Mark Mobius não para. Aos 78 anos, a agenda do gestor de fundos de mercados emergentes da Franklin Templeton é mais volátil do que as cotações que acompanha diariamente. Em uma viagem, em outubro, ele passou por Dubai, China e Cingapura, visitando 12 empresas em três dias. O Brasil também está na programação. A vinda ao País está prevista para o início do ano que vem. Rodar o mundo para conhecer o dia a dia das companhias nas quais seus fundos investem é um dos segredos do sucesso de Mobius. No momento, ele não vê o Brasil com bons olhos.

“Não é um bom lugar para se investir no curto prazo, só vale a pena pensando em prazos mais longos”, diz ele, em entrevista exclusiva à DINHEIRO. A exceção, afirma, são os bancos, que ainda deverão proporcionar bons ganhos aos investidores. Mobius sabe do que está falando. Desde 1987, quando estruturou o fundo Franklin Templeton Emerging Markets a partir de um investimento de US$ 100 milhões, o nova-iorquino naturalizado alemão, formado em comunicação e com um Ph.D. em economia pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT), não tem endereço fixo.

Ele passa os dias voando no avião corporativo da Templeton, vivendo em hotéis, visitando companhias, conversando com executivos e investidores e, principalmente, observando e tirando suas conclusões. Atualmente, ele lidera mais de 50 pessoas que gerenciam diversos fundos voltados a mercados emergentes – termo que Mobius ajudou a divulgar ainda nos tempos de MIT – e responde pelo destino de US$ 48 bilhões em ativos, US$ 2,5 bilhões deles aplicados no Brasil. Nesses 27 anos, Mobius já viu de tudo e aperfeiçoou como poucos a arte de comprar ações na baixa e vender na alta.

Seus primeiros investimentos no Brasil foram realizados antes da abertura da economia e da estabilização, no início dos anos 1990. Eram tempos duros, em que, hospedado no Rio de Janeiro, ele tinha de negociar dólares com os cambistas na rua para poder pagar as refeições. Ele já esteve bem mais animado com o Brasil. O principal motivo para o pessimismo corrente é o resultado das urnas. Para Mobius, a reeleição de Dilma Rousseff significa “mais do mesmo” e o vento não deverá soprar a favor do País enquanto a política econômica não mudar.

“Existe o risco de o Brasil ter sua classificação de risco rebaixada pelas agências por não ter feito reformas importantes, e isso já está provocando uma deterioração no sentimento do mercado em relação ao País”, afirma. Isso derruba os preços, e o melhor exemplo é a Petrobras, cujas ações recuaram 12% na Bolsa no dia seguinte ao segundo turno da eleição. Mesmo assim, ele não cogita deixar de investir no País. Ao contrário, nesse cenário pessimista, o melhor a fazer é se preparar para comprar ações em grande quantidade. “As empresas estão ficando cada vez mais baratas por causa do ambiente político-econômico e acabam se tornando mais atrativas”, diz.

“Ainda não estamos comprando, mas vamos voltar a investir quando os preços estiverem lá embaixo.” Não, não adianta perguntar: o gestor não revela que preço é o “lá embaixo”. Saber quando a ação atingiu o fundo do poço é uma tarefa árdua, principalmente porque são esperadas novas turbulências até que a economia brasileira entre em uma nova rota. Como, então, escolher papéis promissores para colocar em carteira? No portfólio de Mobius, que acumula um retorno de 168% em dólares nos últimos dez anos, há ações muito conhecidas como Vale e Natura.

No entanto, nenhuma delas tem sido brilhante nos pregões em 2014. Enquanto os papéis da mineradora presidida por Murilo Ferreira recuaram 28% até a quarta-feira 5, os da Natura caíram 8,9%. Outro setor em que Mobius aposta é o de óleo e gás. Novamente, não se trata de uma escolha fácil num horizonte de curto prazo. Afinal, as ordinárias da petrolífera estatal caíram 7,7%, neste ano, o que acaba amplificando as baixas do índice Bovespa, que amarga uma queda de 5,2%. Nem todas as notícias são ruins, no entanto, enfatiza. Há ações que, independentemente do comportamento do Produto Interno Bruto (PIB) mais fraco, devem apresentar bons resultados.

É o caso dos papéis dos bancos, menina dos olhos de Mobius. Neste ano, os do Itaú Unibanco registram uma valorização de 27,3%, enquanto os do Banco do Brasil avançam 24% e os do Bradesco sobem 15,7%. “Apesar de haver uma expectativa de baixo crescimento, os bancos são uma boa forma de diversificar as aplicações”, afirma. O interesse se explica não apenas pelo cenário macroeconômico, mas também porque nos próximos anos eles vão precisar de reforço de capital devido às novas regras de Basileia. “As instituições financeiras devem acessar o mercado de capitais com mais frequência, gerando boas oportunidades”, diz ele.

