25/11/2016 - 20:00
Depois uma semana de frio incomum em plena primavera, o sol volta a dar o tom da estação mais florida do ano na capital paulista. Em um contraponto à elevação dos termômetros, mais condizente com o mês de outubro, aquela terça-feira começou atípica para Henry Maksoud Neto, que não conseguiu cumprir seu ritual diário de todas as manhãs: praticar aulas de yoga. A mescla de meditação, postura e respiração é o que dá fôlego e equilíbrio para o empresário de 40 anos enfrentar o clima tenso dos últimos anos. Ele é um dos protagonistas de uma trama de disputas judiciais e troca de acusações entre os membros da família Maksoud.
Em jogo, a herança do patriarca do clã, Henry Maksoud, morto em abril de 2014, aos 85 anos, vítima de câncer no pulmão. De um lado do embate, Neto e a ex-manicure e segunda mulher do avô, Georgina. No outro canto do ringue, os filhos do primeiro casamento do empresário, Claudio e Roberto, o pai de Neto. Conhecido por um estilo arrojado de gestão, Henry Maksoud construiu um patrimônio estimado em mais de R$ 900 milhões. Boa parte da fortuna está centralizada na Hidroservice Engenharia. Fundada em 1958, a holding foi responsável por obras como a barragem de Sobradinho e a Usina de Itaipu.
O símbolo do grupo, no entanto, é o Maksoud Plaza. Instalado em uma das áreas mais valorizadas de São Paulo, próximo à Avenida Paulista, e inaugurado em 1979, o hotel foi a primeira referência de empreendimento de luxo no País. Em seu auge, hospedou uma extensa lista de políticos, empresários e celebridades – da dama de ferro Margaret Thatcher ao vocalista do Guns N’ Roses, Axl Rose. Os quatro shows de Frank Sinatra no teatro do local, em 1981, estão entre os pontos altos dessa história. É em uma sala simples e discreta no primeiro andar do hotel que Neto lidera os negócios do grupo desde a morte de Henry Maksoud.
Nos mais de dois anos à frente da operação, ele diz não ter medido esforços para tocar o império construído pelo avô. No período, a redução das dívidas trabalhistas foi um dos focos. De 2002 para cá, o número de ações caiu de 400 para 40 pendências. A busca pelo estabelecimento de um padrão de governança corporativa foi outra prioridade. O empresário costurou projetos com a Tattica e negocia agora um novo projeto com a consultoria Falconi. “Meu objetivo é alcançar o nível de uma companhia de capital aberto”, afirma. “Tudo o que estou fazendo é milimetricamente pensado”, diz.
Para atrair novos públicos ao hotel, Neto abriu espaço para projetos do empresário Facundo Guerra, conhecido por revitalizar áreas degradadas de São Paulo. Os principais frutos dessa aproximação foram o PanAm e o Frank Bar, espaços que ganharam destaque na noite paulistana. Sob a mesma orientação, em 2015, ele fechou um acordo para incluir os 416 quartos do Maksoud Plaza nos canais de reservas da rede francesa Accor, dona de marcas como Ibis, Mercure, Pullman e Sofitel. Hoje, a plataforma responde por 9% da receita do hotel, de R$ 51,5 milhões em 2015. Para 2016, a projeção é faturar R$ 60 milhões. Desde 2014, a taxa de ocupação saltou de 40% para a média atual de 68%.
Workaholic assumido, o empresário segue traçando planos para o Maksoud Plaza. Um dos destaques é uma negociação em andamento com a rede francesa MK2, conhecida por projetos que unem cinema, bares e alimentação. Em busca de rentabilidade por metro quadrado, o radar inclui ainda espaços de coworking e a instalação de um bureau de impressão 3D. Neto também avalia alternativas para expandir o negócio, como a prestação de serviços externos e o licenciamento da marca. Todas essas iniciativas convivem, porém, com os imbróglios relacionados aos demais herdeiros de Henry Maksoud.
O principal alvo é um testamento elaborado pelo patriarca, em 2003. Além de conferir o comando do grupo ao neto, o documento determina que metade do espólio seja dividido entre ele e Georgina, que também foi nomeada administradora dos bens. Os filhos do empresário têm direito à metade restante do patrimônio. “É um caminho absolutamente natural. Fui o braço direito dele a minha vida inteira”, afirma Neto, que morou com o avô a partir dos seis anos, após a separação dos pais. “Trabalhei em todas as áreas do hotel desde os meus 15 anos. Esse negócio está entranhado em mim”.
