A francesa Bic, maior fabricante de canetas e isqueiros do mundo, produz no Brasil cerca de um milhão de esferográficas diariamente. O volume é suficiente para garantir, ao menos, duas canetas para cada cidadão brasileiro com idade o bastante para ser capaz de usá-las. Mesmo assim, não há quem já não tenha carregado no bolso, ainda que por distração, a Bic de um amigo ou de um estabelecimento comercial. É de se imaginar que, para a companhia, o número represente tranquilidade. Afinal, desde a sua fundação, em 1945, a companhia vem conseguindo manter-se folgadamente na dianteira do setor.

No entanto, a Bic quer ser mais do que um sinônimo de canetas e vem investindo, nos últimos anos, no desenvolvimento de uma série de produtos, que vão de barbeadores a colas instantâneas, passando por acendedores de churrasqueiras e cosméticos. Ao todo, a empresa, baseada em Clichy, nos arredores de Paris, vende mais de 400 produtos por aqui, divididos em três segmentos: papelaria, chama e barbeadores. Até o final do ano, esse número vai aumentar. “Estamos trazendo novidades, especialmente nas áreas de chama e barbeadores”, afirma o brasileiro Fernando Moller, presidente da subsidiária no País.

A estratégia de diversificação tem funcionado. No ano passado, a Bic faturou globalmente E 1,9 bilhão (o equivalente a R$ 5,7 bilhões), 13% dos quais no mercado local. Em dois anos, Moller espera ultrapassar a marca de R$ 1 bilhão de receita. O Brasil, atualmente, é o segundo maior mercado da Bic, atrás apenas dos Estados Unidos. Além das categoriais tradicionais, a Bic incomoda as rivais nas demais linhas de seu portfólio. “Somos um competidor chato”, afirma o executivo. “Se não estamos liderando um mercado, estamos na segunda posição ou prestes a ultrapassar a terceira.”

O principal alvo das atenções ultimamente é a produção de barbeadores. No ano passado, a companhia lançou sua primeira lâmina recarregável. Dessa forma, ela intensificou a disputa com a líder Gillete, marca que pertence à americana P&G. “Gastamos mais de 100 mil horas para desenvolver o produto”, afirma Moller. Apesar de já ter uma forte presença nesse mercado, com a produção de três bilhões de lâminas anualmente, a Bic concorria apenas com barbeadores descartáveis, de baixo valor.

O novo modelo possui quatro lâminas e fita lubrificante, aos moldes dos campeões de vendas da concorrente Gillete, como o Mach 3 e o Fusion. Para completar a oferta, a empresa francesa lançou também uma linha de cosméticos, que inclui creme de barbear e pós-barba. Esse é um mercado que vem apresentando uma taxa de crescimento acima da média. No ano passado, segundo a empresa de pesquisas Ibope, os brasileiros gastaram mais de R$ 55 bilhões com produtos de beleza e higiene. O montante foi 11% superior ao registrado em 2011.

“A aparência é prioridade na vida dos consumidores brasileiros”, afirma Sheila Salina, analista de estilo de vida da consultoria britânica Mintel. “Isso vai se refletir no setor de beleza e saúde, que deve movimentar mais de R$ 80 bilhões até 2018.” Nas áreas de papelaria e isqueiros a Bic também tem novidades. Recentemente, lançou uma cola instantânea para competir com a Super Bonder, da Henkel. No mercado de chama o alvo são os acendedores de lareiras e churrasqueiras.

Por trás dessa sede por diversificar o portfólio está o fato de os mercados de canetas e isqueiros, os maiores da empresa, não estarem apresentando boas perspectivas de crescimento. Segundo dados da Serasa Experian, o setor de papelaria cresce a uma taxa inferior a 3% ao ano. Já no caso dos isqueiros, o problema são as campanhas antitabagistas, que estão provocando uma queda no número de fumantes, principais consumidores do produto. A ideia da empresa é compensar a queda no volume vendido com produtos de maior valor agregado. Recém-engatinhando no Brasil, a diversificação galopa na Europa e nos Estados Unidos.

Nesses mercados, a Bic, inclusive, comercializa uma linha de pranchas de surfe, caiaques e outros equipamentos para esportes aquáticos. Trata-se de uma área criada por Marcel Bich, o fundador da companhia. Fanático por esportes na água, Bich, morto em 1985, cuidava pessoalmente dessa divisão. A empresa chegou a vender seus caiaques no País, mas sem muito sucesso – a operação foi encerrada em 2012. Mas não duvide se os esportes aquáticos voltarem. Afinal, a estratégia da Bic é fazer, como se diz popularmente, a barba, o cabelo e o bigode, dentro e fora d’água.