Na quinta-feira 12, horas antes da estreia do Brasil na Copa do Mundo, a presidenta Dilma Rousseff recepcionou chefes de Estado em um hotel em Guarulhos. O cardápio do almoço, com iguarias brasileiras, era atraente. Moqueca de robalo com polenta de banana da terra e arroz ao leite de coco. De sobremesa, mousse de cupuaçu e doce de abóbora com o onipresente coco. Para acompanhar, foi servido o vinho oficial da Copa do Mundo, da vinícola gaúcha Lídio Carraro.

Mas a lista de apenas 11 participantes resume bem as reduzidas ambições comerciais do País nos últimos anos, em que predominou a chamada política de Cooperação Sul-Sul. Dos presentes, seis eram sul-americanos – Evo Morales (Bolívia), Michelle Bachelet (Chile), Rafael Correa (Equador), Horacio Cartes (Paraguai), Jose Mujica (Uruguai) e Desi Bouterse (Suriname) – e três eram africanos – Kwesi Amissah-Arthur (Gana), José Eduardo dos Santos (Angola) e Ali Bongo Odimba (Gabão).

Completaram a lista Zorán Milanovic, primeiro-ministro da Croácia, adversária da Seleção Brasileira na estreia, e Tamim Bin Hamad al-Thani, emir do Catar, que sediará a Copa em 2022. Reunidos, os 11 países representam apenas US$ 11 bilhões em exportações do Brasil, menos de 5% de tudo que o País vendeu ao Exterior em 2013. Não foi por falta de convite que outros chefes de Estado não assistiram à abertura da Copa. Todos os participantes do torneio da Fifa receberam uma carta da presidenta Dilma. Sob o clima festivo da Copa do Mundo, a diplomacia brasileira tenta atrair o maior número possível de parceiros estratégicos.

“A Copa cria uma aproximação que será um catalisador para as negociações comerciais e diplomáticas”, diz o professor de direito internacional da Pontifícia Universidade Católica de Campinas Luís Renato Vedovato. Na própria quinta-feira, ainda em Brasília, Dilma se encontrou com Bachelet no Palácio do Planalto. Oficialmente, as conversas se restringiram ao futebol, além da assinatura de um memorando para a troca de informações sobre a ditadura militar. O Brasil é o principal destino de investimentos chilenos no mundo, com estoque de US$ 24,6 bilhões e projetos de cooperação energética, integração física e comercial.

A corrente de comércio com o Chile, que alcançou US$ 8,8 bilhões em 2013, é a terceira maior do Brasil na América Latina. Nos últimos quatro anos, o intercâmbio entre os dois países teve aumento de 65,3%. Apesar de ausentes na abertura, alguns pesos-pesados da economia mundial prometem vir ao Brasil durante a Copa do Mundo. No domingo 15, um jantar será servido à chanceler da Alemanha, Angela Merkel, no Palácio da Alvorada. Há a expectativa de que o encontro sirva para discutir a criação de um mecanismo de consultas mútuas periódicas entre os dois países, o que, na prática, torna possível um avanço comercial.

Além disso, serão debatidas as negociações entre o Mercosul e a União Europeia para um tratado de livre-comércio. Na terça-feira 17, a visita será do vice-presidente americano, Joe Biden, que irá a Natal para assistir à partida entre Estados Unidos e Gana. Será um passo importante para retomar a relação, abalada após a revelação, no ano passado, de que a Agência de Segurança Nacional (NSA) dos Estados Unidos espionou empresas e autoridades brasileiras, inclusive e-mails da presidenta Dilma Rousseff. Na final da Copa, marcada para o dia 13 de julho, será a vez de os integrantes dos BRICS (além do Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) atraírem os holofotes da mídia.

O presidente chinês, Xi Jinping, já confirmou presença no Maracanã e, na sequência, todos irão para Fortaleza participar de uma reunião do bloco, nos dias 14, 15 e 16 de julho. Nesse encontro, será anunciada oficialmente a criação de um banco de fomento desses países, cuja presidência será da China. Em discussão há dois anos, o banco contará com um orçamento de US$ 100 bilhões, com aportes fiscais igualitários entre os países-membros, para financiar projetos em infraestrutura e desenvolvimento que não encontram espaço nas grandes instituições financeiras globais, como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial.

Uma das maiores preocupações da diplomacia brasileira em relação à cúpula dos BRICS é a provável pressão russa para incluir no documento final do encontro uma menção de apoio às manobras de Moscou na Ucrânia, após a anexação da Península da Crimeia. “Putin tem buscando apoio e precisa estreitar as relações com países que teriam uma visão de mundo diferente, que poderiam se contrapor às tradicionais potências”, diz Lucas Leite, professor de relações internacionais na Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP), referindo-se ao presidente da Rússia, Vladimir Putin.

Depois da reunião dos BRICS, Dilma e o presidente da China terão um encontro bilateral para tratar da agenda comum, que deve incluir novas possibilidades de comércio e investimentos e tentativas de retirada de barreiras de importação chinesa. Para isso, Xi Jinping, um apaixonado pelo futebol, permanecerá no Brasil por mais dois dias. Além de grande parceiro comercial, os chineses já demonstraram interesse em investir no programa de concessão de infraestrutura brasileiro. Se exitoso, o encontro pode representar um gol de placa do Brasil na Copa do Mundo.

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