Seu pai, Roberto, de 62 anos, contesta as afirmações. “Meu filho nunca teve essa relação com o avô e o hotel. Ele está apenas repetindo a minha história”, diz. Roberto deixou a administração do Maksoud Plaza em 1999. Depois de sua saída, teve pouco contato com Henry Maksoud e culpa Georgina por criar uma barreira entre os dois. Ele ainda acusa a madrasta de maus-tratos que teriam agravado a doença do pai, como parte de uma trama para elaborar e validar o testamento que a beneficiaria, junto com Neto. Tanto Roberto, como seu irmão Claudio moveram ações que correm em segredo de Justiça e pedem a anulação do testamento, a destituição de Neto e a exclusão dele e de Georgina da partilha dos bens.
Ao mesmo tempo, um inquérito conduzido pelo Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) investiga as circunstâncias da morte do empresário. Procurados, Georgina e Claudio Maksoud não concederam entrevistas. Recentemente, outro fato colocou a família sob os holofotes. A investigação jornalística internacional Panama Papers revelou que o mandato de Henry Maksoud como procurador da empresa panamenha Rasway Corp., comprada pelo banco J. Safra Sarasin, foi renovado em setembro de 2015, mais de um ano após a morte do empresário.
Tanto Neto como Roberto, assim como seus respectivos advogados, disseram não ter conhecimento desses documentos. “A renovação automática é uma praxe nesses casos”, diz o advogado Rui Fragoso, que representa Roberto. Procurado, o J. Safra Sarasin não retornou aos pedidos de entrevista da DINHEIRO. As disputas não estão restritas ao círculo dos Maksoud. Como parte da cobrança de uma dívida trabalhista de R$ 13 milhões da Hidroservice, o Maksoud Plaza foi a leilão em 2011. O imóvel foi arrematado por Jussara e Fernando Simões, sócios do grupo JSL, por R$ 70 milhões.
Posteriormente, a Hidroservice conseguiu invalidar o pregão, o que motivou uma ação rescisória, julgada procedente, por parte dos compradores. Após novo recurso, o caso aguarda julgamento no Tribunal Superior do Trabalho, em Brasília. Por meio de sua assessoria, Jussara e Fernando Simões afirmaram que confiam no Poder Judiciário. E que, confirmada a arrematação, “estão prontos para realizar os investimentos necessários na modernização do imóvel.” Neto, por sua vez, ressalta que atendeu todos os prazos estipulados no processo.
Além de questões do passado, Neto tem de lidar com os riscos relacionados ao futuro de sua gestão. “O Henry está fazendo planos em um terreno movediço”, diz seu pai Roberto. “Ele se coloca como dono da operação. Mas a sua posição é temporária. A qualquer momento ele pode ser destituído.” A ameaça não abala a confiança do filho, que recorre a uma das tantas lições que diz ter aprendido com o avô. “Ele dizia que não havia doença, mau humor ou problema com família capaz de impedir você de correr atrás.” Se o mesmo ensinamento foi repassado aos demais membros do clã, tudo indica que a disputa está longe de ter um fim.
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Casos de família
Saiba mais sobre as disputas e problemas envolvendo o clã Maksoud
• Ao menos seis processos que colocam em choque membros do clã correm na Justiça. Entre outros temas, eles pedem a anulação do testamento do patriarca. Os casos tramitam na 5a Vara da Família e Sucessões, além de diferentes varas cíveis do estado de São Paulo.
• Ao menos seis processos que colocam em choque membros do clã correm na Justiça. Entre outros temas, eles pedem a anulação do testamento do patriarca. Os casos tramitam na 5a Vara da Família e Sucessões, além de diferentes varas cíveis do estado de São Paulo.
• Em leilão de 2011, o prédio do Maksoud Plaza foi arrematado por R$ 70 milhões pelos empresários Jussara e Fernando Simões, sócios da JSL. Após uma série de recursos de ambas as partes, o caso corre em segredo de justiça e aguarda julgamento no Tribunal Superior do Trabalho.