29/11/2013 - 21:00
Minutos antes de Jorge Paulo Lemann, o mais bem-sucedido empresário brasileiro das últimas décadas e dono da maior fortuna do País, entrar ao vivo, o clima era de ansiedade. Algumas das 998 pessoas inscritas para ouvir o empreendedor falar pela internet mandavam perguntas, por meio do chat, e utilizavam os epítetos de “mito” e “lenda” para se referir a ele. Na terça-feira 26, Lemann, 74 anos, reservou um pouco do valioso espaço em sua agenda para responder a perguntas sobre carreira, em um bate-papo veiculado pelo site da Fundação Estudar, da qual é um dos fundadores. Segundo o ranking da Bloomberg, ele é o 28o homem mais rico do mundo, com uma fortuna de US$ 22 bilhões.
Movido a desafios: “O maior risco é não tomar nenhum risco, porque senão você faz nada”
Criador do banco Garantia e atualmente à frente do fundo 3G Capital, Lemann dita os destinos de alguns ícones do capitalismo global. Controla a rede de fast-food Burger King, além de ser um dos principais acionistas da cervejaria AB Inbev e da fabricante de catchup Heinz. Essa posição foi conquistada com muita força de vontade, inteligência, ambição e coragem. “O maior risco é não tomar nenhum risco, porque senão você faz nada”, afirmou. Quem participou da apresentação pôde se deliciar com algumas das histórias de Lemann, que repassou, durante uma hora, os momentos mais marcantes de sua trajetória empresarial, permeando a conversa com observações astutas e simples.
“Jogando tênis aprendi que se perde de vez em quando e que é preciso usar a derrota para analisar o que se pode fazer melhor e aprender como ganhar da próxima vez”, disse o empresário, que, na juventude, tirou um ano de sua vida para se dedicar exclusivamente ao esporte, enquanto morava na Suíça, deixando para trás o emprego no Credit Suisse. A lição acabou lhe servindo na volta ao Brasil. Em vez de ir trabalhar em um grande banco, ele escolheu se associar a outros banqueiros de investimentos, um pouco mais velhos que ele, na corretora de valores Invesco. A instituição, no entanto, faliu depois de quatro anos.
O aprendiz: Marcel Telles entrou no Garantia em 1972 como trainee
e se tornou sócio do banco, além de ter presidido a Brahma
“O fracasso dessa empresa foi um choque e me traumatizou”, disse. “Eu achava que era o bom, formado em Harvard, mas aos 26 anos estava sem dinheiro e tinha participado de um fracasso. Pensando bem, isso foi bom, porque a experiência me ensinou muita coisa.” Lemann também contou sobre a influência de sua mãe no seu estilo agressivo. “O meu pai faleceu quando eu tinha 13 anos e a minha mãe foi uma presença constante”, afirmou. “Ela era a personalidade forte da família, era muito ambiciosa e queria que eu fosse alguém.”Um dos grandes trunfos do empresário foi saber absorver e combinar influências diversas.
Tomou pessoalmente lições com lendas dos negócios, como Sam Walton, fundador do Walmart, e Konosuke Matsushita, criador da Panasonic. “No Garantia e no 3G, nunca nos consideramos gênios. Fomos observando coisas em outras empresas e misturamos tudo”, disse Lemann, para comentar como desenvolveu, ao lado de seus principais sócios, Marcel Telles e Beto Sicupira, a cultura de gestão das empresas que administra. “Fomos adotando as melhores práticas e chegamos à nossa cultura de meritocracia, de avaliações constantes e de corte de custos.” Um dos eixos dessa filosofia consiste em atrair os melhores talentos, e Lemann sabe bem o que procurar em um profissional.
O parceiro: amigo de Lemann desde a mocidade, Beto Sicupira
foi convencido a trabalhar no Garantia em vez de se mudar para o Exterior
“Gosto de quem quer ser bem-sucedido, de pessoas que andam sozinhas e que podem até acabar criando problemas, mas que, no fim, atingem os resultados”, afirmou. “Não gosto do soldado disciplinado.” Para estimular o desenvolvimento de mais pessoas como essas, o bilionário atualmente tem se dedicado a diversas iniciativas educacionais. Ele criou, junto com a Universidade de Stanford, na Califórnia, um centro para empreendedorismo e inovação em educação. Outra contribuição da Fundação Lemann foi o patrocínio da tradução dos vídeos da Khan Academy, organização sem fins lucrativos criada pelo inovador educador americano Salman Khan, focado em matemática e ciências.
Esse material está sendo levado para 12 mil alunos de 400 escolas públicas brasileiras. A parceria com a Khan abrangerá até a criação, no próximo ano, de programas de alfabetização para crianças com até 5 anos de idade. Há duas semanas, também foi fechado um acordo com o YouTube, site de vídeos do Google, para o lançamento de uma plataforma de filmes da Fundação Lemann com conteúdo de matemática e biologia, que permitirá a professores de todo o Brasil divulgar as suas aulas. “Dias atrás, me encontrei com um jovem que reclamou que no Brasil tudo é difícil”, afirmou o empresário. “Mas por ser difícil é que aqui existem muitas oportunidades.”