Apesar do pênalti, digamos, controverso sofrido pelo atacante Fred na estreia do Brasil contra a Croácia na quinta-feira 12, os ingleses consideraram brilhante o desempenho de Neymar. Isso provocou uma reviravolta nas expectativas de quem será o artilheiro do torneio. Até a quarta-feira 11, o mais cotado para essa liderança era Lionel Messi, principal estrela do nosso arquirrival, o time da Argentina. Outra mudança nas previsões foi sobre as chances de o Brasil levantar a taça: eram de 3 para 1 na quarta-feira, mas, após a vitória, subiram de 2,2 para um. Premonição? Não, negócio. Mais especificamente, apostas.

Esses prognósticos eram os mais comuns da casa inglesa Ladbrokes na manhã da sexta-feira 13. Fundada em 1886 em Londres para agenciar palpites e prêmios em corridas de cavalos, ela é a maior rede de apostas, com cerca de 1.600 unidades espalhadas em todo o Reino Unido, 14 mil empregados e faturamento de 1,11 bilhão de libras esterlinas (R$ 3,38 bilhões) em 2013. Ela funciona como intermediária entre apostadores e calcula as probabilidades de vitória de cada uma das seleções na Copa do Mundo. Os apostadores, porém, podem ir muito além disso.

É possível arriscar algum dinheiro no número de gols de cada partida – o prognóstico mais frequente na quarta-feira, antes do jogo, era de uma vitória brasileira por 3 x 0 – e em quem será o melhor jogador do torneio, entre outros imponderáveis. Para apostar, o pretenso sortudo tem de abrir uma conta, declarar ser maior de 18 anos e ter um cartão de crédito internacional. A Ladbrokers é a face mais visível de um movimento pouco divulgado, mas fervilhante, de apostas nos resultados da Copa do Mundo.

No Brasil, como o jogo não é legalizado e as loterias são um monopólio do governo federal, que as opera por meio da Caixa, as apostas são mais discretas, embora bolões de todos os tamanhos estejam rolando em escritórios, condomínios e clubes. Com um pouco menos de ênfase, outra tradição do mercado financeiro foi retomada: as apostas entre operadores de ações, juros e câmbio sobre os resultados da Copa. Essa competição informal entre profissionais de mercado é antiga.

Nos últimos anos, os palpites não se limitaram aos resultados dos jogos de futebol dos campeonatos regionais e nacionais, mas também ao número de cartões amarelos e vermelhos e a algo menos previsível: o público pagante dos jogos – daí o apelido “PP” dado às apostas. Na estreia da Copa, compareceram 62.103 pessoas. Além da diversão do jogo e dos eventuais ganhos financeiros, as apostas servem para o operador exercitar um talento muito apreciado no mercado: a capacidade de antecipar números com base em estimativas, raciocínio lógico e um pouco do bom e velho palpite. “Alguém que apostasse em uma vitória brasileira de goleada sobre a Croácia mostraria que não entende de estatística”, diz um experiente profissional do mercado.

“Esse palpite mostra que o apostador não observou o histórico de jogos inaugurais do Brasil na Copa, marcados por placares pequenos, e desconsiderou o potencial defensivo das seleções do Leste Europeu, tradicionalmente retranqueiras.” Da mesma forma, para ser um bom apostador de “PP” em um clássico como Palmeiras e Corinthians, o operador tem de consultar as séries históricas de jogos entre os dois times, comparar os públicos de acordo com as campanhas de cada um deles e fazer seu palpite. O número mais próximo do resultado oficial ganha a bolada.

Mercado palpitante até há poucos anos – as tardes de sexta-feira, após o fechamento dos negócios, eram animadas por essas apostas –, o “PP” diminuiu de intensidade. “Nos anos 1990, as manhãs de segunda-feira viam um intenso movimento de mensageiros levando cheques de uma corretora para outra para pagar as apostas, mas isso acabou”, diz um experiente gestor de fundos e operador inveterado de “PP”. A principal razão foi a consolidação do mercado, com a redução do número de profissionais e o consequente aumento da carga de trabalho. “Agora muitas funções foram informatizadas, e computador não aposta”, diz ele.

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