O criador da psicanálise Sigmund Freud disse que o homem é dono do que cala e escravo do que fala. O presidente nacional do PT, Rui Falcão, não poderia estar mais atado a essas palavras. Em reunião fechada com a bancada petista na semana passada, ele recomendou que o governo corte as verbas de publicidade dos veículos de comunicação que supostamente apoiaram e convocaram as manifestações contra a presidente Dilma Rousseff, no dia 15 de março. Por governo, entenda-se o federal, os três estaduais e os 635 municipais que são comandados pela sigla.

“Não se enganem. O monopólio da mídia não será quebrado apenas nas redes sociais. Isso é uma ilusão”, disse Falcão. Ele defende que a quebra do “monopólio” – conceito econômico que prevê o domínio de um mercado por uma única empresa, o que não existe no Brasil – deve ser feita por meio de “uma nova política de anúncios para os veículos da grande mídia”. O advogado Falcão, que já trabalhou na imprensa, quer sufocar financeiramente as empresas de comunicação que exercem o dever de informar o público sobre o que acontece no País, para transformá-las em escravas do poder de plantão.

E quer despejar dinheiro público nas mídias que só falam bem do governo, na vã tentativa de controlar a opinião pública, como fazem os regimes ditatoriais. Censura pura. São propostas tão absurdas quanto o clamor de alguns manifestantes pela intervenção militar. A democracia, duramente conquistada no Brasil após a derrota política e econômica dos golpistas de 1964, é um bem inalienável e deve ser preservada a todo custo. As propostas antidemocráticas de “controle social da mídia”, que foram corretamente engavetadas pela presidente Dilma Rousseff, continuam nos corações e mentes dos dirigentes petistas, como provam as palavras de Falcão.

As empresas de mídia que cobriram as manifestações do povo contra o governo e a corrupção são as mesmas que noticiaram os protestos pró-Dilma e pró-Petrobras organizados pela Central Única dos Trabalhadores, ligada ao PT, no dia 13 de março. Rotular os veículos de comunicação como amigos ou golpistas a partir das reportagens factuais é um maniqueísmo intelectual pobre, que serve mais às estruturas corruptas do poder do que às pessoas de quem esse poder emana. O que está em risco, nessa tentativa tosca de controlar a imprensa através da publicidade oficial, é a própria liberdade de expressão, o bem maior da democracia.

Se hoje o governo e o PT atacam os veículos de comunicação independentes de Brasília, amanhã serão as empresas que têm contratos com estatais e anunciam na mídia e, depois de amanhã, os cidadãos que consomem a informação independente. Você será a próxima vítima. Não por acaso, no mesmo dia em que a pesquisa do Datafolha mostrou que 62% dos brasileiros reprovam o governo Dilma, o Palácio do Planalto permitiu o vazamento de um documento interno da Secretaria de Comunicação Social, comandada pelo ministro Thomas Traumann, com críticas à política oficial de comunicação.

As propostas vão de um maciço investimento em publicidade à convocação de militantes do PT para defender o governo. Se Falcão, como presidente do partido, pode dizer o que pensa, mesmo que seja uma afronta à liberdade de expressão, o conteúdo da Secom mostra que as verbas públicas do governo federal estão sendo direcionadas para a propaganda do PT e para uma tentativa de controle social. Em 2013, o investimento em propaganda do governo federal foi de R$ 2,3 bilhões. Nessa história, a democracia é quem corre perigo. As ditaduras latino-americanas, que se dizem democráticas, começaram a calar seus opositores pela asfixia econômica dos grandes grupos de mídia.

O então presidente bolivariano Hugo Chávez deu início a essa obsessão contra os críticos ao silenciar a RCTV, o canal mais crítico ao seu governo. A rede foi fechada e a oposição ficou sem voz. Seu sucessor, Nicolas Maduro, mantém essa política opressora. Na Argentina, a presidente Cristina Kirchner promulgou uma lei para enfraquecer seus principais opositores. Ela tinha como alvo o Grupo Clarín, um ferrenho crítico aos desmandos do governo kirchnerista.

“Temos de ter em mente que o Brasil tem uma história de controle da mídia estatal ou privada, assim como muitos países da América Latina, que basicamente leva a uma censura direta ou prévia, não permitindo que certos assuntos sejam publicados ou punindo (os veículos de comunicação) depois da publicação”, afirmou David Kaye, do Conselho de Direitos Humanos da ONU que monitora violações à liberdade de expressão em países ao redor do mundo, em entrevista à BBC Brasil. A escola de Joseph Goebbels, o mentor do controle da publicidade e dos meios de comunicação na Era Hitler, não pode prevalecer no Brasil.