A Operação Lava Jato da Polícia Federal, que apura um esquema de corrupção estimado em R$ 10 bilhões na Petrobras, fez sua primeira vítima no alto escalão do conglomerado petrolífero. Na segunda-feira 3, Sergio Machado, presidente da subsidiária Transpetro, pediu afastamento temporário do cargo que ocupa desde 2003. Os ex-diretores da petroleira Paulo Roberto Costa e Renato de Souza Duque já haviam deixado os cargos quando apareceram na lista dos principais acusados do esquema que ficou conhecido na campanha eleitoral como “petrolão”, no qual propinas eram cobradas de empresas fornecedoras da Petrobras para financiar o repasse de recursos a políticos ligados ao PT, ao PMDB e ao PP, segundo depoimentos dos envolvidos presos pela PF, dentre eles o doleiro Alberto Youssef.

O nome de Machado apareceu em um dos depoimentos concedidos por Costa no processo de delação premiada. O ex-diretor de abastecimento indicou ter recebido R$ 500 mil do presidente da Transpetro, como parte do esquema de corrupção. Em outubro, Machado também foi alvo de denúncia do Ministério Público Federal por suspeita de irregularidades na licitação de embarcações usadas para o transporte de etanol. Os procuradores pediram seu afastamento da presidência e o bloqueio de bens. A Transpetro informou ao mercado que o período de licença do presidente tem duração de 31 dias, mas seu retorno é considerado improvável.

Machado estava no comando da subsidiária desde 2003, quando foi indicado pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, depois de perder uma disputa ao governo do Ceará. Administrador formado pela FGV, Machado havia sido deputado federal e senador pelo PSDB, antes de migrar para o partido de Renan Calheiros (PMDB-AL), seu padrinho político. Sob seu comando, a Transpetro cresceu – faturou R$ 7,7 bilhões em 2013 – e foi reconhecida pela qualidade na gestão. Em 2014, a empresa venceu pela quarta vez o prêmio de melhor do setor de transportes do anuário AS MELHORES DA DINHEIRO.

Em nota divulgada à imprensa, Sergio Machado classificou as acusações de Paulo Roberto Costa de “levianas, absurdas e caluniosas”, e diz ter decidido se afastar da presidência para evitar o atraso na divulgação dos dados do terceiro trimestre da Petrobras. “Estou certo do pleno rigor e lisura de minha gestão na Transpetro, e tranquilo quanto ao curso das investigações”, afirmou Machado. “Tenho interesse de que tudo seja averiguado rapidamente.” Em seu lugar assumiu o diretor de gás natural da subsidiária, Cláudio Ribeiro Teixeira Campos, funcionário da Petrobras há quase 30 anos.

O coro pela saída do executivo ganhou força com uma solicitação que teria sido feita pela empresa de auditoria PwC ao Conselho de Administração da Petrobras para que Machado se afastasse do cargo. Seria uma das condições impostas para a assinatura do balanço pela PwC – que não comentou o caso. A empresa também teria exigido a contratação de duas companhias independentes para colaborar com investigações internas. Dias antes da saída de Machado, a Petrobras já anunciara ao mercado que os grupos Trench, Rossi e Watanabe e Gibson, Dunn & Cructhcer, especializados em investigações corporativas, iriam ajudar “na apuração da extensão e no impacto das ações que porventura tenham sido cometidas no contexto das alegações feitas por Costa”, além de impactos materiais para a companhia.

Os questionamentos da PwC geraram um impasse na reunião do Conselho da Petrobras, no dia 31 de outubro. O encontro foi interrompido sem que houvesse decisão sobre um possível reajuste nos preços da gasolina e do diesel, tema que estava na pauta. A discussão foi retomada na terça-feira 4, mas o anúncio só ocorreria na noite da quinta-feira 6 (alta de 3% na gasolina e de 5% no diesel). O reajuste era considerado essencial para aliviar o caixa da petroleira, que nos últimos anos ficou pressionado pela defasagem do preço dos combustíveis cobrados no Brasil em relação ao barril do petróleo no mercado internacional. 

A deterioração dos resultados e o aumento da dívida levaram a agência de classificação de risco de crédito Moody’s a rebaixar a nota da Petrobras no mês passado. O endividamento da estatal ultrapassa os R$ 300 bilhões e deve sofrer a pressão adicional da alta do dólar. A participação da PwC acrescenta mais um protagonista nas apurações das denúncias do esquema de corrupção descoberto pela Operação Lava Jato. Além da Polícia Federal, o caso é investigado por uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) no Congresso, uma CPI no Senado e pelo Ministério Público Federal.

Como auditora do balanço, a PwC não tem obrigação de identificar as fraudes na empresa. Mas pode alegar desconforto e pedir para esperar o avanço dos trabalhos de investigação antes de assinar o balanço. Segundo o diretor técnico do Instituto dos Auditores Independentes do Brasil (Ibracon), Idésio Coelho, o especialista pode solicitar um pedido de investigação se identificar uma potencialidade de fraude e pode sugerir a contratação de empresas independentes que façam uma apuração à parte. “O auditor não tem poder de gestão, mas pode externar desconforto, emitir o parecer com ressalva ou romper o contrato”, diz Coelho.

Não é comum, porém, o pedido de afastamento de um executivo sob suspeita, que costuma ser feito pelos órgãos de governança da própria empresa. A saída de Machado coincide com outra baixa provocada pelas denúncias. O tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, comunicou ao Conselho de Administração de Itaipu, na última semana, que vai deixar a cadeira de conselheiro ocupada desde 2003. Em depoimentos à Polícia Federal, Youssef e Costa acusam Vaccari Neto de intermediar recursos desviados das obras para o partido. Segundo eles, uma comissão de até 3% teria sido cobrada nos contratos da estatal, sendo dois terços destinados à sigla. O petista nega as acusações.