23/03/2013 - 21:00
O Brasil colheu uma safra de grãos recorde no ano passado, de 166 milhões de toneladas, que será novamente superada neste ano. A notícia parece excelente, já que isso significa mais renda para o produtor rural e mais divisas para a balança comercial brasileira. Mas como o diabo está nos detalhes, não é bem isso o que está acontecendo. O detalhe, no caso, é a falta de infraestrutura logística para levar os grãos até o porto de Santos, de onde serão embarcados para o Exterior. Na semana passada, o congestionamento de caminhões ao longo da rodovia Cônego Domênico Rangoni, no litoral paulista, chegou a 27 quilômetros. Alguns motoristas levaram até 12 horas para percorrer uma distância de 20 quilômetros.
Xeque-mate no caos aéreo: Moreira Franco assume a Secretaria da Aviação Civil, de onde terá
de colocar à prova seu poder de articulação para desfazer os nós do setor
A China, o maior cliente da soja brasileira, que comprou US$ 12 bilhões no ano passado, chegou a cancelar encomendas de dois milhões de toneladas, por causa da crônica demora nos embarques. Esse cenário caótico, paradoxalmente, é um efeito colateral da abundância. Mesmo com o crescimento de apenas 0,9% no PIB no ano passado, o País vive um momento vigoroso. O desemprego continua caindo, a renda sobe e a ascensão social de milhões de brasileiros fez com que mais consumidores comprassem automóveis e viajassem de avião. Mas a combinação entre crescimento e falta de planejamento resultou em aeroportos e estradas lotadas, dificuldade das empresas em contratar funcionários qualificados, entre outras mazelas.
Mensageiro das boas notícias: o novo ministro do Trabalho, Manoel Dias,
deve anunciar a criação de dois milhões de vagas, mas terá de administrar
os efeitos do pleno emprego
São essas dificuldades que terão de ser administradas pelos novos ministros que assumiram o posto na semana passada em Brasília. “A partir de hoje, todos vocês se tornam responsáveis por setores de relevância estratégica para o meu governo”, disse a presidenta Dilma Rousseff no dia 16, na cerimônia de posse dos ministros da Agricultura, Antônio Andrade, do Trabalho, Manoel Dias, e da Secretaria de Aviação Civil (SAC), Wellington Moreira Franco, deslocado da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE). Os três assumem os cargos na esteira de uma minirreforma ministerial, destinada a acomodar os partidos aliados que se sentiam desfavorecidos.
Abundância agrícola: o novo ministro da Agricultura, Antônio Andrade, terá
de pressionar o governo para desfazer os gargalos logísticos
que inibem os ganhos da superssafra
“Temos de fortalecer, nessa diversidade, a sustentação de um governo de coalizão”, afirmou a presidenta. Com as mudanças, Dilma pode melhorar sua base política para as votações no Congresso, neste ano, e para a campanha eleitoral, em 2014. Mas será que os novos peões da Esplanada serão capazes de tirar do papel projetos relevantes para as respectivas áreas? Grande parte do sucesso de suas pastas depende de outras peças mais fortes no xadrez político de Dilma. É o caso do ministro Guido Mantega, da Fazenda, responsável pelas medidas que geram crescimento do consumo, e da ministra Miriam Belchior, do Planejamento, que coordena as obras do PAC.
Os novos titulares da Esplanada vão colocar à prova seu poder de articulação com os colegas mais antigos.Deputado federal e presidente do PMDB mineiro, o novo ministro da Agricultura, Antônio Andrade, substitui um amigo da presidenta, o também deputado federal e correligionário, o gaúcho Mendes Ribeiro. A troca atende a interesses eleitorais, pois a presidenta precisa se fortalecer no Estado do senador Aécio Neves (PSDB-MG), virtual candidato à Presidência. Além de mineiro, Andrade tem a vantagem de entender de agricultura. “Não apenas ele é um ótimo produtor, é um excelente executivo”, diz o consultor Alysson Paulinelli, que foi ministro da Agricultura nos anos 1970.
Fila da ineficiência: caminhões na rodovia Cônego Rangoni, no último
dia 20, é o retrato das dores do crescimento da economia brasileira
Fora os entraves para que as mercadorias cheguem aos portos, o novo ministro terá que resolver a falta de armazéns para estoques e administrar um plano de safra, que terá um volume de recursos recorde, mas ainda não consegue oferecer seguro agrícola à maior parte dos produtores. Andrade assumiu prometendo mais atenção ao uso de novas tecnologias na produção agropecuária. “Também precisamos melhorar a competitividade na fase de comercialização”, disse, numa referência aos atuais problemas de logística. Já o novo ministro da Secretaria de Aviação Civil (SAC), Wellington Moreira Franco, também tem que administrar o efeito colateral do crescimento de 130% no número de passageiros nos aeroportos, entre 2005 e 2012.
“Vamos correr para responder ao tamanho da demanda e melhorar a qualidade do serviço”, disse à DINHEIRO Moreira Franco. “Temos de melhorar o serviço urgentemente.” Depois das concessões nos aeroportos de Guarulhos, na Grande São Paulo, Viracopos, em Campinas, e Brasília, no ano passado, ele prepara os editais para as licitações do Galeão, no Rio de Janeiro, e de Confins, em Belo Horizonte, em setembro. Muito próximo do vice-presidente Michel Temer, Moreira Franco, do PMDB carioca, terá de usar seu prestígio para responder aos desafios da aviação. “Espero que o Moreira não pense que era feliz e não sabia”, brincou Dilma.
Parada infernal: falta de infraestrutura aeroportuária mantém saguões lotados nos terminais
Na avaliação do empresário Jorge Gerdau, presidente do Conselho de Administração do Grupo Gerdau e presidente da Câmara de Políticas de Gestão, Desempenho e Competitividade, os gargalos de infraestrutura enfrentados pelo Brasil também têm seu ponto positivo. “Há problemas bons e há os ruins”, diz ele. “Este é um problema bom. É um desafio que traz muitas oportunidades de investimento.” No Ministério do Trabalho, a nomeação de Manoel Dias marca a volta ao governo do grupo liderado por Carlos Lupi, presidente do PDT, defenestrado na faxina promovida no ministério pela presidenta, em 2011. Com apenas R$ 89 milhões para investimento, o novo ministro terá que reconquistar o apoio dos empresários, afastados do Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (Codefat) numa manobra do ex-ministro Lupi, que manteve apenas o assento das entidades sindicais.
“O ministério precisa se reaproximar do empresariado”, diz o deputado federal Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), presidente da Força Sindical. “Sem essa parceria, pode haver boicote da iniciativa privada ao Ministério.” Nos últimos anos, tem cabido ao titular da pasta do Trabalho o papel de mensageiro das boas notícias – a taxa de desemprego em janeiro ficou em 5,4%, e 1,1 milhão de vagas foram criadas nos últimos 12 meses. “Esperamos superar os dois milhões de postos de trabalho neste ano”, disse Dias, ao assumir o cargo, no dia 16 passado. Mais do que anunciar a criação de mais empregos, espera-se que ele, assim como os outros dois novos ministros nomeados pela presidenta Dilma, traga soluções para os gargalos que anulam os efeitos positivos do crescimento da economia.