11/11/2016 - 17:00
Em condições normais de temperatura e pressão, o candidato republicano Donald Trump seria abatido de suas ambições presidenciais muito tempo antes da eleição. Durante a campanha, o magnata do setor de construção civil e celebridade de reality shows teve decretado seu fim pelo grau explosivo de escândalos que envolveram seu nome. Trump foi acusado de ser um predador sexual e de ter assediado diversas mulheres. Com suas caras e bocas, o republicano disparou insultos contra mulheres, imigrantes, negros, latinos, pessoas com deficiências, prisioneiros de guerra e muçulmanos. Ao longo do caminho foi abandonado por quase todos os caciques do partido. Os ex-presidentes Bush, pai e filho, por exemplo, não foram às urnas. O último candidato do partido, Mitt Romney, fez campanha contra Trump. O presidente da Câmara, Paul Ryan, deixou claro mais de uma vez que tem profundas diferenças políticas com o presidente eleito.
Por muito menos, qualquer pretendente à Casa Branca ficaria pelo caminho. Mas Trump não só resistiu até o fim, como venceu a candidata democrata Hillary Clinton. Um espanto, de fato. O que explica o fenômeno Trump? Há diversas análises, que abordam desde o avanço de uma onda conservadora no mundo, como também indicam que sua eleição é uma mensagem dos americanos esquecidos pela globalização, que perderam seus empregos para fábricas que se deslocaram para outros lugares, como México e China. Quero, no entanto, me focar em outro ângulo: a desilusão dos eleitores com os políticos e a política, o que abre a porta para aqueles que se dizem contra o status quo vigente. São os outsiders, referência aos candidatos de fora do tradicional círculo político.
Não se trata, evidentemente, de uma realidade exclusiva dos Estados Unidos. No mundo, essa onda de descrédito tem sido observada. O que é o Brexit, referendo que decidiu pela saída do Reino Unido da União Europeia, se não um sinal das frustrações dos cidadãos britânicos com o mercado comum europeu? As eleições municipais brasileiras, em outubro deste ano, são também um exemplo desse movimento, agravado pela Lava Jato, que lançou a já pouca credibilidade da classe política para o ralo. Candidatos que nunca concorreram a uma eleição e se apresentaram como gestores, como João Dória Jr., em São Paulo, e Alexandre Kalil, em Belo Horizonte, sagraram-se vencedores, aproveitando-se desse sentimento apolítico do eleitorado.
Outro reflexo do desinteresse pela política está no alto número de votos brancos, nulos e de abstenções no pleito municipal. Os votos inválidos somaram um terço do total, atingindo os maiores patamares desde 2000. No Rio de Janeiro, que elegeu Marcelo Crivella, 41,5% dos eleitores não escolheram nenhum dos candidatos – o outro era Marcelo Freixo. Pior: recente pesquisa do Ibope Inteligência mostrou que 50% dos eleitores não têm preferência por nenhum partido. Os sem-partido já eram 45% da população antes de junho de 2013. É nesse cenário de desinteresse aos políticos tradicionais que será disputada a eleição presidencial de 2018. Na Itália despedaçada pela operação Mãos Limpas, nos anos 1990, o empresário Sílvio Berlusconi chegou ao poder. Quem será o outsider que surgirá no Brasil da Lava Jato?