Doze anos após descer a rampa do Palácio do Planalto, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso continua sendo uma das vozes mais respeitadas e atuantes da oposição. Tamanho prestígio pôde ser verificado na segunda-feira 22, em São Paulo, em evento organizado pelo Grupo de Líderes Empresariais (Lide), que reuniu cerca de 600 empresários e executivos. FHC foi aplaudido de pé cinco vezes durante uma palestra de apenas 25 minutos, na qual transmitiu uma mensagem de “indignação” que vai ao encontro do que pensa o setor produtivo. “O Brasil perdeu o rumo”, afirmou o ex-presidente.

No entanto, foi na parte final da apresentação, quando o tema corrupção ganhou ênfase, que o PIB empresarial ovacionou o sociólogo de 83 anos. “Os donos do poder são responsáveis pela corrupção quando ela é sistêmica”, afirmou FHC. “E no Brasil nós temos uma corrupção sistêmica.” A crítica, em tom de desabafo, tinha como alvo o mais recente escândalo de desvio de recursos públicos, que envolve a Petrobras, a maior companhia brasileira. “Não é possível que uma empresa como a Petrobras tenha três diretores acusados de corrupção e de ligação com partidos”, disse FHC, que é presidente de honra do PSDB.

“Não é possível que quem teve o comando nunca tenha visto nada disso. Ou é incompetente ou é conivente. E tem de ser cobrado.” Esse é também o discurso da presidenta Dilma Rousseff, embora os diretores acusados de corrupção tenham sido nomeados no governo do seu antecessor, Luiz Inácio Lula da Silva, quando ela era ministra das Minas e Energia (2003-2005), ministra-chefe da Casa Civil (2005-2010) e presidente do Conselho de Administração da Petrobras (2003-2010). Apesar dos cargos, Dilma garante desconhecer os “malfeitos” da época, colocando-os na conta dos ex-diretores de Abastecimento Paulo Roberto Costa e da Área Internacional Nestor Cerveró, funcionários de carreira da empresa.

Outro diretor sob suspeita, que também deve ser ouvido pela Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que investiga o caso, é Renato Duque, diretor de 2003 a 2012. Todos foram indicados pelos partidos de coalizão do governo. Dilma garante que Costa tinha “credenciais” para chegar ao cargo de diretor. “Ele não foi escolhido fora dos quadros da Petrobras. Ele tem 30 anos de Petrobras e, antes de ir para a diretoria, fez uma carreira dentro da Petrobras” afirmou. A presidenta diz que tanto a Polícia Federal quanto o Ministério Público têm autonomia para investigar casos como esse e reclama que o escândalo está sendo usado de “forma eleitoreira” pelos candidatos da oposição.

Mas não é somente a oposição que aponta problemas nos contratos da estatal. O Tribunal de Contas da União (TCU) responsabilizou os 11 diretores da Petrobras por prejuízos na compra, por R$ 1,25 bilhão, da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, e vai cobrar na Justiça o ressarcimento. Em nota, a Petrobras afirma que vem prestando todas as informações solicitadas pelos órgãos de controle e fiscalização. Depois de fazer um acordo de delação premiada, Costa prestou depoimento durante três semanas à Polícia Federal e contou como funcionava o esquema.

Na sexta-feira 26, o jornal O Globo revelou que Costa confessou ter recebido US$ 1,5 milhão para não atrapalhar a compra da refinaria. Ele contou ainda ter ganho US$ 23 milhões de uma empreiteira para facilitar contratos. O diretor-executivo da ONG Transparência Brasil, Claudio Weber Abramo, concorda com a avaliação do ex-presidente Fernando Henrique de que o Executivo tem a obrigação de zelar pelas indicações que faz. “É impossível que o governo se exima da corrupção sendo que foi ele que fez a indicação”, afirma.

Para Abramo, as indicações políticas são a raiz da corrupção. “Isso não acontece só no atual governo, mas até no menor município brasileiro.” Para evitar que casos como esse continuem acontecendo são necessários novos mecanismos de controle. “É preciso assegurar autonomia às agências reguladoras e criar mecanismos para impedir as nomeações políticas”, diz Emilio Carazzai, conselheiro de administração do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) e presidente da Caixa Econômica Federal entre 1999 e 2002. Para combater a corrupção sistêmica, como alerta FHC, é necessário realizar mudanças sistêmicas.