Desde junho deste ano como presidente da Petrobras, o engenheiro Pedro Parente, 63 anos, deu início a um obstinado plano de redução do endividamento da empresa. No terceiro trimestre do ano passado, a dívida total da empresa havia ultrapassado os R$ 500 bilhões. Doze meses depois, ela baixou para menos de R$ 400 bilhões. A alavancagem também se tornou um problema. A dívida líquida chegou a ser mais de cinco vezes a geração de caixa – a meta é reduzir pela metade. Para isso, um plano de desinvestimento vai fazer com que a empresa concentre seus esforços apenas na exploração e produção de petróleo. A seguir, os principais trechos da entrevista.

O endividamento da Petrobras é realmente gravíssimo?
É preciso levar em conta os indicadores da nossa indústria e o fato de que a gente opera no Brasil, onde o custo de capital, naturalmente, é maior e mais alto. Essas coisas todas combinadas com um quadro que levou às sucessivas reduções de rating e o crescimento muito explosivo da dívida entre 2010 e 2014 mostram que o nível atual da dívida é muito alto. Vamos falar sempre da dívida no final de 2015, para ter um parâmetro de comparação, que foi o que utilizamos para o plano. A nossa dívida líquida comparada a nossa geração operacional de caixa era superior a 5 vezes. Eu diria que, no Brasil, para qualquer empresa, é muito grande. Nossa meta, para 2018, e não quer dizer que achamos que seja um nível ideal, é um nível de alavancagem não superior a 2,5 vezes. E numa trajetória declinante, pois não queremos parar.

Há algum ponto mais preocupante?
Se olhar o que aconteceu com a nossa conta de juros, ela se multiplicou várias vezes. Se não formos capazes de reduzir a taxa de juros, ela pode multiplicar-se por 10. O que, obviamente, não faz o menor sentido. Em 2009, a Petrobras pagava US$ 1,7 bilhão de juros e, em 2015, já pagamos US$ 6,3 bilhões, uma multiplicação de quase quatro. Mas a taxa de juros de 3,1% foi para 8,6%, no pior momento. Por isso, não dá para conviver com uma dívida desse tamanho. É preciso reduzir os encargos e é isso o que estamos fazendo com o programa de parcerias e desinvestimentos. Porque, na medida em que vamos rolando esse endividamento, a gente poderia multiplicar por 10 aquele juro inicial de US$ 1,7 bilhão.

A velocidade do plano de desinvestimento está satisfatória?
Temos uma meta para o período 2015-16 de US$ 15,1 bilhões. Com essa última transação de venda da Liquigás, chegamos próximos a US$ 11 bilhões. O diretor Ivan Monteiro, que é o responsável pela área de parcerias e desinvestimentos, mantém a meta de transações anunciadas. É verdade que a meta inicial era para ingresso de caixa, vamos ser transparentes. Mas há fatores que não nos permitiram chegar a ela, que são absolutamente compreensíveis. Se, por exemplo, a venda da Liquigás não fosse para uma operadora já estabelecida no mercado brasileiro de botijão de gás domiciliar, certamente o processo no Cade demoraria menos. A meta de caixa certamente não será alcançada, mas a meta de transações anunciadas a gente quer cumprir. Portanto, ainda temos algumas transações a anunciar até o fim do ano.

O total de US$ 35 bilhões até 2018 está mantido?
Temos mais US$ 19,5 bilhões para cumprir até 2018, o que totaliza um programa de US$ 34,6 bilhões de parcerias e desinvestimentos. Temos uma história muito boa e bem-sucedida de parcerias para a Petrobras, que nos últimos anos virou tabu. As parcerias têm várias vantagens. Naturalmente reduz o risco e a necessidade de investimento, o que libera recursos para aplicar em outras partes da cadeia produtiva. Tem, também, uma troca de experiências, tecnologia e conhecimento, tanto sob o ponto de vista técnico, de geologia, exploração e processos, como de questões de governança corporativa. Quando se tem parceiros da qualidade dos da Petrobras, que são só grandes empresas internacionais, todos eles têm requerimentos de compliance muito elevados. E os problemas da empresa não foram nessas parcerias. Por isso, creio que a Petrobras utilizará essa experiência da exploração para outras áreas da empresa.

Por que o fim da obrigatoriedade do pré-sal é importante para a Petrobras?
O que constatamos é que o pré-sal não era uma discussão racional, era ideológica. Porque, com toda a sinceridade, quando se analisa do ponto de vista racional não há como ser contra a retirada dessa obrigação para a Petrobras. Como é que uma opção, que nós mantemos e conquistamos, sem nada pagar por ela, pode ser pior que uma obrigação? Além disso, para o País é muito ruim essa obrigação de a Petrobras ser operador único. Porque vivemos numa situação de restrição financeira. Cada campo do pré-sal precisa de um desembolso, entre investimentos e custeio até o início da produção, de cerca de US$ 10 bilhões. É óbvio que, como são tão bons esses campos do pré-sal, ele se paga. Mas precisa ter fôlego para fazer isso. A Petrobras está vivendo a situação que vive e, se a gente continuasse com essa obrigação, o País se veria obrigado a desenvolver um número muito menor de campos, o que postergaria o aproveitamento dessa riqueza que está no subsolo. Enquanto está lá, é potencial. Uma informação adicional. De cada um desses campos, 44% do que se produz é receita pública, de royalties e impostos. A contribuição que uma exploração mais acelerada do pré-sal poderia dar a essa gravíssima situação fiscal que vivemos, inclusive para o Rio de Janeiro, seria muito grande. Outra razão para se pensar.

Qual o cenário para 2017 depois de eventos como o Brexit e a eleição de Donald Trump nos EUA?
O País e a Petrobras podem ser afetados, ou serão afetados, por um governo Donald Trump de uma maneira indireta. A nossa relação comercial com os EUA é de uma natureza completamente diferente da do México. Hoje, temos um déficit na nossa balança comercial com os americanos. Isso significa que seremos afetados de maneira indireta. No nosso caso específico, o que é relevante entender, ou quando for possível entender, porque hoje ainda está muito difícil fazer essa leitura, é o impacto no preço do petróleo e na taxa de câmbio. Essas são as duas variáveis mais importantes do nosso plano estratégico. O nosso plano é apresentado com um único cenário, que trabalha dentro de uma linha conservadora sobre aquilo que pensavam as consultorias. Obviamente que esperamos que o petróleo suba e que o câmbio fique no mesmo nível. Trabalhamos com uma variação do petróleo mais relevante após 2020. Nesse período inicial, ele fica entre US$ 45 e US$ 55, o barril. Mas não trabalhamos com um cenário único. São vários, inclusive o de estresse. E, mesmo num conjunto grande de cenários de estresse, conseguimos alcançar as metas.

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Confira a matéria “A recuperacão da Petrobras