25/11/2016 - 20:00
A reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES), realizada na segunda-feira 21, começou com uma notícia indigesta. Enquanto buscavam seus lugares à mesa, as lideranças da economia brasileira tentavam calcular o impacto da informação dada pelo economista Fabio Kanczuk, novo secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda. Mais cedo, Kanczuk havia informado que a equipe econômica reduzira a previsão de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 1,6% para 1% em 2017. A projeção para 2016 também piorou. Caiu da retração de 3% para um encolhimento de 3,5%. Segundo Kanczuk, a alta dos juros cobrados pelos bancos, na contramão da redução da taxa Selic, e a contração do crédito, afetam o crescimento (leia mais aqui)
A revisão das perspectivas para este ano e para o ano que vem foi motivada pelo encarecimento do crédito para as empresas. O dinheiro está mais caro, algo perceptível pela elevação entre a diferença do custo para o tomador do crédito e a remuneração paga pelo banco ao depositante, conhecida como spread bancário. Na quinta-feira 24, o Banco Central (BC) informou que os juros nas operações com recursos livres – que não incluem o crédito imobiliário, o financiamento rural e as linhas do BNDES – subiram 0,5 ponto percentual em outubro, para 73,7% ao ano.
É um recorde desde que o BC começou a divulgar sistematicamente esses dados, em março de 2011. “Os spreads no crédito às empresas estão subindo, e dinheiro mais caro sinaliza que o setor bancário está percebendo maior risco nas empresas”, disse Kanczuk. Segundo ele, a queda da atividade econômica reduz o lucro das companhias, o que torna mais difícil para elas pagar o que devem. Isso turbina a inadimplência e os problemas. De acordo com a Serasa Experian, entre janeiro e setembro deste ano, 1.479 empresas pediram recuperação judicial, uma alta de 62% ante o mesmo período do ano passado.
O risco aumenta e os bancos se retraem. Assim, o dinheiro ficou não só mais caro, mas também está mais escasso. Os financiamentos empresariais estão em seu menor patamar em dez anos. Segundo o BC, em outubro os empréstimos com recursos livres para as empresas recuaram para 12,04% do PIB, ante 13,73% do mesmo mês de 2015. É o menor nível desde os 11,64% de fevereiro de 2008. Os banqueiros presentes à reunião reconhecem a gravidade da situação, que tem contribuído para a desaceleração econômica. Luiz Carlos Trabuco, presidente do Bradesco, afirmou que o consumo fraco e o desemprego elevado atrasaram a volta do crescimento.
“O PIB caiu 10% nos últimos anos e isso representa uma retração da renda média de 14%”, disse ele. Para Trabuco, a retomada só deve começar no segundo semestre de 2017. No entanto, ele avalia que a eleição de Donald Trump deve reduzir o espaço para a queda dos juros no Brasil. “Corremos o risco de o desemprego continuar crescendo no próximo ano e atingir 14%”, disse Trabuco. Hoje, ele está em 12%. Para ele, 2017 ainda será desafiador. “O grande desafio, para o governo e para a sociedade, é encontrar os motores do crescimento para a retomada. Porque, sem investimento privado, não vamos ter geração de emprego”, disse ele.
Também presente à reunião, Roberto Setubal, presidente-executivo do Itaú Unibanco, afirmou que, para acabar com as incertezas e recolocar a economia na trajetória de crescimento, o receituário é o de sempre: reformas. “O Brasil precisa de três reformas para voltar a crescer de forma sustentável e acima dos 2%: a trabalhista, a política e a da intermediação financeira”, disse ele. Setubal também defendeu mais flexibilidade para os bancos na hora de conceder empréstimos. Segundo ele, a atividade hoje é muito engessada devido à obrigatoriedade de direcionar recursos para determinados setores.
No que depender dos bancos, há poucos motivos para imaginar que essa situação mude no curto prazo, ou seja, em 2017. Mas o pessimismo vai além da banca. As vendas de cerveja da Ambev nos três primeiros trimestres do ano caíram 5,1% ante 2015, e o faturamento da companhia recuou 6,6%. E um diálogo entre o bilionário Jorge Paulo Lemann, controlador da Ambev, e Trabuco reflete bem o espírito do momento. “Se está difícil vender cerveja, imagine o resto”, teria dito Lemann a Trabuco. Procurados, os interlocutores não comentaram.