22/11/2013 - 21:00
O prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, vai ter de suar a camisa para tentar garantir que a construção de 150 quilômetros de corredores de ônibus, três hospitais e dezenas de milhares de unidades habitacionais prometidos por ele no início de sua gestão não continuem na gaveta – mesmo destino do projeto que reduziria os juros pagos por Estados e municípios à União. Os planos do petista foram atropelados pelo pacto fiscal assinado na terça-feira 19, em Brasília, entre a presidenta Dilma Rousseff e os líderes dos partidos da base aliada.
Mantega e Haddad: sacrifício do aliado pode afetar eleição do petista Alexandre Padilha
ao governo do Estado de São Paulo
Depois de uma reunião de três horas no Palácio do Planalto, Executivo e Legislativo concordaram em desistir da votação de projetos que aumentariam as despesas públicas em R$ 60 bilhões, desarmando, assim, a bomba fiscal que ameaçava explodir no colo do governo em pleno ano eleitoral. A mudança no indexador da dívida da prefeitura com a União havia sido prometida por Dilma a Haddad e, como seria retroativa, reduziria em R$ 22 bilhões o atual saldo de R$ 54 bilhões, abrindo caminho para o município contrair novos empréstimos para poder investir.
O rompimento do acordo de cavalheiros foi a contribuição do Executivo a um maior aperto do cinto, em função da difícil situação fiscal do governo. “O projeto perdeu prioridade”, confirmou no dia seguinte o ministro da Fazenda, Guido Mantega. “Não é um projeto apenas para São Paulo, pois um quarto da população brasileira mora em cidades que pagam juro muito superior à taxa de mercado”, lamentou Haddad. A decisão tem um alto custo político – a gestão paulistana seria uma boa vitrine para o PT emplacar seu candidato a governador de São Paulo, o ministro da Saúde, Alexandre Padilha – e mostra que o governo está levando a sério o agravamento do quadro fiscal, que preocupa investidores.
Além de concordar em apagar o pavio da bomba fiscal, o Congresso deu outra contribuição. Na quarta-feira 20, deputados e senadores aprovaram uma alteração na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) enviada em abril pelo Executivo desobrigando a União de compensar a participação dos Estados e municípios na formação do superávit primário. Na prática, o governo assume que não fará o superávit de RS 110 bilhões anunciado pelo ministro Mantega no início do ano, o equivalente a 2,3% do PIB. A economia foi reduzida para R$ 73 bilhões, ou 1,5% do PIB.
Na visão do governo, embora menor do que anteriormente previsto, o superávit brasileiro é suficiente para manter a dívida sob controle. Em discurso na Federação das Associações Comerciais do Estado de São Paulo, em Campinas, na terça-feira 19, Dilma defendeu a solidez fiscal da economia brasileira. “A dívida líquida do setor público corresponde a 35% do PIB, e nós temos US$ 376 bilhões de reservas internacionais”, afirmou a presidenta, ressaltando que, dos 20 países mais desenvolvidos, apenas seis produzem superávit primário.
A maior transparência na comunicação agradou ao mercado, que vinha pedindo uma sinalização mais clara das intenções do governo.Carlos Kawall, economista-chefe do Banco Safra, considera positiva a mudança de atitude, mas lamenta a indicação de que em 2014 o esforço fiscal também será menor. E alerta que a dívida bruta vai continuar a subir, atingindo R$ 3 trilhões no próximo ano. “Na prática, isso significa que não há mais uma meta do setor público consolidado”, afirma. Até setembro, o superávit somava R$ 27,9 bilhões, ainda longe do necessário.
Mas o governo conta com a melhora da arrecadação no fim do ano e com receitas extraordinárias, como os R$ 15 bilhões do bônus de assinatura do campo de petróleo de Libra e até R$ 12 bilhões provenientes da renegociação de dívidas em atraso. “O governo ainda insiste nas políticas fiscais expansionistas e no uso de manobras fiscais atípicas, como o novo Refis”, afirma o economista Felipe Salto, da consultoria Tendências. Pelo menos uma notícia positiva o governo já teve: a arrecadação de outubro bateu o recorde para o mês, com a entrada de R$ 100,9 bilhões, crescimento de 5,43% em relação ao mesmo mês do ano passado.