09/08/2013 - 21:00
Em janeiro do ano passado, numa reunião com a presidenta Dilma Rousseff, o presidente do Banco Central (BC), Alexandre Tombini, afirmou: a inflação está convergindo para a meta, de 4,5%. Era uma afirmação forte, já que o IPCA do ano anterior havia ficado em 6,5%, encostando no teto da margem de variação e, por muito pouco, livrando Tombini do vexame de se explicar no Congresso. A certeza de que o custo de vida começaria a ceder era tanta que, nos meses seguintes, o BC continuou com a queda de juros que havia iniciado seis meses antes. Entre julho de 2011 e outubro do ano passado, a Selic caiu de 12,5% para 7,25%. A inflação não convergiu para a meta, e o IPCA de 2012 foi de 5,84%.
O enigmático: Tombini, reunido com empresários em Brasília, parece que sente
orgulho de não se fazer entender
Faz parte do trabalho do presidente do Banco Central ajustar – e, de certa forma, direcionar – as expectativas do mercado. Trabalho que Tombini tem tido dificuldade para executar. Se, no ano passado o presidente do BC comandou um movimento de queda de juros enquanto a inflação subia, neste ano ele fez diferente: começou a subir os juros em abril, quando já era certo, pelo movimento sazonal, que o índice começaria a ceder, com o recuo da “inflação do tomate”. “Há um erro de diagnóstico e um erro de prognóstico sobre a inflação”, diz o economista Amir Khair. “Ele não subiu os juros quando precisava e começou a subir quando já não precisava mais.”
Ler o cenário macroeconômico com atraso tem sido uma especialidade de Tombini – para azar dos brasileiros, justamente num momento em que a crise internacional exige análises e respostas mais sofisticadas da autoridade monetária. Outra é se comunicar de forma enigmática, como que para dificultar a compreensão sobre seus próximos movimentos. Em vez de calibrar as expectativas, ele acaba por desorientar o mercado. Um exemplo desse fraseado desconcertante foi praticado na semana passada. Em palestra no 13º Fórum dos Presidentes, em São Paulo, na terça-feira 6, Tombini disse que a condução adequada da política monetária “limitará a transmissão da desvalorização do câmbio para a inflação no horizonte relevante”.
O que é horizonte relevante ele não explicou. Inclui as eleições de 2014? Também não prometeu que evitará o repasse da valorização do dólar para a inflação. Disse apenas que “a condução adequada” teria esse efeito. Apesar do dano visível para a economia brasileira do câmbio sobrevalorizado, e dos mais de US$ 370 bilhões em reservas, o BC permitiu que o dólar chegasse a R$ 2,31, maior valor em três anos. A boa comunicação nunca foi o forte de Tombini, mas ele buscava compensar essa deficiência falando pouco. A discrição foi abandonada no dia 21 de julho, quando, numa entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, reeditou a divisão entre Ministério da Fazenda e Banco Central que vigorou no governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Num movimento típico de fogo amigo, Tombini disse que era preciso restaurar a confiança na economia. “É necessária uma reversão dessa confiança para a economia continuar no processo de recuperação gradual”, afirmou, colocando lenha numa fogueira que vinha sendo alimentada por empresários, economistas, investidores e operadores do mercado financeiro. A entrevista soou estranha na boca de um dos integrantes da equipe econômica, justamente num momento em que o ministro Guido Mantega era vítima de forte pressão do mercado. Como se a passividade da autoridade monetária diante da corrosão do poder de compra da moeda não contribuísse para a diminuição dessa confiança. “É o governo que define isso, não cabe ao Banco Central”, afirmou sobre a política fiscal, esquecendo-se de que é um dos 39 ministros.
Menos de uma semana depois, em entrevista à Folha de S. Paulo, a presidenta Dilma confirmou que o fogo amigo não era bem visto. “O Guido está onde sempre esteve, na Fazenda”, afirmou. Ao expor publicamente a divisão entre Fazenda e BC, Tombini deu margem a novas apostas danosas à economia. “A função do BC não é necessariamente influir na inflação atual, mas controlar as expectativas”, diz André Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos. “Ele declarou sua independência”, ironizou o ex-ministro da Fazenda Antonio Delfim Netto numa palestra na Amcham, no dia 30 de julho. Independência que pode ser perigosa, especialmente se o Senado aprovar um projeto, já pronto, concedendo a autonomia formal ao BC. Se o atual comportamento de Tombini já incomoda, como seria se ele tivesse estabilidade no emprego?