A um mês de transferir o controle do Grupo Pão de Açúcar ao seu sócio francês Casino, o empresário Abilio Diniz continua com sua agenda de palestras e cursos para mostrar a eficácia de sua gestão, sob a qual o grupo se tornou líder do varejo brasileiro. Só na semana passada foram dois eventos em São Paulo: um no centro educacional Casa do Saber, frequentado por ricos e famosos paulistanos, também conhecido como Daslusp, e outro na 28ª edição do Congresso e Feira de Negócios em Supermercados, realizado pela Associação Paulista de Supermercados (Apas). A movimentação não vai parar por aí e deve continuar mundo afora. No fim do mês, Diniz desembarca na Universidade de Bentley, em Washington, e em junho chega a Istambul, na Turquia, para o Fórum Mundial de Bens de Consumo.

 

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Diniz, na Apas: ”Todo mundo tem seu substituto, mas nem todos gostam

de pensar nessa ideia”

 

Na Casa do Saber, em que sua primogênita, Ana Maria, integra o conselho diretor, Diniz inaugurou o ciclo de encontros Grandes Empresários: Estilos de Gestão. Foi uma das poucas vezes em que o empresário, que preside o conselho de administração do grupo desde 2003, manifestou-se em público sobre os desentendimentos com o francês Jean-Charles Naouri, presidente do Casino, que se iniciaram há dez meses. Diniz, que tem o costume de rezar todas as noites, afirmou que tudo anda bem em sua vida e que, se tivesse um pedido que suas orações pudessem resolver, faria o seguinte: “Me ajuda a resolver o problema com o francês…” E a ajuda tem de vir rápido: segundo o acordo de acionistas firmado em 2005, no dia 22 de junho Naouri assumirá o controle do Pão de Açúcar. 

 

Perguntas que pediam mais detalhes sobre a tentativa frustrada de Diniz de fusão com a subsidiária brasileira do Carrefour, sem a notificação ao sócio, não foram respondidas. Já no encontro com profissionais do setor de supermercados na feira realizada pela Apas, Abilio subiu ao palco sob aplausos copiosos, como se fosse um popstar. Todos os convidados que tiveram a chance de fazer perguntas ao empresário diziam inicialmente: “Te admiro muito.” Na palestra de pouco mais de uma hora, Diniz baseou sua fala em supostos diferenciais abstratos do Pão de Açúcar, como coração e alma. A conversa, no entanto, evoluiu para assuntos mais concretos, como a gestão de uma grande rede e a necessidade de gerar valor aos acionistas. 

 

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De sócio a dono: Jean-Charles Naouri, do Casino, assumirá o controle

do Pão de Açúcar em junho.

 

O empresário também criticou seus concorrentes. “Os grandes competidores mundiais estão com dificuldades para reinventar sua identidade”, afirmou. “Este é o momento de os brasileiros ensinarem como se faz.” Para exemplificar, ele disse que modelos de megaloja, como as do Carrefour, não funcionam mais. Mesmo com toda a paixão pelo setor – que fez questão de frisar – Diniz falou das dificuldades do dia a dia. “Tenho grande orgulho de estar neste setor, mas em outra vida quero voltar numa área diferente”, disse. “É muito gratificante trabalhar com supermercados, mas já me meti em cada enrascada que só com fé em Deus para sair delas.” A lembrança da disputa com Naouri foi o único momento que o fez ficar mais sério. Novamente evitou responder perguntas sobre o assunto. “Isso foi no ano passado”, disse. “Sempre que comento alguma coisa vira uma confusão.” 

 

A diferença dessa apresentação para àquela da Casa do Saber foi exatamente o tom. Mais otimista, exibindo autoconfiança, nem parecia que Diniz está prestes a deixar o controle do grupo fundado por seu pai, Valentim, em 1948. Os novos capítulos dessa disputa começaram na semana passada, quando foi instalada uma arbitragem em São Paulo, a pedido do Casino, para avaliar supostas violações cometidas por Diniz, ao negociar com o arquirrival Carrefour uma fusão à revelia do sócio francês. Paralelamente às discussões na comissão de arbitragem, Diniz terá de mergulhar de cabeça na busca de uma saída para o conflito aberto no ano passado com o Casino. Entre as muitas alternativas apresentadas, duas têm mais chances de emplacar: a compra de sua participação pelos franceses ou a saída do grupo, com determinados ativos, como a Viavarejo. 

 

Tampouco está descartada, embora seja pouquíssimo provável, sua permanência pura e simples, nos moldes estabelecidos no acordo de acionistas, em 2005. Qualquer que seja a decisão, não será fácil de ser adotada por Diniz, um homem acostumado a dar a última palavra em todos os assuntos relevantes de um gigante que faturou R$ 52,6 bilhões em 2011 e que emprega 149 mil funcionários. Pelo acordo, Diniz seguiria como presidente do conselho de administração, podendo escolher o presidente com base numa lista tríplice enviada pelo Casino. Sua luta para manter o poder de decisão e continuar dando as cartas foi sintetizada na frase com que encerrou sua apresentação aos varejistas: “Todo mundo tem seu substituto, mas nem todos gostam disso.”

 

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