29/11/2013 - 21:00
Quem conhece o empresário Abilio Diniz há muito tempo diz que ele está mais leve, light e até mais brincalhão. Não que ele fosse uma pessoa sem senso de humor no passado. É que, a menos de um mês de completar 77 anos, Diniz está recomeçando sua vida. “Ele fundou, resgatou e transformou o Pão de Açúcar na maior rede varejista brasileira”, diz Pércio de Souza, dono da butique de investimentos Estáter, que assessorou o empresário em seus principais negócios, como a compra do Ponto Frio e da Casas Bahia. “Para muitos isso seria suficiente, mas para ele é apenas um incentivo para buscar outros desafios.”
Abilio Diniz, presidente do conselho de administração da BRF: ”No dia
em que tivermos de ir a voto no conselho de administração,
vou considerar uma derrota minha”
Nessa nova fase, Diniz deixou o Pão de Açúcar, empresa criada por seu pai, o imigrante português Valentim dos Santos Diniz, em 1948, após resolver sua disputa com Jean-Charles Naouri, presidente do grupo francês Casino, que assumiu o controle da rede varejista brasileira em 2012. Agora, ele é apenas um acionista sem direito a voto e sem poder para influenciar os rumos da companhia. “O verdadeiro Pão de Açúcar, que são seus valores e sua cultura, está dentro de mim”, disse Diniz à DINHEIRO, na sede da Península Participações, gestora responsável pelos negócios da família. “Quando consegui entender isso, foi mais fácil administrar minha saída.”
As mudanças não terminaram por aí. Diniz, que é desde abril o presidente do conselho de administração e acionista minoritário da BRF, dona das marcas Sadia e Perdigão, não trocou apenas de endereço. Ele sai do varejo e vai para a indústria. Deixa também a posição de dono do negócio, na qual atuou por muito tempo. Nessa situação, bastava querer para que sua vontade imperasse. Agora, Diniz comanda uma companhia com capital pulverizado e sem controlador. Ele precisará de muita conversa para convencer os acionistas, como os fundos de pensão dos funcionários do Banco do Brasil (Previ) e da Petrobras (Petros), os empresários Walter Fontana e Luiz Fernando Furlan (das famílias que fundaram a Sadia) e Décio Silva, da Weg (ligado à Perdigão), além dos fundos internacionais, a exemplo do Blackrock.
“Disse na primeira reunião do conselho: no dia em que tivermos de ir a voto, vou considerar uma derrota minha”, afirma Diniz. Por essa transição para uma nova área e sua disposição de deixar também sua marca em um novo setor, Abilio Diniz foi escolhido o EMPREENDEDOR DO ANO 2013 NA INDÚSTRIA pela DINHEIRO. Com pouco mais de oito meses à frente da BRF, Diniz já mostrou o seu estilo. Trocou executivos e criticou a vocação industrial da BRF. “Os investidores foram me buscar para que eu trouxesse mais dinamismo e mais ambição para essa companhia”, disse ele, em teleconferência com analistas, quando anunciou os resultados do terceiro trimestre de 2013.
Vida nova: (ao lado) com claudio Galeazzi, novo presidente da BRF, e (acima) assinando contrato com Jean-Charles Naouri,
do Casino, pelo qual deixa o conselho de administração do Pão de Açúcar
“A ambição, evidentemente, não me falta.” Na ocasião, Diniz disse que estava desentortando a BRF. “Aqueles que me conhecem sabem muito bem que eu não jogo para a plateia”, afirmou. “Não busco resultados de curto prazo, não tenho necessidade de fazer isso.” Mas nem tudo soa diferente na nova rotina de Diniz. Ele não vai diariamente à BRF, como fazia em sua época do Pão de Açúcar. Mas o ambiente lhe é familiar. A diretoria trabalha em uma sala compartilhada, assim como na sua antiga casa. Quando está por lá, senta-se no lugar reservado a outros executivos, pois não tem sala nem mesa. Diniz também se cercou de pessoas de sua total confiança.
