14/02/2014 - 21:00
A lista dos dez maiores empréstimos diretos do BNDES no ano passado sugere uma mudança de foco da instituição. Há apenas duas empresas privadas, a Supervia, que administra os trens urbanos no Rio de Janeiro, e a Santo Antônio Energia, que está construindo a usina hidrelétrica Santo Antônio, em Rondônia (veja quadro ao final da reportagem). Todos os demais foram para o setor público. Embora o volume de R$ 31,4 bilhões não seja tão expressivo quando comparado ao total de desembolsos do banco, de R$ 190 bilhões em 2013, os entes públicos estão ganhando espaço. Entre os Estados, Maranhão e Rio de Janeiro foram os que mais receberam recursos do banco de fomento, no ano passado.
Sede da Petrobras: empresa lidera o ranking dos maiores tomadores do BNDES
No caso do governo fluminense, o empréstimo de R$ 3 bilhões foi destinado à construção da Linha 4 do metrô, ligando a Barra da Tijuca (zona oeste) ao bairro de Ipanema (zona sul). “O governo faz economia de um lado, mas libera dinheiro para os Estados gastarem de outro”, diz Mansueto Almeida, especialista em contas públicas. Em nota, o BNDES afirma que as despesas para investimentos estimulam a atividade econômica gerando empregos, renda e tributos, dentro de um caráter anticíclico de incentivar as obras nos Estados. “Falar exclusivamente sobre a redução do superávit primário é demonstrar pouca compreensão do impacto desses investimentos”, diz o banco.
E nega que tenha modificado sua política em relação aos recursos concedidos a entes públicos. “Não é possível dizer que tenha havido uma mudança na política do BNDES que esteja privilegiando os empréstimos ao setor público”, afirma. O que houve, na explicação do BNDES, foi a ampliação do espaço fiscal dos Estados e municípios, que nos últimos anos haviam reduzido seu endividamento. Além disso, alguns Estados, como Espírito Santo, Santa Catarina e Goiás, também se enquadraram numa linha de crédito de R$ 7,5 bilhões para compensar a perda de arrecadação com o fim da chamada guerra dos portos, que permitia aos governadores desonerar as mercadorias desembarcadas nesses locais.
Mansueto Almeida, economista: “O governo economiza
de um lado, mas libera dinheiro de outro”
A transferência dos recursos da União para os Estados, embora aumente os gastos públicos, permite a realização de obras. “Esses empréstimos tiveram como contrapartida um aumento significativo dos investimentos estaduais”, afirma Braúlio Borges, economista-chefe da LCA Consultores. Junto com os governos estaduais, as empresas estatais lideram a lista dos grandes empréstimos e, no topo, a maior delas, a Petrobras. No ano passado, a petroleira recebeu R$ 9,9 bilhões para construir quatro plataformas do pré-sal. Dados reunidos por Mansueto Almeida mostram que a dívida da Petrobras com o BNDES aumentou quase quatro vezes nos últimos seis anos: de R$ 10,7 bilhões em 2008 para R$ 40 bilhões no ano passado.
“Uma parte disso é investimento, mas outra parte é para cobrir o prejuízo com a falta de reajuste do combustível”, diz Almeida. Procurada, a Petrobras não quis comentar. Para dar vazão a esse crescimento, o Conselho Monetário Nacional (CMN) eliminou, em maio de 2012, os limites que o BNDES teria para emprestar a Petrobras, Eletrobras e Vale com base na sua “importância estratégica”. Até então, o BNDES não poderia deter mais de 25% do seu patrimônio líquido em dívidas ou ações dessas companhias. Com a mudança, as participações e empréstimos na Petrobras chegaram a R$ 81 bilhões em setembro de 2013, o equivalente a 80% do patrimônio de referência do banco.
A principal consequência do crescimento das operações do BNDES é o aumento da dívida bruta no País. Como o banco empresta um volume superior aos recursos que tem disponíveis, acaba sendo capitalizado pelo Tesouro Nacional. Desde 2008, os aportes do Tesouro somaram R$ 413 bilhões. A operação gera prejuízo ao erário, pois o Tesouro capta por um custo maior do que os juros cobrados pelo BNDES. Em 2012, de acordo com o Ministério da Fazenda, esses empréstimos subsidiados custaram R$ 12,7 bilhões. Para Almeida, esses gastos estão subestimados e, pelos seus cálculos, chegaram a R$ 28,3 bilhões no ano passado, valor superior aos gastos com o programa Bolsa Família.