15/02/2012 - 21:00
Nos últimos anos, nenhum setor sofreu mais o impacto da internet em seus negócios do que as livrarias. Em especial nos Estados Unidos. A Borders, segunda maior rede americana, fechou suas portas em setembro do ano passado. A Barnes & Noble, a maior do país, sofre para sobreviver. Sua aposta para sair da crise não é no modelo tradicional, mas sim na venda de livros digitais e de seu e-book Nook, que concorre com o Kindle, da rival Amazon. Se o cenário americano é de terra arrasada, o mercado editorial brasileiro parece viver um período de contida euforia. Tanto que a paulistana Livraria Cultura vai praticamente dobrar seus pontos de venda até 2015, passando de 13 para 25.
Megastore, em São Paulo: as lojas da rede de Fabio Herz viraram pontos de encontro
das mais diversas tribos e reúnem, além de bons livros, café e até teatros.
“Adotaremos uma política agressiva de expansão já a partir deste ano, quando esperamos crescer 25%”, disse à DINHEIRO Fabio Herz, diretor de marketing e herdeiro da rede de livrarias. Caso a expectativa se confirme, o faturamento da rede deve saltar de R$ 332 milhões, em 2011, para R$ 415 milhões, daqui a quatro anos. Somente em janeiro, as vendas de suas 13 lojas cresceram 30% em relação a igual período de 2011. Boa parte desse desempenho tem relação direta com o lançamento de best-sellers arrasa-quarteirões, como as biografias dos empresários Steve Jobs e Eike Batista e de José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, que marcou época na TV Globo das décadas de 1960 até 1990.
Além disso, os livreiros vêm se beneficiando de mudanças estruturais, como a ampliação da renda média dos trabalhadores e do número de estudantes universitários. Nos últimos dez anos, nada menos que um milhão de pessoas se matricularam em faculdades públicas e privadas no País. Graças a um modelo de negócio que ajudou a transformar suas lojas em pontos de encontro de integrantes das mais diversas tribos, a Cultura se firmou como uma referência no setor. “Ao tratar as pessoas como consumidores, e não apenas clientes, a empresa conseguiu se diferenciar das demais”, diz Heloisa Omine, professora de marketing da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM-SP) e dona da consultoria de varejo Shopfitting. Por conta disso, a Cultura passou a ser uma grife disputada por empreendedores de shopping centers.
Três das quatro unidades previstas para serem abertas em 2012 serão lojas-âncora em centros de consumo de Manaus, do Recife e de São Bernardo do Campo, no ABC paulista. Nesses locais, replicará o formato megastore da matriz, no Conjunto Nacional, em São Paulo, que reúne múltiplos ambientes, como café, espaço para lançamento de livros e até mesmo um teatro. Serão investidos cerca de R$ 35 milhões nas 12 novas lojas, com recursos levantados no BNDES. O fenômeno dos leitores digitais de livros, como o Kindle, da Amazon, que ajudou a colocar em xeque o varejo de livros nos Estados Unidos, está longe de representar uma ameaça no Brasil, acredita Herz. “São culturas diferentes”, diz o empresário.
“Por aqui, um dos fortes inibidores desse movimento é a renda média da população, além do elevado custo para a implantação da tecnologia.” Isso não significa dizer que a empresa subestime as novas mídias. A Cultura foi uma das primeiras a aderir à internet. Só que, ao contrário das rivais, ela não cobra preços diferenciados. “Não podemos punir os clientes que se deslocam até as nossas lojas”, afirma Herz. Hoje, a loja virtual já é a segunda em receita, colaborando com 18% do total. A empresa também sai na frente na venda do Alfa, o e-book da brasileira Positivo. “Já está provado que uma nova tecnologia não substitui inteiramente a anterior.” Mas o exemplo americano prova também que aqueles que não se preparam para a próxima onda podem ficar pelo caminho.