“Também deveremos ter bons negócios nas ofertas iniciais de empresas de tecnologia – especialmente de internet –, do setor de consumo e da indústria farmacêutica.” Com tantas ofertas por vir, a escolha pelas ações não deve ser pautada apenas pela valorização dos papéis. Há que se levar em consideração a governança das empresas. É por isso que Mobius não recomenda a compra de papéis do grupo chinês de tecnologia Alibaba, que fez sua oferta pública inicial em setembro na Bolsa de Nova York e captou US$ 21,8 bilhões. “As ações subiram bastante logo após o lançamento, mas existem outros papéis que sobem tanto ou até mais que os do Alibaba, e cujas empresas não têm tantos problemas de governança”, diz.

Mais além do Brasil, Mobius enxerga a China como o mercado emergente que deve proporcionar o melhor retorno para os investidores, já que é o que mais cresce. “Mas também estou otimista com os mercados de fronteira, como Vietnã, Camboja e Nigéria, além de países do Oriente Médio, como a Arábia Saudita”, afirma. Para ele, são economias mais jovens, dinâmicas e baratas do que a dos maiores países da Ásia, oferecendo retornos mais polpudos para o capital. Essas economias entraram para a rota dos investidores, nos últimos anos, por causa da crise financeira nos Estados Unidos e na Europa.

Isso levou a captação dos fundos emergentes a aumentar trimestre a trimestre. No entanto, com os primeiros sinais de retomada americana, os saques superaram as entradas. “Neste ano, as captações estão voltando vagarosamente, mas estão voltando.” Mobius não espera um crescimento robusto dos Estados Unidos; porém, sabe que uma redução generalizada do PIB mundial pode ter impactos profundos nas economias emergentes – que devem crescer, na média, 5% neste ano. É exatamente isso que a Franklin Templeton tem feito. Neste ano, a gestora tem se voltado mais para a renda variável, que atualmente responde por 41% do total das alocações, em detrimento da renda fixa, que perdeu três pontos percentuais em relação a 2013.

O restante dos recursos está alocado em instrumentos híbridos e derivativos. Essa mudança na estratégia não ocorreu por acaso. Dois terços dos investimentos estão concentrados nos Estados Unidos, país que viu o seu principal índice, o S&P 500, bater recorde atrás de recorde, neste ano. Já a América Latina perdeu espaço e tem uma participação menor do que a do Canadá, que detém, sozinho, 4% das alocações. Na ponta do lápis, esse desempenho dos países emergentes se traduziu em uma redução no valor dos ativos da Templeton, em setembro.

O movimento de fortalecimento do dólar em relação a outras moedas, além da queda das ações, fez o portfólio total dos fundos da Templeton encolher 2,4% no trimestre, para US$ 898 bilhões. Em 12 meses, porém, o patrimônio total cresceu 6%. Uma das cabeças mais brilhantes do mercado financeiro internacional, Mobius se mantém fiel à filosofia de gestão que abraçou nos anos 1980, quando, ainda em seu tempo no MIT, conheceu John Templeton, um dos ícones do mercado acionário americano e, ao lado de Peter Lynch, o grande divulgador dos fundos de investimento.

Com uma abordagem muito semelhante à do megainvestidor Warren Buffett, Templeton procurava empresas capazes de gerar valor independentemente do cenário econômico, com baixo risco, pouco endividamento e gestão competente. Uma vez escolhidas as companhias, o segredo era comprar grandes lotes de ações a baixo preço e permanecer com elas por longos períodos, sem se preocupar com os vagares do mercado. O mandato de Mobius era reproduzir essa filosofia no ambiente menos estruturado e previsível dos mercados emergentes, mantendo os riscos sob controle. “O risco de se investir sempre vai existir, não importa onde você esteja”, diz ele. “Mas se consideramos o cenário, o mercado está menos perigoso nos últimos anos, porque as pessoas estão diversificando mais os seus investimentos, seja por países, seja por setores.”

Segundo ele, é comum confundir risco com volatilidade. “Risco é quando você perde dinheiro”, diz ele. “O segredo para reduzir os riscos é diversificar os ativos.” Mesmo com o cenário desfavorável nos mercados emergentes, Mobius não desiste. Seu objetivo é encontrar bom retorno para os clientes, o que justifica a agenda atribulada, repleta de viagens e reuniões. Estaria em seu radar aposentar-se ou procurar outros desafios, como os colegas Bill Gross e Mohamed El-Erian, da gestora concorrente Pimco? “Não tenho esses planos no momento”, diz ele, dando uma risada. “Espero que a companhia ainda me queira por lá por muito tempo.”