26/12/2012 - 21:00
O horizonte da economia brasileira ficou carregado em 2012. Além de se proteger da crise global, o País teve de enfrentar chuvas e trovoadas inesperadas. Saiba aqui e nas matérias linkadas ao final desta reportagem o que empresários, executivos, economistas e autoridades aprenderam no ano em que o mundo não acabou.
O Brasil chegou ao fim de 2012 com um sentimento de decepção, depois das expectativas frustradas com o PIB fraco do terceiro trimestre. No dia 6 de janeiro deste ano, as projeções de cerca de 100 instituições financeiras e consultorias ouvidas pelo Banco Central, compiladas no boletim Focus, indicavam um crescimento de quase 3% da economia brasileira, em média. No fim de dezembro, essas mesmas instituições reduziram as estimativas para 1%, em média. A grave crise europeia, a lenta recuperação da economia dos Estados Unidos e a desaceleração da China foram decisivas para segurar o crescimento no Brasil. Mas não foram os únicos obstáculos: 2012 trouxe, também, fatores imponderáveis, que impediram que se alcançasse um PIB mais robusto.
Na definição do diretor de pesquisas e estudos econômicos do Bradesco, Octavio de Barros, o Brasil viveu uma “tempestade perfeita”. “Tudo que poderia dar errado em 2012 deu errado mesmo”, diz ele. Barros listou oito fenômenos econômicos que abalaram o clima no ano passado, das barreiras argentinas à estiagem no campo. “O PIB pode ter perdido entre 0,8 e um ponto percentual por problemas atípicos”, calcula. Os oito elementos que ajudaram a formar a tempestade perfeita em 2012, e obrigaram o governo Dilma a lançar mão de pacotes de estímulos e ajustes de rota na economia, são listados nas páginas seguintes. E como reagiram os homens e mulheres de negócios nesse ambiente conturbado?
Nesta retrospectiva especial, DINHEIRO foi atrás das lições mais importantes de empresários, economistas, autoridades e líderes setoriais sobre o ano que passou. Mais de 100 entrevistados falaram com nossos jornalistas. A maior parte dos depoimentos pode ser conferida na versão impressa e a lista completa está disponível nas versões digitais (web, tablet e celular). Escolhemos, ainda, cinco histórias emblemáticas para discutir com profundidade: a disputa societária no Pão de Açúcar; a queda das ações do Grupo EBX, de Eike Batista; a redução dos juros no Banco do Brasil e na Caixa; a virada na estratégia da GM; e a gestão de egos na seleção feminina de vôlei (que trouxe o ouro de Londres), pelo técnico José Roberto Guimarães.
…passou. E agora?
Quais foram os oito fatos imponderáveis da tempestade perfeita que afetaram a economia brasileira em 2012? Leia, a seguir, a lista elaborada pelo economista Octavio de Barros, o comentário de especialistas em cada área e as previsões para 2013.
A Estiagem
Os produtores de grãos do Sul do País amargaram uma quebra de safra por causa da seca na região, no começo do ano. Apenas no Rio Grande do Sul, a produção de milho caiu 16% e a de soja, 35%. Ao divulgar o desempenho da economia no primeiro trimestre, o IBGE destacou a queda de 8,5% do PIB agrícola. No ano que vem, a perspectiva é de uma safra maior, sem surpresas climáticas e com preços favoráveis, segundo a consultoria Safras&Mercado.
“Os preços permanecem elevados. Quem perdeu dinheiro na seca, em 2012, poderá lucrar no ano que vem”
Gil Carlos Barabach, economista da consultoria Safras&Mercado
Crise no DNIT
Os escândalos no Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) em meados de 2011, que derrubaram o então ministro Alfredo Nascimento, paralisaram centenas de obras pelo País. Os impactos foram sentidos com mais força no primeiro semestre de 2012, comprometendo a execução do PAC. O último balanço, em novembro, mostra que apenas 41,9% do orçamento previsto em 2012 tinha sido executado. A expectativa, segundo a Fiesp, é de que esse percentual melhore no ano que vem, atraindo investimentos privados.
“Há uma incapacidade do governo de promover os investimentos. É culpa também do TCU, do Ibama e de todos os órgãos que atrasam as obras”
Paulo Francini, diretor do departamento de economia da Fiesp
O imbróglio da troca de motores para caminhões
O setor teve um ano totalmente atípico. A troca do motor Euro 3 pelo Euro 5, na virada do ano, gerou uma antecipação de produção no fim de 2011. Com estoques elevados, as montadoras passaram os primeiros meses paradas, e vão encerrar o ano com queda de 40%. A desaceleração econômica também não ajudou as vendas, que caíram 20%. Para 2013, a MB Associados projeta expansão de 15% nas vendas de caminhões, incentivadas pelos juros negativos oferecidos pelo BNDES, pelo IPI zero e pela perspectiva de uma safra agrícola favorável.