O consultor Claudio Galeazzi, que foi presidente do Pão de Açúcar de 2007 a 2010, assumiu a presidência global da BRF. Pércio de Souza, da Estáter, já assessorou a venda da operação de bovinos da companhia para o Minerva. Com a transação, a BRF passou a deter pouco mais de 15% do capital do frigorífico paulista. Sylvia Leão, que era diretora de RH do Pão de Açúcar, foi também contratada como vice-presidente de marketing e inovação. “Como posso fazer melhor para a BRF do que isso? Tenho de trabalhar com as pessoas que conheço e em quem confio”, afirma o empresário. Isso não significa que Diniz busca apenas pessoas com quem ele já se relacionou, num esforço de repetir aquilo que deu certo no passado.
Um exemplo é Sérgio Fonseca, que havia sido vice-presidente da Sadia de 2003 a 2008. Ele foi contratado para ser o presidente das operações brasileiras. Para o cargo de presidente internacional, o escolhido foi Pedro Faria, que era CEO da Tarpon, um dos principais investidores da BRF – foi a Tarpon que articulou com investidores insatisfeitos com o desempenho da antiga gestão a escolha de Diniz para a presidência do conselho da BRF. Faria chegou a ser cotado para assumir o cargo de presidente global e fazia parte do que ficou conhecido como “steering committee”, que incluía ainda Diniz e os conselheiros Walter Fontana (ex-presidente da Sadia) e Sérgio Rosa (ex-presidente do fundo de pensão Previ e da Brasilprev).
Garoto prodígio: Pedro Faria, ex-CEO da Tarpon, assumiu a presidência
global da BRF. É um teste para voos maiores no futuro
O grupo se reunia durante a fase de transição, quando se fez um diagnóstico da situação da BRF. Em sua nova função, que muitos consideram que se trata de um teste que pode credenciá-lo para assumir o lugar de Galeazzi no futuro, Faria assumirá a área mais estratégica para a BRF: a da expansão internacional. Questionado sobre se Faria está sendo preparado para assumir a BRF, Diniz tergiversa. “Sabe-se tudo até o dia de hoje, amanhã não sabemos”, afirma. “Ele deixou seu cargo de CEO da Tarpon e hoje é responsável por tudo o que se passa no Exterior. Está muito feliz e indo bem.”
A missão de Faria é fazer com que a BRF deixe de ser uma exportadora de frangos para se transformar em uma companhia global, produzindo alimentos processados em diversas partes do globo. Uma fábrica em Abu Dhabi será inaugurada até meados de 2014. As consultorias McKinsey e BCG foram contratadas para avaliar aquisições internacionais, a forma pela qual a BRF deve avançar globalmente. “Estamos abertos a oportunidades, mas não vamos abraçar o mundo”, diz Galeazzi. O empenho para globalizar a BRF é tamanho que todos os vice-presidentes foram para o Oriente Médio. Até uma reunião do conselho foi feita em Abu Dhabi.
Além da BRF, Diniz começa uma relação bastante profícua com a gestora de recursos Tarpon. Ambos acabaram de investir quase R$ 500 milhões na suíça Dufry. Com a quantia, ficaram com uma fatia de 5,22% da companhia, que explora lojas em aeroportos ao redor do planeta. É a volta de Diniz ao varejo. “É uma companhia bem dirigida e com um CEO muito capaz”, afirma o empresário brasileiro, sobre a Dufry. Por meio da Península, o empresário tem algo em torno de R$ 5 bilhões para investir. Qual será o estilo do Diniz investidor: ele seguirá o modelo da 3G Capital, dos empresários brasileiros Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Beto Sicupira, que, além de comprar participações relevantes, influencia na gestão por meio de executivos que administram as operações?
Ou será que seguirá a estratégia do megainvestidor Warren Buffett, que faz tacadas certeiras, mas não se mete no dia a dia das empresas? “Será o estilo do Abilio”, diz ele. E qual é esse jeito? “Não quero ser um investidor que não faz nada”, afirma. “Quero agregar valor.” O objetivo é fazer grandes negócios a ponto de ganhar assentos no conselho de administração, podendo, dessa forma, influenciar o destino da companhia. As apostas serão em áreas nas quais Diniz e a Tarpon têm experiência, como foi o caso da Dufry. A aposentadoria, como se pode perceber, é algo que não passa pela cabeça de Diniz.