigla, que sofreu o acréscimo de um S com a inclusão da África do Sul, num grupo de articulação política dos emergentes. Nos últimos anos, o Brasil liderou também iniciativas importantes. Ajudou a articular a criação do G-20, que defendeu a posição dos exportadores agrícolas na reunião da OMC de Cancun, em 2003. Cinco anos depois, participou do chamado G-20 financeiro, para discutir saídas para a crise econômica. O que faltava era ocupar as estruturas permanentes das instituições. Durante cinco anos, até 2011, o economista Murilo Portugal, hoje presidente da Febraban, ocupou o posto de vice-diretor-geral do Fundo Monetário Internacional (FMI).
Em 2011, o engenheiro agrônomo José Graziano da Silva assumiu a direção da FAO, a agência da ONU que cuida de alimentação. Finalmente, em setembro de 2013, o embaixador Roberto Azevêdo se tornou diretor-geral da OMC, fruto de uma bem-sucedida campanha organizada pelo governo brasileiro. Uma evolução para um País que, há pouco mais de duas décadas, tinha de explicar nas reuniões o nome da moeda da vez. Mas, até hoje, o espaço ocupado é tímido. “O Brasil evoluiu muito com a estabilidade, mas ainda ocupa um espaço aquém do potencial”, diz o consultor Welber Barral, sócio da Barral M Jorge. Situação que tende a melhorar à medida que as empresas brasileiras ocuparem um espaço maior no mercado internacional. O processo já começou, mas ainda está engatinhando.