“A troca para o Euro 5 e a desaceleração econômica travaram o setor de caminhões”
Tereza Fernandez, diretora da MB Associados
Perda de ímpeto da construção civil
Não foi um ano brilhante para a construção civil brasileira. A alta de 3,8%, inferior à registrada nos últimos anos, foi motivada por diversos fatores: o excesso de oferta de imóveis residenciais em algumas regiões, a falta de aprovação de projetos imobiliários em São Paulo e a lentidão das obras de infraestrutura. Para 2013, no entanto, o Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo (Sinduscon-SP) projeta um cenário de crescimento um pouco maior, de 4,5%, com a retomada dos lançamentos.
“São Paulo, que representa quase 20% do mercado imobiliário nacional, ficou sem aprovação de novos projetos até setembro”
Eduardo Zaidan, vice-presidente do Sinduscon
Crise do setor sucroalcooleiro
A safra 2011/2012 de cana-de-açúcar foi decepcionante, com queda de 11,5%. Endividados desde o estouro da crise internacional de 2008, os usineiros precisaram cortar investimentos nos canaviais. Para piorar, o clima não ajudou e o novo sistema de mecanização no campo ainda não gerou os frutos esperados. A safra 2012/2013, no entanto, já aponta uma recuperação de 7,9%, segundo a União da Indústria de Cana-de-Açúcar(Unica), com condições climáticas mais favoráveis, o que deve beneficiar o PIB agrícola.
“Endividamento elevado, falta de investimento e clima desfavorável atrapalharam o setor sucroalcooleiro”
Antonio de Padua Rodrigues, diretor-técnico da União da Indústria de cana de açúcar
Problemas na Petrobras
Liderados pela Petrobras, a produção e o refino de petróleo estagnaram em 2012. A estatal está perdendo capacidade de investimento por causa da política de congelamento do preço dos combustíveis estabelecida pelo governo federal. Além disso, paradas técnicas não programadas e atrasos de fornecedores nacionais e estrangeiros estão comprometendo o desempenho da Petrobras. A boa notícia é a realização de leilões de blocos de exploração de petróleo em 2013, algo que não acontecia há quatro anos.
“Ao subsidiar os combustíveis, a Petrobras está perdendo capacidade de investir”
David Zylbersztajn, ex-diretor da Agência Nacional do Petróleo (ANP)
Protecionismo argentino
A política populista da presidenta Cristina Kirchner e de seu polêmico secretário de Comércio Interior, Guillermo Moreno, para segurar dólares no país afetou diretamente as exportações brasileiras. Para cada dólar importado, o governo de Cristina exigia uma contrapartida em exportação. Para controlar essa equação, Moreno criou um filtro burocrático. Dessa forma, a Argentina, que é o nosso principal mercado de manufaturados, estabeleceu diversas barreiras à entrada das mercadorias. O superávit brasileiro de US$ 5,8 bilhões em 2011 está caindo para menos de US$ 2 bilhões neste ano, e pode virar um déficit em 2013, segundo a Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB).
“As decisões do Moreno não são profissionais, são pessoais. É ele quem decide qual empresa vai importar do Brasil”
José Augusto de Castro, presidente da AEB
Bancos pequenos e médios na berlinda
O ano não foi nada fácil para as pequenas e médias instituições bancárias. Os bancos BVA, Prosper e Cruzeiro do Sul engrossaram a lista das instituições que precisaram da ingerência do Banco Central (BC). Prosper e Cruzeiro do Sul foram liquidados. O BVA continua sob intervenção do BC. Os bancos médios compõem um segmento importante que concede crédito a pessoas físicas e jurídicas, que normalmente não têm linha disponível nos grandes bancos, mesmo que para isso tenham de pagar uma taxa maior pelos serviços. Embora o BC tenha aumentado a fiscalização, é impossível prever, segundo os especialistas, se outros bancos de pequeno porte terão problemas em 2013.
