22/12/2010 - 21:00
O ano está chegando ao fim, trazendo as famosas promessas de Ano-Novo. Além das tradicionais – perder peso, deixar de fumar, começar a fazer exercícios e juntar dinheiro –, a hora é boa para uma resolução diferente.
Que tal começar 2011 prometendo não perder nada? Pare e pense quantas vezes você deixou de aproveitar algo a que tinha direito. Desperdiçou milhas aéreas porque não viajou a tempo. Perdeu um bônus de um clube de compras. Não aproveitou um prêmio de restaurante, cinema ou teatro, ou as milhas de locação de um carro.
Se você está fazendo essa conta e o resultado é ruim, não se desespere. Você não está sozinho. O programa Multiplus Fidelidade, que administra as milhagens dos 7,6 milhões
de passageiros que já voaram pela Tam, informa que 27% dos pontos que venceriam em 2009 não foram resgatados.
Isso gerou uma receita contábil de R$ 205,2 milhões para a companhia no ano passado – ou, visto de outra forma, esse foi o valor de milhas que foram desperdiçadas por quem tinha direito a elas.
Por que isso acontece? Segundo Eduardo Campozana Gouveia, presidente da Multiplus, as pessoas perdem as milhas por esperarem demais para aproveitá-las. Elas acumulam esses prêmios por muito tempo para ter direito a passagens longas.
Denise Moraes: acumulou pontos em um programa do Pão de Açúcar durante dois anos e não aproveitou
Resultado: os benefícios acabam expirando e as pessoas não aproveitam o que têm direito, mesmo podendo trocar as milhas por outros prêmios em lojas, restaurantes e hotéis.
Esse comportamento prejudicial é um bom exemplo dos mecanismos psicológicos que provocam prejuízos. “Adiamos planos e perdemos oportunidades porque esperamos para aproveitar os prêmios a que temos direito”, diz a psicóloga Vera Rita de Mello Ferreira, especialista em psicologia econômica.
Para ela, as pessoas ficam esperando momentos especiais, quando não tiverem nada importante para fazer, o que é errado. “Achamos que no futuro nós estaremos em uma situação diferente, que nos permitirá aproveitar mais”, diz Vera. “Só que, no futuro, seremos as mesmas pessoas, com os mesmos compromissos.”
Ou seja, acabamos deixando as oportunidades passarem. Há também quem perca suas milhas aéreas por adiar demais a hora da reserva. Ao tentar converter as milhas em passagens na última hora, quando não há mais lugares desse tipo disponíveis, o resultado é a decepção.
Outro problema é achar que esses benefícios são gratuitos e, por isso, não têm valor, diz a psicanalista Márcia Tolotti. “Se conquistamos o direito a um prêmio foi porque pagamos por ele”, diz ela.
“A pessoa não enxerga que deixar vencer milhas é sofrer um prejuízo.” Esse é o caso da publicitária Denise Moraes, 33 anos. Ela é uma usuária assídua de pontos de fidelidade, mas já perdeu várias oportunidades. Um exemplo é um programa de pontos do supermercado Pão de Açúcar.
Tathiane Araújo: comprou por R$ 80 o direito a um jantar que custaria R$ 120, mas perdeu a data final – e o dinheiro
“Em dois anos acumulei R$ 6 mil em compras e ganhei um vale de R$ 50 que tinha um mês para resgatar”, diz ela, que acabou perdendo o prazo. Ela também participa do programa de fidelidade de uma rede de lojas de produtos para animais. Aqui, os prazos mais flexíveis evitam a perda dos pontos. “Consigo resgatar algo a cada três meses.”
Como evitar perder esses prêmios? Uma das dicas de Márcia é tratar os benefícios como obrigações financeiras. Ao receber um bônus, o cliente deve atribuir a ele o valor que poderia ser economizado com seu desfrute.
Outras recomendações são planejar o uso antecipadamente e preferir o resgate imediato ou no curto prazo dos benefícios em vez de esperar um futuro distante. Além disso, os especialistas advertem que o prazer, assim como as obrigações, precisa de um pouco de planejamento.
Eles recomendam o uso de mecanismos simples, como escrever lembretes para não esquecer do prazo de validade dos brindes, programar o dia de uso dos bônus antes de comprá-los e combinar de usar os benefícios com outra pessoa. “Ao assumir um compromisso com alguém fica mais simples cumprir um objetivo”, diz Vera Ferreira.
A ausência desses cuidados custou um jantar com direito a fondue a Tathiane Araújo, 24 anos, que trabalha em uma empresa de alimentos. Aproveitando-se de uma promoção do portal de compras coletivas Peixe Urbano, ela comprou, por R$ 80, um jantar que custaria R$ 120.
Ela poderia aproveitar o jantar em até 90 dias, mas não conseguiu abrir uma brecha na agenda – e não foi por falta de tempo. “Minha intenção era jantar com uma amiga, mas esperamos muito por uma ocasião especial, não conseguimos nos programar a tempo e perdemos o prazo”, diz ela.
Não foi sua única perda. “Eu tinha milhas da Tam suficientes para fazer uma viagem curta, mas preferi acumular para um trajeto mais longo.” Mais tarde ela mudou de ideia e se inscreveu em um programa para obter desconto nas passagens aéreas. “Só que, para fazer isso, eu perdi todas as milhas que tinha acumulado.”
Ela tem nas mãos um cupom para jantar em uma cantina italiana que garante 70% de desconto, comprado no Peixe Urbano em conjunto com amigos, e que está prestes a expirar. “Esperamos tanto uma oportunidade especial que agora já não temos dia disponível para usar o desconto e vamos perder mais um”, diz.
Os clubes de compras coletivas conhecem muitos clientes que seguem esse padrão. Rafael Singh, gerente de marketing do clube Groupon, inaugurado em julho de 2010, acredita que 10% dos cupons expiram sem ser usados.
O comportamento dos clientes mostra que eles privilegiam o curto prazo. “A taxa de uso dos cupons é alta logo que a promoção é adquirida, cai nos meses seguintes e volta a subir perto da data do vencimento”, diz ele. Singh recomenda que os clientes se programem para não perder dinheiro.
A mesma recomendação vale para todos os demais programas de fidelidade, incluindo cartões de crédito e bônus de lojas, hotéis e locadoras de veículos. Comprar motivado pelos benefícios e não usá-los é jogar dinheiro fora.
“Antes de se encantar com um cartão de crédito que dê pontos, o cliente tem de avaliar se vai usar mesmo essas recompensas”, diz Vera Ferreira. “Não é negócio gastar dinheiro para obter bônus que serão desperdiçados.”