20/02/2015 - 20:00
Ao comunicar o desligamento de uma fábrica de alumínio na Bahia, em 2010, depois de dois anos seguidos de prejuízo na região, a americana Novelis enfatizou a perda de competitividade da unidade, devido, principalmente, aos altos custos de seu principal insumo, a energia, no Brasil. Na época, a gigante global garantiu que a decisão não afetaria as operações de Ouro Preto, em Minas Gerais. Mas a promessa durou pouco. Em outubro de 2014, um novo comunicado da companhia anunciava o fim da produção mineira, repetindo a menção ao problema da competitividade usado quatro anos antes.
Decisões como as da Novelis, de cortar capacidade no Brasil, tornaram-se uma realidade comum a mais empresas do setor e vêm ganhando força nos últimos anos, em resposta à escalada dos custos de energia. No ano passado, contribuíram para uma redução de 26% na produção e levaram o País a registrar o primeiro déficit comercial do setor de alumínio em 11 anos. Um cenário que deve se agravar nos próximos meses com a possibilidade de um apagão. O custo da energia consumida na produção brasileira de alumínio avança a uma média de 11,4% ao ano, desde 2001.
Hoje, representa cerca de 55% do gasto total dos fabricantes, quase o dobro do registrado naquele ano. Nos mercados mais competitivos, chega a ficar próximo de 25% do total. Essa diferença coloca o Brasil na linha de frente dos desligamentos promovidos por companhias globais para enfrentar a estagnação nos preços e o excesso de capacidade criado com a expansão de unidades na China. “Em todo o mundo, estamos tomando medidas para reduzir capacidade de produção de unidades que não são competitivas e reposicionar nosso perfil de custos”, afirmou Bob Wilt, presidente da Divisão Global de Produtos Primários da Alcoa, ao anunciar um corte de 21% na capacidade produtiva do mundo – incluindo unidades no Brasil – no início do ano passado.
Cerca de 65% da energia consumida pelo setor é produzida em usinas próprias, a chamada autogeração, e há casos de empresas com excedente, que têm conseguido lucrar com sua venda. Isso, porém, não tem sido suficiente para impedir a sequência de aumentos de tarifa nos últimos anos. O setor estima uma realidade mais dura no longo prazo, caso essa situação persista. A previsão é de que o fechamento de fábricas prossiga, ao mesmo tempo que o consumo interno de alumínio deverá continuar crescendo.
Nesse cenário, o Brasil acumularia um déficit de 1,6 mil toneladas em produtos de alumínio em dez anos. A conta da Associação Brasileira de Alumínio (Abal) não inclui episódios de restrições no fornecimento energético, como os que rondam o País neste ano. Para o presidente da Abal, Milton Rego, medidas de racionalização serão inevitáveis e vão acelerar a queda tanto na produção como nos cortes de capacidade. “A pior realidade, nesse momento, é a possibilidade de um racionamento”, diz Rego. “Acho que é inevitável algum tipo de restrição.”
A entidade pretende apresentar ao ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga, uma proposta de redução incentivada, inspirada em modelos já existentes no mundo, como uma forma de evitar cortes compulsórios nas fábricas. Entre as alternativas apresentadas para o longo prazo estão uma melhora no fornecimento do gás natural e redução de tributos cobrados nas contas de energia, além de remodelação dos custos entre mercados cativo e livre. O déficit na balança comercial do alumínio e o fechamento de fábricas no Brasil revelam mais um capítulo do processo de desindustrialização apontado por especialistas nos últimos anos.
A participação da indústria no PIB caiu mais de seis pontos nos últimos dez anos. E o fenômeno vem se aprofundando por elos mais primários da cadeia – o alumínio é usado como insumo de embalagens de bebidas, autopeças e até de componentes usados em segmentos de alta tecnologia. “O Brasil tem um minério de excelente qualidade, uma matriz energética verde, tecnologia e capital investido. Vamos desperdiçar tudo isso?”, questiona Rego. “Será que o País vai conseguir ser competitivo no restante da cadeia, sem ter oferta competitiva de insumos?”