“Os bancos pequenos e médios sofrem com a falta de escala e o descontrole dos seus custos”
Alberto Borges Matias, professor titular em finanças da Faculdade de Economia, administração e contabilidade da USP, em Ribeirão Preto
O que aprendi sobre globalização e competitividade
Menor dependência das commodities
“A economia mundial conseguiu sobreviver a inúmeros riscos preocupantes, e ainda com os EUA e a China dando sinais de ajustes positivos. Para o Brasil, a lição é que o País não pode depender da alta dos preços das commodities para garantir crescimento”
Jim O’Neill, presidente do banco Goldman Sachs Asset Management e criador da expressão Bric
Foco na produtividade
“Os bons resultados obtidos no nível de emprego e renda dos trabalhadores podem e devem ser complementados por uma agenda focada no aumento da produtividade. Isso exige mais treinamento, técnicas eficientes de gestão e mais automação em vários setores”
Luciano Coutinho, presidente do BNDES
Planejar para competir
“Criamos a EPL para planejar e empreender ações estruturadas que vão permitir a modernização e integração do sistema de transportes no País. Este é o caminho para promover o uso racional da infraestrutura e reduzir o custo logístico, garantindo a competitividade do setor produtivo”
Bernardo Figueiredo, presidente da Empresa de Planejamento e Logística (EPL)
Menos burocracia, mais investimentos
“O Brasil precisa investir mais em logística e tornar cada vez mais competitivas suas malhas de transporte. A burocracia tem de ser reduzida para destravar os investimentos”
Rodrigo Vilaça, presidente da Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários
Sem desequilíbrios
“Mesmo com a retração do comércio internacional e a volatilidade financeira do mundo, não tivemos grandes desequilíbrios. Fizemos uma grande reforma estrutural, que foi a das políticas monetária, fiscal e de câmbio. O Brasil sairá disso mais competitivo, com menos custos e estimulando mais a economia”
Guido Mantega, ministro da Fazenda
Energia é competitividade
“Aprendemos que a energia é um fator de competitividade, e não um instrumento de arrecadação e de condução de políticas públicas, o que a tornou uma das mais caras do mundo. Agora, passou a ser vista de uma maneira diferente e começamos a reverter um processo que impediu o crescimento do País”
Paulo Pedrosa, presidente da Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace)
Pensar global é o canal
“Reforçamos a conclusão de que as empresas, as pessoas e o País têm que, cada vez mais, se tornar globais. A experiência com a United Health mostra que, hoje, nós não somos mais uma ilha, somos um ponto no universo. Pensar global é o caminho para as empresas se manterem competitivas”
Edson de Godoy Bueno, presidente da Amil
Rasgar camisas de força
“Obtido o investment grade, é hora de o Brasil construir o “business grade”. Rasgar camisas de força microeconômicas, despertar do pesadelo tributário e burocrático. Sem um modelo de mais poupança e investimento, 2012 terá inaugurado uma década fadada ao subdesempenho”
Marcos Troyjo, diretor do BRICLab da Universidade Columbia e professor do Ibmec
Ninguém é uma ilha
“Os países têm uma grande interdependência, de tal sorte que suas economias internas não respondem apenas a fatores domésticos. Ainda que se tenha observado expansão do consumo, o Brasil sofre influência importante das outras nações, que interferem no cumprimento das suas metas de crescimento”
Ricardo Espírito Santo, presidente do Banco Espírito Santo
A virtude da obstinação
“O governo federal atuou em várias frentes de estímulo à economia. A despeito delas, não teremos em 2012 o crescimento do PIB que pretendíamos. Mas há que se ter paciência. O caminho que nos levará ao desenvolvimento sustentável tem de ser percorrido de forma obstinada e constante”
Fernando Pimentel, ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior
Competitividade é o nome do jogo
“Este ano mostra que o mundo vai ficar cada dia mais competitivo. E cada dia está mais evidente que o nosso mundo tecnológico, de interação, se resume à competitividade. Caso contrário, o País não cresce”
Carlos Thadeu de Freitas, economista da Confederação Nacional do Comércio, e ex-diretor do Banco Central
Ampliar a infraestrutura
“Temos que contribuir para que o País supere seus principais desafios, como a ampliação da infraestrutura e a melhoria da educação. Estes avanços, aliados à evolução das leis trabalhistas, elevarão a produtividade e a competitividade da economia”
Marcelo Odebrecht, presidente do Grupo Odebrecht
Aposta na inovação
“Para se destacar em um cenário de pouca margem, acreditamos que as empresas terão que se reinventar e apostar na inovação”
Marco Stefanini, sócio da Stefanini
Mais velocidade de decisões
“Com tantas mudanças tecnológicas, está claro que nós temos que ser velozes na implantação de novos produtos e buscar redução de custos. O Brasil precisa ser mais competitivo e ganhar produtividade na indústria”
Rogério Nunes, presidente da Smart Modular Technologies
Dificuldades são transitórias
“Os empresários não se sentiram suficientemente confiantes para aumentar o investimento. Mas também não se sentiram tão desalentados a ponto de demitir equipes. Crescemos pouco, mas o desemprego não subiu. é a percepção do setor privado de que as dificuldades podem ser transitórias”
Fernando Sampaio, sócio-diretor da LCA Consultores
Só educação de qualidade salva
“Em 2012, aumentou a minha convicção de que só uma educação universal de qualidade, em todos os níveis, fará o Brasil ascender à condição de uma nação desenvolvida”
Aloizio Mercadante, ministro da Educação
Estratégia para alimentos tem de ser global
“Aprendi que precisamos de um projeto estratégico global para o aumento da produção agrícola, tendo em vista a segurança alimentar de cada país. O Brasil é capaz de liderar esse projeto, desde que tenha apoio das demais nações”
Roberto Rodrigues, ex-ministro da Agricultura e coordenador do centro de agronegócio da FGV